Angels - Capítulo 01
Capítulo 01
Pov Ethan
Eu sempre quis subir na vida, no caso, subir na vida é ascender no ranking dos anjos e parar de ser só um mensageiro de orações humanas, mas parece que Deus (ou seja lá como queira chamar) não quer que eu esteja perto dele. O velho que é clamado nas mais diferentes línguas de centenas de países parece me detestar, um filho Dele, criado por Ele mesmo! Isso soa como ironia quando eu leio de novo o primeiro capítulo da única coisa que os anjos podem ler: as escritas sagradas das religiões, com a passagem “criou os homens à sua própria imagem”.
-Senhor, suas orações do hospital que pediu, onde posso…? – mal piso em sua nuvem banhada diretamente pelo Sol e sou parado por Haamiah, com sua lança de luz em punho, barrando minha passagem, o bater de suas asas maiores são fortes o suficiente para me empurrar um pouco para trás, para a borda da nuvem.
Seus olhos cinzas me fitam com curiosidade por detrás do seu primeiro par de asas, mostrando sua superioridade na casta angelical. Seu corpo tem mais dois pares além da que cobre seu rosto, uma cobrindo sua intimidade e a que usa para voar, ele não usa roupas, então deixa a pele negra cheia de cicatrizes à mostra, marcas da Grande Guerra com a queda de Lúcifer. Ele serve como uma espécie de “chefe” para o resto dos serafins, por isso tem permissão para mostrar um pouco de seu rosto, que, se fosse humano, ficaria bonito junto aos seus quase 2,1m, seus cabelos são do tom de seus olhos.
-Me entregue que eu coloco diretamente nas mãos de Deus, Ethaniel, ele não deve ser incomodado agora. – sua voz séria e grave soa alta aos meus ouvidos, é quase que uma versão menos tocante de nosso Pai. De novo, me sinto dispensado e inútil. – Por quê não aproveita para tentar pegar as orações dos enterros?
-Achei que todos cemitérios já estivessem ocupados por principados e anjos da guarda prestando luto.
-Bem, então pode rezar. – ele dá de ombros, gesticulando com a lança para que eu me vá.
Aponto para detrás dele, para o manto sagrado de um azul tão claro que quase se funde ao céu.
-Não posso colocar as orações ali para te ajudar? Quer dizer, soube que houve em briga com Sama… Lúcifer recentemente, suas asas podem não conseguir aguentar o peso de todas considerando o quanto a sua lança deve pesar.
Seu colossal par de asas se abre e cobre a direção onde estou apontando, encolho os ombros e recolho o dedo, o par que cobre seu rosto abre um pouco e posso ver o olhar de desaprovação.
-Eu não sou um dos que lida diretamente contigo, irmão, mas não tenha esse tipo de atitude perante a Ele. – sua voz se torna mais firme. – Vá rezar ou procurar algo para fazer que não seja ficar de pipipi em meu ouvido ou não serei tão gentil, seja te afastando ou te punindo por essa atitude.
Haamiah me dá as costas e, num bater de asas, se funde ao céu azulado, me fazendo desistir da discussão que não vai levar para nenhum lugar, então não tenho opção a não ser me retirar da nuvem, dando de cara com dois anjos da guarda ao sair, ambos carregam suas orações e conversam alegremente entre si, tenho de segurar a vontade de lhes avisar que Deus não pode ser contatado agora, mas me seguro: a vontade de ver mais alguém levando uma chamada dos superiores me alegra, a ideia de que a grosseria do moreno não passa de um mero acaso me tranquiliza, mas é isso que tenho repetido constantemente para mim mesmo desde que Adão e Eva começaram a popular o mundo e eu fui mandado para cada vez mais longe do trono celestial. Dou meia volta em meu caminho para a minha nuvem e volto para perto da nuvem de Deus, com cuidado o suficiente para que nenhum dos serafins note minha presença.
-Bom trabalhos, minhas crianças, sempre feito com incrível êxito em suas missões. – a voz profunda me arrepia, tem algo como… Carinho… Ali.
Ergo um pouco mais a cabeça, tentando ouvir melhor, mas, de onde estou, consigo ver ambos os anjos receberem um bagunçar de cabelo, o nó na minha garganta se aperta e tenho de respirar fundo pra evitar que lágrimas caiam.
