Angels - Capítulo 07
Capítulo 07
Keep Myself Alive
Pov Surgat
Minha primeira memória é de quando eu fui criado, feito das vestes velhas e furadas de Deus, qual muitos anjos nasceram. Lembro de quando o rosto da Samael, que agora prefere seu pseudônimo de Lúcifer, surgiu a minha frente, tirando o pano branco de minha cabeça e louvando alto pela nova vida que havia surgido. Ela tirou um pedaço da veste divina e cobriu minha intimidade, tocando minha mão em seguida e me levando para as nuvens em que os anjos moram, onde fui recebido com cânticos e batizado antes mesmo de me vestir, mas, apesar de tudo, alguns da primeira esfera não gostaram do meu surgimento.
Justamente por eu ter vindo do pano, como um acidente, fui classificado mais baixo que os da primeira esfera, que nasceram diretamente da Mãe Celestial. Muitos dos anjos nasceram da mesma forma que eu foram jogados pra terceira esfera e ficaram submissos aos da primeira ou foram conduzidos para a Terra e, anos mais tarde, se tornariam os 12 apóstolos, o que nos fez criar uma espécie de irmandade e conhecíamos uns aos outros, mas, quando Samael se irritou com Deus e suas atitudes que iam desde exilar a Mãe na Terra, a fundindo com o chão e as florestas (com consentimento de outros deuses), formando uma incrível montanha conhecida como “O Guardião dos Páramos” no Canadá, até pedir um pouco mais de direitos para os anjos mais baixos, essa irmandade acabou ficando dividida. Eu não era bom com humanos, então ficava cuidando dos tesouros, eu vi a briga e vi quando a asa da Luci foi arrancada cruelmente, quando as nuvens se abriram direto para o inferno e anjos como Azazel a seguiram, na intenção de a salvar, mas acabaram apenas sendo enganados e praticamente presos no Inferno. Hamiaah voava ao redor de Deus, gritando sobre a heresia deles conforme desciam para a gaiola de fogo e vapor quente que é aqui embaixo, eu lembro de voar tentando proteger Azazel do golpe traiçoeiro de lança, o que nos fez cair. Enfim, o que estou tentando dizer é que, em momento algum, Ethan estava, o que me leva a pensar sobre a possibilidade de Deus ter criado uma nova legião de anjos e isso que comento com As, que morde o lábio nervosamente, enquanto experimenta os óculos pequenos e ovais de lentes vermelhas.
-As vezes alguém teve uma união profana…
-Isso não é possível: somos estéreis, todos nós. – mantenho o tom baixo, olhando nervosamente para a porta.
-Nada tá fazendo sentido, Susu, então o que impede que alguém tenha feito um filho?
-Um mestiço?
Ele assente, os olhos nervosos ao redor, nos humanos que desceram para sua punição eterna, com suas aparências monstruosas e animalescas, eles todos nos dirigem um olhar assustado, mas logo voltam a notar as roupas, fingindo não nos ver. Talvez medo dos poderes que temos, talvez por sermos capazes de recriar, mesmo que em pequena escala, um mini apocalipse que pode os varrer para sempre do mundo dos mortos para algum lugar que ainda ninguém voltou para sabermos como é.
-As, isso não deve ser possível!
-Os tempos estão mudando, meu amigo, o que impede? – sua mão se abre e uma bola de fogo pequena se torna um cachecol desenhado, ele o estende para mim para que eu olhe: a historia é a minha. – As coisas mudam: você acreditou que nunca seria invocado, mas, durante cerca de 60 anos, você foi invocado e exorcizado milhares de vezes em muitos lugares, fosse para pactos ou só pra reforçar a crença na nossa religião.
Mordo o lábio e nego com a cabeça.
-Isso são casos diferentes.
-Não, não são. – tenho o cachecol tomado e desfeito na bola de fogo de sua mão. – Você só escolheu discordar, mas eu entendo esse seu medo.
A porta a nossas costas se abrem e a cabeça morena de Ethan aparece, tímida, na porta, ele sai com o conjunto que As lhe fez: uma camisa social branca abotoada até em cima, que esconde seu pescoço comprido e uma calça cinza que o aperta em seus quadris perfeitamente arredondados e coxas largas. Faço uma anotação mental para agradecer à As por me proporcionar essa visão infernalmente deliciosa, Ethan, no entanto, parece desconfortável.
-Ficou adorável, garoto. – meu amigo o gira para ver melhor, com um toque, a calça fica mais larga e para de o apertar, o que não agrada nem um pouco minha libido. – Se sente melhor?
-Sim, obrigado.
-Que gracinha você, ficou perfeito. – o pobre do garoto é apertado tanto que parece uma pelúcia, não tenho como não achar engraçada a cena. – Suas asas estão contidas na roupa, mas, no caso de uma necessidade, elas vão sair cobertas com uma película preta.
-Isso não seria uma mentira? Porque isso vai me gerar dias de penitencia, se for. – reviro os olhos e cruzo os braços impacientes: por que diabos ele tem que ser tão perfeitinho?
-Bom, antes isso que descobrirem que você é um anjo caído mas não caído, acredite, Deus vai te perdoar por isso. – levo uma bundada e quase caio em cima do garoto, percebo que a conversa foi encerrada.
Aceno para As e tomo a mão do anjo, que não retribui o aperto, me fazendo perceber a pontada de decepção em alguma parte de mim que só aparece quando crio desafios para manter as almas eternamente sob meu domínio. Decido mudar meu caminho, vai me obrigar a dar uma volta maior para ir pra casa de Lilith, mas será bom pra colocar o garoto a prova, pra o puxar para meu lado de qualquer forma e não me obrigar a enfrentar a espécie de “deusa menor” que ela é.
Faço uma curva abrupta para minha esquerda, entrando numa viela cheia de imp’s, criaturinhas que chegam até 1 metro com asas pequenas, chifres curvos para baixo, olhos que variam de acordo com o demônio que lhes deu a vida e dentes serrilhados que estão sempre a mostra em suas risadas perturbadoras. Eles não se aproximam, resignando-se a sua insignificância e olhares baixos nos cantos, como são ordenados a fazer, Ethan elimina a distancia entre nós e se gruda as minhas costas, incomodado.
-Eles deviam atacar, não é?
-Eles só atacam humanos desacompanhados de demônios ou filhos de demônios, você está seguro comigo.
Um dos imp’s se desgruda do grupo na parede a nossa esquerda e para a minha frente, impedindo meu caminho, gesticulando para que seus amigos hircosos o acompanhem, sem sucesso. Isso não o desanima, apenas o faz abrir a boca e soltar uma espécie de ganido rouco e tentar vir pra cima, ergo a mão para o imobilizar em uma gaiola que mal o deixa em pé, suas mãozinhas se esticam pra fora e arranham o ar, enquanto grunhe. Fecho a mão e as grades diminuem consideravelmente, o que o faz gritar de dor e resmungar, pedindo para que eu pare, viro para dentro a mão e as grades demoram dois segundos para cobrir a ordem, o dilacerando cruelmente até sair uma bola que tem no lugar de seu coração.
Relaxo a mão para que a gaiola suma e piso na bola, que quebra como se fosse casca de ovo. O pedaço de alma do qual ele é feito sobe por minha perna até meu anel de pedraria lilás, se fundindo e aumentando levemente a pedra, Ethan mantem o olhar baixo e me acompanha até o fim da viela.
-Por que fez aquilo? – ele fala tão baixo que quase não o ouço.
-Se tem uma coisa que o Céu me ensinou, foi como manter o controle e o respeito: medo.
Sinto seu olhar queimando minha nuca.