-Calma, calma Ethan, isso foi mera coincidência: provavelmente ele devia estar respondendo outras orações ou em confêrencia com os deuses de outras religiões ou…
-Achei que tivesse sido claro, irmão. – a voz de Haamiah surge atrás de mim e não tenho tempo de virar para o olhar, porque o breu já tomou conta de minha visão.
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Estrelas são a primeira coisa que me deparo quando abro os olhos, bem, estrelas e barras cilíndricas douradas roliças.
-Santo Graal! – toco minha testa, onde sinto pulsar. – A gaiola de novo não.
Fico sobre meus pés nada firmes em passos incertos até conseguir encontrar a barra mais próxima, minhas costas doem com o esforço, evito olhar para minhas asas porquê sei o que vou encontrar.
-Eu detesto aqui. HAAMIAH! MAHASIAH! SITAEL! ELEMIAH! – minha voz ressoa no vazio do céu, sinto lágrimas se formando em meus olhos. – ME TIREM DAQUI! Por favor…
Ninguém vem, como é normal, então não tenho outra opção a não ser ajoelhar e unir minhas mãos de forma a tapar meus olhos, tentando conter o nó na garganta que torna minha respiração cada vez mais difícil. Um soluço escapa por minha boca e eu entrelaço meus dedos aos meus cachos castanhos, puxando ansiosamente tentando acordar do que parece ser um sonho ruim.
Nada acontece. De novo.
Não é a primeira vez que sou jogado aqui dentro com algumas penas estrategicamente arrancadas nesse século, só não esperava que tivesse um intervalo de tempo de menos de um ano.
-Por favor, alguém me tire desse lugar…
Um rangido se faz atrás de mim e viro a cabeça, esperando encontrar o olhar reprovador de um dos principados, mas só encontro a porta da gaiola aberta, como se algum dos superiores não tivesse a trancado. Meu cérebro clama para que eu fique aqui dentro, apesar da porta aberta, mas meu coração cantarola encantadoramente para que eu saia, uma vez que irei arranjar mais problemas se ficar aqui com essa porta aberta, então decido ir. Meus passos são vacilantes e tenho de me segurar nas barras, procurando apoio, paro na saída e a dor atinge minhas costas, não me dando tempo para me preparar. O vento açoita meu rosto conforme eu caio, minhas asas parecem presas, só consigo envolver meu corpo e tentar proteger minha cabeça, a cobrindo com meus braços.
Me sinto como se tivesse tido uma sessão de autoflagelo com meu chicote de couro, respiro fundo e me arrasto até um murinho relativamente quebrado, recosto a cabeça ali e sinto a dor tomar meu corpo. Minha batina branca está suja com terra, sei que tomarei chamada de um principado, mas não ligo: não tinha planejado cair como fruta podre do mundo normal dos humanos.
-Eu te juro que, se usar algumas frases de efeito, vai ser rápido tomar o coração da garota e ela vai implorar por dar sua alma por um pacto com você. – uma voz do outro lado do muro me chama atenção, não consigo evitar me espreitar para a parte quebrada tentando ver do outro lado. –Mas se lembre de nunca realmente concordar com a troca de sua liberdade pela alma dela: faça parecer suicídio depois de conseguir o que quer.
São dois caras, ambos de asas negras, o que fala é bronzeado e tem um par de chifres, ele usa uma jaqueta jeans escura, cobrindo parcialmente uma blusa preta simples, grudada em seu abdômen, sua calça está rasgada nos joelhos e exibe um cinto largo e preto, seus olhos são de um tom castanho escuro, combinado com o cabelo, em seu peito, uma cruz de leviatã de prata torna sua aparência algo natural e… Atraente? Um símbolo de perigo? Acho que essa é a palavra certa.
Seus olhos se voltam na minha direção e eu me encolho, respirando pesado grudado à pequena parede, o ouço se despedir do outro ser e seus passos pesados se aproximarem de onde estou.
-Um anjo por aqui? Que raro. – sua voz soa mais firme e mexe com algo dentro de mim, meu Santo Graal. – O que veio fazer aqui? – seus dedos tocam minhas bochechas e me puxam pra perto, sua expressão se suaviza um pouco ao me ver. – Não precisa sentir medo de mim, você está bem? Sua roupa está com uma mancha vermelha.
Não tenho tempo de falar porque sou puxado pra cima e, habilmente, ele se desfaz de minha batina, meu rosto aquece e eu a puxo pra cima, tentando me cobrir. Sem me soltar, sou virado para ficar de lado, sua mão livre e fria toca minha pele com delicadeza, me causando tremores involuntários. Suas ações são mais rápidas que minhas reações atordoadas e desconexas, sua mão pressiona minha costela e eu dou um pulo, voltando a sentir meus olhos se encherem de lágrimas.
-Não quero te machucar. – sua respiração em minha orelha arrepia todos os cabelos do meu corpo rechonchudo, torço silenciosamente para que ele não perceba. – Não parece ser nada ruim, só tá roxo e tem um no seu antebraço. – meu braço é levado até sua boca e tenho a área lambida, seus olhos estão nos meus e ele parece se divertir com meu atordoamento.
-Obrigado, mas acho que não deva ser necessário.
-É meu direito fazer isso já que você estava espionando: considere uma espécie de dívida. Sem contar que estou me perguntando se seu sangue tem um gosto tão bom quanto aparenta.
Respiro fundo e lhe deixo continuar o que estava fazendo, seus lábios são mais quentes que o resto de sua pele e são macios, é uma tentação difícil de resistir, mantenho os olhos baixos enquanto sua língua me aquece. Mexo minhas pernas desconfortavelmente, uma leve dor em minha intimidade chama minha atenção, ergo minha batina discretamente, só para ver meu membro rígido, volto a me cobrir, o rosto ainda mais vermelho.
-Delicioso… – é só uma palavra, mas soa como provocativo carnal, o moreno sorri e seus olhos quase fecham. – Você se sente melhor? Minhas mãos estão frias, então suponho que tenha te ajudado.
-Por que… Por que me ajudou?
-Não considere nada mais que um ato raro de gentileza.
Besta burro: até parece que ele te ajudaria se seu coração não estivesse compadecido provavelmente por alguma meta de “arrecadação” de almas.
-Sente incômodo aí? – seu toque está sobre minha batina, emito um gemido baixo e tímido. – Isso vai piorar caso não resolva e vai causar dor, se quiser se resolver sozinho, só me falar.
-Como isso acaba? – cubro o rosto com as mãos, o pecado pesa em minhas costas, acumulado com o de desobediência ao Pai.
A mesma mão gelada desliza devagar por meu abdômen até a batina, a afastando devagar, não arrisco olhar quando envolve meu membro e começa movimentos de vai e vem que me fazem gemer com o susto. Jogo a cabeça para trás, aproveitando a dormência em meus pés e a anestesia que parece curar minhas feridas, sua mão alcança minha cabeça e me puxa para si, não resisto, aproveitando para recostar em seu ombro. O movimento fica mais intenso e arqueio um pouco em sua direção, tentando sentir mais dessa sensação boa, abro os olhos apenas para encontrar sua boca perigosamente próxima a minha, alcanço seu rosto e junto nossos lábios, sua língua é habilidosa e preenche todos os cantos, quase como se ele tivesse de lutar contra algum amante. Meus gemidos soam mais aleatórios quando a sensação de aperto atrás do meu umbigo se intensifica e não evito arquear as costas, um fino fio de baba nos conecta, fecho os olhos sentindo aquele aperto se desfazer e me jogar ao êxtase, meu coração bate forte.
-Melhor? – Deus, como a voz desse cara é provocante demais, me afasto um pouco, puxando a batina para cobrir minha cintura novamente. Concordo com a cabeça. – Não vou contar a ninguém, até porque pegaria mal pra mim…
Ele continua falando sobre algo que não ligo, uma vez que o desprezo de meus Irmãos Celestiais volta a minha mente, trazendo seus rostos com desaprovação e um mini chicote com várias tiras de couro para que eu me autoflagele como punição. Meus olhos enchem de lágrimas novamente e tenho de morder o lábio para evitar que um soluço saia, o peso do pecado me puxa para baixo e isso é uma dor cruel. Algo me envolve e me arranca de meus pensamentos, me deparo com sua asa me envolvendo e me puxando para si, ergo o rosto para olhá-lo.
-E também porquê te achei uma graça, anjinho. – seu rosto está virado em uma direção contrária. – Sempre que for jogado de lá de cima, chame meu nome três vezes e eu te pegarei para que não se machuque tanto na queda… Ou só quiser quebrar as regras um pouco.