-Isso não é nada sagrado! -Anjinho, você certamente conhece Hamiaah. – tento, ele concorda com a cabeça, paro para o olhar. – Existe apenas um motivo pra ele estar acima, inclusive, da Vehulah, que é praticamente a rainha dos anjos: medo. Você pode ser um anjo, mas eu quem estive mais próximo deles durante 30 anos, sem contar que aquele filho de uma… – penso por um momento: a Mãe Celestial não é uma puta e, bem, ela ainda é minha mãe. Se eu a xingasse, não ficaria surpreso se ela conseguisse criar uma forma de voltar pra nossa realidade só pra me dar umas palmadas. – O que importa é que ele é um abantesma achavascado.
-Ele é só intenso! Não vou permitir que fale assim do meu irmão, seu herege. – ele me dá um soco na barriga, curvo um pouco e cuspo um pouco de sangue.
Ethan está virando um de nós até bem rápido, me pergunto se ele vai se juntar a legião de Azazel antes mesmo de irmos até a Lilith, o que não seria exatamente ruim. Não revido e ele parece satisfeito, com um sorriso convencido, que faz seus olhos infantis brilharem .
Dou alguns passos para frente, até encontrar uma curta escada e gesticulo para que me acompanhe, desço os cinco degraus até o pequeno deque de madeira clara à beira do rio Coceonte, agitado e mortal.
-Onde estamos?
-Rio Coceonte, Ethan, ele corta o Inferno todo. – abro os braços como se eu quisesse demonstrar o tamanho do rio. – Os humanos acreditam que seja ele quem nos leva para os mundos das outras religiões, mas ele só agua essa dimensão, os outros tem seus próprios rios, sejam eles os mais famosos lá de cima quanto “exclusivo” daqui.
Seu olhar vaga entre meus braços abertos e me pergunto se é por conta da falta de minha jaqueta, revelando minha tatuagem de dragão com um cadeado na boca, um apito me faz fechar novamente e abrir a asa, cobrindo o anjinho gentilmente, em proteção. O barco para e abre sua pequena porta, recolho para lhe dar espaço para passar, o balseiro o observa com curiosidade por detrás do timão. Embarco atrás do garoto, surpreso com o fato de que ele consegue entrar, uma vez que apenas caídos conseguem entrar aqui, nem anjos entram por conta de uma regra antiga de Luci.
Talvez ele não seja tão santo quanto gosta de aparentar.
O balseiro apita novamente e segue, num solavanco, fazendo com que os poucos passageiros percam um pouco o equilíbrio, o que faz alguém criar um chicote e lhe acoitar uma única vez por seu comportamento. Ethan não parece notar, debruçado sobre a borda olhando a água agitada com tanta atenção que impressiona, ele parece tranquilo.
-Espero que não se importe, mas quero passar em um lugar antes de irmos até a casa da Lilith, sabe, aproveitar que já estou aqui em baixo pra resolver um assunto. – “e tentar te jogar para o meu lado o mais rápido possível, se não for possível saber que você mesmo é infiltrado no Céu, porque não quero ter que encontrar a Lili”.
Recebo um aceno de cabeça e percebo que não temos assunto, então acendo um cigarro e sopro sua fumaça para formar um anel em direção ao pentagrama verde que cobre o Inferno.
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Demoram quase quarenta minutos de barco pra finalmente descermos n’outro deque, dessa vez de madeira azul e verde, circundado com flores brancas, que parecem brilhar na noite. Seguro a mão do garoto e o conduzo para o meio fio, onde algumas pessoas conversam, bebem, fumam ou se debruçam nas janelas dos carros, seus olhares para nós são discretos e um ou outro tem coragem de assobiar e flertar. Ignoro: não tenho tempo pra ficar indo atrás rabos redondos e orgasmos múltiplos, preciso corromper o mais rápido possível.