Concordo em silencio: eu me sinto um herege só de estar com ele, imagine sair com ele por livre e espontânea vontade? Aí mesmo que minhas penas serão todas arrancadas e passarei o resto da eternidade na bendita gaiola ou até mesmo banido do céu e bestializado.
-Seu nome é…? – pela impaciência, percebo que não é a primeira vez que me pergunta.
-Ethan, mas geralmente me chamam de “Ethaniel” ou “pirralho problemático”.
-“O forte”, isso explica como tem aguentado esse apelido cruel. – seus dedos se entrelaçam aos meus com gentileza, olho seu gesto confuso. – Me chamo Surgat, o mesmo demônio que você deve ter ouvido durante a época do Papa Honório.
-O que abre todas as fechaduras… – seu sorriso aumenta mais ao me ouvir.
-O primeiro e único, Ethan, adoraria conversar com você mais um pouco, porém creio que Deus deve estar louco atrás de um filho. – seu rosto se aproxima perigosamente, não resisto à sua língua invadir minha boca. – Estarei esperando seu chamado, pequeno. – E, quase tão rápido quanto cai, estou de volta na gaiola, devidamente vestido e ajoelhado como se tivesse dormido em penitencia.
Sonho ou realidade, não importa, o que importa é que minha mente me levou ao pecado carnal, coisa que jamais deveria acontecer. A porta é destrancada e eu me viro, apenas para encontrar um dos principados com cara de poucos amigos, não o culpo: se eu tivesse também que vir me buscar de vez em sempre, não ficaria nada feliz. Ele só joga um pouco de água benta em minhas asas e reza por minha alma, mesmo que de má vontade, e me levando consigo em seguida.
*********
Dias se passaram desde que conheci Surgat, tem sido um acalento a ideia de ter alguém com quem contar, mesmo que não seja da minha “espécie”, uma parte de mim quer o chamar apenas para que eu tenha alguém com quem conversar, outra parte apenas se mostra amedrontada com o fato dessa “amizade” dos infernos (literalmente). Estou numa das diversas nuvens que nós, os mais baixos da escala angelical, moramos e, sinceramente, aqui em cima é chato, principalmente em dias como hoje, que Deus sai de seu trono e vem dirigir palavras de carinho a nós, mas, como sempre, meus irmãos de primeira casta, como Haamiah e Elemiah estão fazendo a ronda para evitar que eu chegue perto, por isso me sento num canto da nuvem longe da confusão e conversas animadas.
Eu queria estar em missão na Terra, sendo anjo da guarda de um bebê católico para que nenhum demônio viesse tentar roubar sua alma, uma vez que só preciso tomar conta de seres de religiões cristãs e os de outras religiões ficam destinados exclusivamente para outros deuses e seus ajudantes, mas a quantidade de crianças nascidas agnósticas tem aumentado e anjos aos montes tem ficado livres para recolher orações, que é coisa rápida. Meus irmãos recebem elogios por suas “atitudes louváveis” e tapinhas na cabeça, como humanos gostam de fazer com cães e não posso deixar de comparar nossas semelhanças, mas tudo bem, é por uma boa causa.
-Ethan, Deus tem uma missão própria pra você: pediu que limpe a gaiola, já que disse que acabou sujando da ultima vez que estava lá. – os cachos de Haamiah estão perfeitos caindo em suas costas, suspiro tristemente vendo que ele não se incomoda nem em me olhar para me dar ordens, esperando a minha obediência cega. – Depois tem de pagar a penitencia de 100 Ave-Marias, junto com o polimento de artefatos raros na Terra, mantendo firme a crença dos fieis do Pai.
-Limpar a gaiola eu entendo, mas qual é dessa penitência? – “Mentiroso, você sabe por quê está a ganhando”, mas meu irmão se vira para mim.
-A limpeza da gaiola é o castigo divino, o outro é meu por me obrigar a ser mais rígido contigo: se terminar cedo, pode voltar a fazer seja lá o que esteja fazendo.
Ergo a sobrancelha e cruzo os braços, sem me mover, a caravana divina segue ao norte, longe de mim, ele mexe a lança na mão direita, apontando para baixo.
-Vá agora.
-Eu não tenho que obedecer: o único acima de mim é Deus! Você é um herege que se aproveita de sua posição.
Demoro um momento para sentir sua mão em meu pescoço com raiva e a lança perigosamente próxima ao meu coração, tenho de me segurar para não molhar a batina com o medo.