Na esquina da rua, uma música alta toca e soa no lugar todo, tocando um jazz da década de 30 muito do atrativo, me indicando um intervalo. Abro a porta azul e rosa, nos dando acesso para um salão redondo gigantesco, onde pessoas sentam e bebem segurando cigarros, todos de frente para cinco palcos compridos nos quais humanos de todos os jeitos dançam e sensualizam, tirando suas peças de roupas em seus números de strip baratos.
Entretenimento variável é incrível, conduzo Ethan pelo meio da confusão, fugindo das gárgulas que surgem para tirar nossos casacos e chapéus, mesmo que não usemos. Garotos usando jockstraps com orelhas de coelho e garotas de maiôs com gravatas e micro sainhas para parecerem estudantes andam de um lado para o outro, carregando bandejas com bebidas e copos, alguns tem uma marca de mão em alguma parte do corpo, indicando algum abusado que provavelmente vai ser carregado para fora pelos donos do lugar. Alcançamos uma escada, meus chifres abrem passagem para nós (recomendo, quando você morrer, pagar a mensalidade do clube pra não ficar no meio da putaria do andar de baixo, já que não tem como ser um caído), nos dando acesso em a outro salão, dessa vez menos tumultuado e consideravelmente mais chique, olho ao redor procurando uma pessoa.
-Surgat! – a voz aguda de Asmodeus chega antes que eu consiga ter alguma reação, ambos caímos, ele tem um sorriso pervertido delineando seus lábios carnudos. – Alguém interessante finalmente apareceu! – meu amigo me abraça inclusive com as pernas, sua boca muito próxima a meu pescoço.
Faço uma anotação mental pra lembrar de trazer meu frasco de anti-feromônios quando vier conversar com Asmo, uma vez que ele é o demônio da luxúria.
-É bom te ver também, Asmo, você tá ocupado?
-Nunca demais pra você, gato. – seus dedos deslizam de meu pescoço para meu abdômen, meu pau parece perceber a atenção. – O que posso fazer por você? Ou quem posso oferecer pra você?
-Asmodeus! – uma voz masculina surge do camarim e ambos olhamos, um garoto de olhos lilases e pele parda surge, ele deve ter quase meu tamanho e, por sua aparência praticamente humana, tenho a impressão de que ele deve ser filho de algum caído. – Eu não tenho como não vir reclamar da sua ausência no meu intervalo. – ele para a poucos passos de nós, nos levantamos.
– Surgat, este é Eros, filho da Belfeghor que se uniu ao espírito do deus Eros, da mitologia romana. – ele sustenta meu olhar por um breve momento, antes de voltar a encarar o outro. – Meu noivo e, atualmente, meu parceiro nos negócio junto com a Lili.
-Eu preciso falar com ela, tipo, urgente.
-Cara, você desconhece o objeto mágico chamado “celular”? – reviro os olhos para Eros, mas ele está certo.
-Sai de casa apressado, esqueci de descer com ele.
Ele não parece muito convencido, mas concorda com a cabeça.
-Eu te entendo, garoto que está com Surgat: o Asmo esquece em qualquer lugar a droga do celular e não pega nenhum emprestado pra ligar pras pessoas. – ele parece mais tenso que realmente maldoso. – É foda amar alguém lerdo.
Ethan não consegue responder, porque Eros entrelaça o braço ao dele e foge para o lugar de onde veio, meu amigo coloca o braço ao meu redor e me conduz pra outro lado, para uma mesa.
-Surgat, meu amigo, de qualquer forma, ela não ia atender: Lili está em turnê pelas outras religiões. – Asmo pega um copo de uma bandeja que está passando e me entrega, sugo o canudo de plástico azul com um girassol de silicone preso. – Ela saiu semana retrasada e não sei quando ela volta, sei que ela foi para a dimensão do islamismo e depois, bem, eu não sei a ordem certinha.
-ELE É ESQUECIDO! – Eros berra do lugar de onde veio e meu amigo apenas ri, balançando a cabeça.
-Isso é verdade, venha Su, me permita pagar uma bebida pra você durante o show do meu amor.
Antes que eu possa discordar, ele me conduz pelo salão exclusivo até a confusão de humanos, onde as luzes diminuem até desligarem totalmente e somente algumas poucas luzes rosas e vermelhas acenderem no palco mais comprido. O jazz para e um silencio delicioso fica por alguns segundos, que parecem se arrastar até um “Nananana” começar e a voz da Rihanna soa alto nas caixas de som, Asmo faz um sinal positivo para Eros, que usa um roupão vermelho e começa a sensualizar no pole, os olhos grudados nos do garoto ao meu lado, como se fosse um show exclusivo. Suas mãos seguram o pole e empina a raba, rebolando lentamente para ser provocante, as pessoas ao nosso redor jogam notas e moedas no palco, desesperados para uma chance de serem agraciados, mas isso só o faz se prender ao mesmo e girar de forma que possa virar de ponta cabeça.
-Ele adora me provocar. – suspira Asmo ao meu lado, curvando um pouco sobre o bar. – Merda, esse garoto é perfeito.
Desvio o olhar do casal se provocando a distancia e pego uma bebida aleatória de uma garçonete adorável de quadris largos e cabelos rosas, mas não faço nenhum gesto invasivo e ela me oferece um sorriso antes de anotar o telefone dela na minha palma, Asmo segura meu ombro para me girar e voltar a olhar o palco. Ethan parece desesperado em cima do palco, sem saber o que fazer, Eros se posiciona por trás e desabotoa os botões de seu pescoço, expondo lentamente a pele morena e intocada do menino.
Eros sorri ao me ver olhando o palco e beija o pescoço alheio, lambendo em seguida, Ethan fecha os olhos e FUCKING arfa, os pulsos unidos presos por um par de algemas e os braços curvados para trás, fala algo baixo e recebe um beijo no maxilar enquanto os botões abrem lentamente para exibir o corpo delicado, uma cicatriz discreta desce de seu abdômen até sumir no cós da calça, como se fosse em direção a sua virilha.
-Seria bom fechar a boca, amigo Sur, ou vamos todos morrer afogados na sua baba.
O ignoro, vendo Eros abaixar um pouco a calça alheia, até curtos pelos castanhos aparecerem, meu pau se anima com a visão e pede atenção, mas não consigo fazer nada além de devorar os garotos com os olhos. Quase tão rápido quanto Ethan apareceu ali em cima, Eros alcança o roupão que estava usando no chão para poder cobrir o anjinho, o conduzindo pros bastidores. Poucos minutos depois, ambos surgem por uma porta exclusiva de funcionários, Ethan tem os olhos baixos e parece chateado com algo.
-Anjinho, tá tudo bem? – seguro seu queixo delicado, ele toca minha mão como se quisesse a tirar, mas não tira, decido afastar.
-Ele está preocupado com “o Vovô”. – Eros para ao lado de Asmo, a mão em seu ombro, que segura sua cintura e beija seu abdômen coberto por uma blusa adorável verde. – Enfim, foi divertido.
-Algum plano pra hoje, meu amor? – meu amigo parece um cachorrinho, olhando maravilhado para o namorado.
-Dominação do mundo, apenas, mas só depois.
-Vai pedir ajuda pra Luci?
-Asmo, você é meu mundo.
Asmo fica vermelho, Ethan fica vermelho, eu fico vermelho e percebo que já passamos mais tempo que necessário, me despeço dos dois com um aceno e tomo a mão de Ethan, o carregando pra fora, praticamente. Assim que deixamos o ambiente cheio de conversas, ele se abaixa com um gemido.
-Por que me trouxe aqui?
-Achei que Lili iria estar aqui, mas o bom é que você ganhou os olhos de todos, o que é ótimo.