-Como ousa se referir a mim assim, encrenqueiro?
-Como ousa me fazer pagar penitência por motivos pessoais? Você deveria ser altruísta e acima disso tudo!
-Sua punição acabou por aumentar para 200!
-Eu não ligo!
-300!
-Surgat, Surgat, Surgat! – consigo empurrar Haamiah para longe quando chamo pelo demônio, quando abro os olhos, me deparo com ele em uma jaqueta xadrez vermelha, blusa branca e jeans rasgados, um cigarro está dependurado em seus lábios e o colar foi substituído por uma coleira de couro com espinhos.
Reparo também que ele não está com chifres nem com as asas, provavelmente contidas em algum artefato de magia, o moreno apenas se levanta do sofá e me envolve em seus braços, apoiando o queixo em meu cabelo.
-Você demorou mais que imaginei para me chamar, mas antes tarde do que nunca, pequeno.
Sua presença tem algo que me deixa tonto, bobo, me pergunto se foi uma boa ideia o invocar.
-Quer sair um pouco? Sua cara é de quem precisa de um pouco de sol e sorvete, quem sabe até um bom taco doce e… É isso, vou te levar numa feirinha de comida que tem aqui perto!
-Mas e minhas asas?
-Esse blusão esconde, neném.
Finalmente olho para baixo, para minha roupa: uso uma blusa branca de manga curta e um jeans, além de meias azul claras e um tênis preto, seu braço se apodera de meus ombros e me conduz pra fora do local que eu surgi sabe-se lá como. Permaneço com o olhar baixo enquanto esperamos o elevador, percebo estar num prédio, com a diferença que eu não posso ultrapassar as paredes, como costumo fazer.
-Você pode tirar isso da boca? – aponto para o cigarro, sentindo meu rosto corar: certeza que ele vai surtar por eu estar dando uma ordem e vai me mandar de volta para Haamiah e a gaiola. – A única vez que estive em um elevador, impediram o cara de entrar por conta do cigarro.
Sem cerimonias, ele o tira da boca e coloca na parte superior de uma lixeira, o encaro surpreso por não sofrer retaliação.
-Que foi? Não quero que se sinta incomodado no elevador ao meu lado, dado que é um espaço pequeno.
O elevador chega e entramos, dentro dele toca uma musica animada, pelo canto do olho vejo Surgat balançar a cabeça no ritmo, em uma dança discreta, não me atenho a musica por conta da confusão em minha mente. Sendo honesto, não presto atenção a quase nada e permito ser conduzido por aí, tão manipulável quanto um boneco, mas o barulho de risadas e conversas animadas me atrai, levanto a cabeça para ver um parque com diversas barraquinhas das mais coloridas, não consigo evitar o sorriso que atravessa meu rosto. O moreno me acompanha com um sorriso enquanto se deixa conduzir por mim, o peso em meu peito parece sumir conforme ando, como se deixasse algo ruim para trás, toda energia pesada.
-Ethan, você quer um desses? – ele aponta para uma barraca de símbolos religiosos, paro por um momento minha pulação para o olhar.
-Anjos não tem dinheiro.
-Estou te perguntando porque pretendo te dar um, claro, se quiser.
Mordo o lábio e me aproximo, um crucifixo de pérolas amarelas atrai minha atenção, ele é pequeno, tanto que não dá para colocar no pescoço, nem sequer passa no meu pulso, mas sua beleza desnorteia, o pego entre meus dedos enquanto Surgat paga, coloco no bolso da calça justa.
-Gratias tibi. – sussurro em latim, seu sorriso gentil aumenta e sua mão entrelaça à minha, num impulso, sou puxado para grudar o corpo ao seu, sou levado para o espaço no centro, onde pessoas de diferentes idades dançam com a música saída de caixas de som nos postes.
I can’t remember When you hurt me so bad
-Não há de quê.
But now the tables turn Apocalypse is coming
-Por que ser tão gentil comigo?
I can’t remember When you left me so sad
-Digamos que tenho paixão por ovelhas desgarradas.
-Você não está fazendo sentido.
But in the end I learned it rains in hell And angels could be bad
-Eu não preciso fazer sentido, só preciso que fique comigo.
A parte instrumental começa e não me reconheço quando meus braços envolvem seu pescoço e selo nossos lábios, o resto do mundo parece parar e eu me sinto seguro. Só espero não me arrepender.