-Ótimo?! – seus olhos se erguem para mim, cheios de lágrimas. – Eu estou tentando ir pro Céu e sua forma de me ajudar é me jogando dentro de um…Seja lá o que for esse prostíbulo cheio de falsos fiéis e pecados e… E… E tentações! Ainda teve o louco do Eros me levando pro palco e fazendo-me ficar nu pra um bando de desconhecidos!
-É divertido, fica tranquilo, neném.
Suas mãos agarram minha camiseta, uma lágrima solitária desce por seu rosto e isso não parece o importar.
-Isso não é adequado pra mim! Você me trouxe aqui pra baixo sem querer, não pra me ver sendo obsceno sem meu consentimento, agora me leva de volta pra minha casa ou eu conto tudo pra Lúcifer!
-Ser X9 não é nada cristão, muito menos chamar a Luci pra resolver seus problemas.
Como se eu tivesse apertado um gatilho, sou empurrado com força e raiva contra a parede, suas pupilas cor de mel ganham um tom alaranjado vindo de dentro, mas logo voltam ao tom normal e ele parece perder a força, desfalecendo. Consigo o pegar nos braços a tempo, começo a andar de volta pro prédio do Bundas&Brejas, mas uma asa branca me para antes de eu dar mais que cinco passos, o pior é que eu conheço essa asa muito bem.
-Me dê o Ethan, Surgat.
-Olá para você também, – me viro para olhar, cabelos loiros curtos e espetados emolduram o rosto juvenil que um dia se iluminara facilmente pra mim, – Rehael.
Viro para o encarar, seus olhos negros são frios, mas sei que tem coisa por trás, sempre tem. Sua mão direita segura um bastão típico dos potestades, próximo ao meu pescoço.
As coisas estão indo para um lado estranho, mas estou gostando.
-Não ouviu? Me dê o Ethan, Surgat. – sua voz é parecida com daqueles locutores de rádio que contam histórias de terror na madrugada, aperto o corpo pequeno contra mim. – Não vai me fazer brigar com você pra desfazer a sua idiotice de subir e tentar corromper um anjo, vai?
-Ele é livre, Rehael, aqui ele não é julgado muito menos preso.
-Você está sendo estúpido, irmão: ele é um anjo que não caiu, o desejo dele sempre vai ser retornar para junto do Senhor.
I just wanna leave this place behind! Every time I see your face in mine!
-Eu quero merecer. – a voz do anjinho sai num fio, o que nos faz parar nossa discussãozinha pra o olhar, Ethan vira a cabeça pra trás e ambos colocamos a mão para não o deixar se machucar. – Eu não posso voltar se não merecer, que nem Abraão. – ele me empurra um pouco e põe os pés no chão, encostando em uma parede aleatória até ficar de cócoras e esconder o rosto nos joelhos. – Pode me golpear, como Hamiaah vai te ordenar para fazer, mesmo ele não devendo já pregamos o perdão, mas eu não vou com você, Irmão: vou merecer estar no Céu, mesmo que eu tenha que usar um demônio como ajuda.
So what’s your inner thought! You left me high, you left me dry!
Os olhos de Reahel se estreitam pra mim e eu ergo os braços como um bandido, como se dissesse “não tenho nada a ver com isso”, tem um quê de medo em seu olhar que não identifico o motivo. Toco o ombro de Ethan: precisamos ir logo embora antes que comecem a tentar o machucar, ele parece perceber o que quero dizer e se levanta, ignorando minha mão estendida, esperando que eu indique para onde vamos. Indico o norte com o queixo e ele passa a minha frente, o acompanho, em silencio desconfortável, mas que fica estranhamente atraente nessa posição de líder, ouço o estalar de dedos e os passos de Reahel atrás de mim, nos alcançando.
So what your life looks like. Just don’t fix mine, you’re all you got
Onde diabos eu amarrei meu jegue?
You’re all you got! You’re all you’ve got!