O Primeiro Mandamento - Capítulo 22
De Vancouver para Nova York, o voo direto durou pouco mais de 5 horas. O avião da Air Canada pousou no Aeroporto LaGuardia por volta das 22h. Se Alexei não tivesse precisado voltar para pegar o passaporte, teria chegado ainda mais cedo.
Era irônico que seu primeiro voo na vida fosse com a Air Canada. Só quando chegou a Nova York Alexei conseguiu pensar nisso, e mesmo assim, pareceu mais que ele estava se forçando a pensar em qualquer outra coisa.
Ele acreditava que nunca mais voltaria para aquele país, mas nem teve tempo para refletir sobre isso. Assim que desembarcou, pegou um táxi do Queens para Manhattan. Não sabia qual hospital procurar, já que o noticiário não deu detalhes, mas assim que saiu do táxi, recebeu uma mensagem de T-Mac no celular: [Valery está no Hospital Mount Sinai, entre East Harlem e Central Park.]
Por sorte, o trânsito já havia diminuído naquele horário, e o taxista garantiu que chegariam em cerca de 30 minutos. Talvez pela expressão sombria de Alexei, o motorista encontrou as rotas mais rápidas e seguiu viagem. Foi só ao chegar em Nova York que Alexei conseguiu recuperar o fôlego; finalmente, conseguiu respirar fundo, mesmo que com dificuldade.
O frio surpreendeu: fazia mais frio do que ele esperava, e as pontas dos seus dedos estavam quase congeladas. Com as mãos rígidas pelo frio, ele conseguiu mexer no celular e começou a pesquisar. Procurando notícias e informações sobre Valery, Alexei teve acesso às coisas que ele fez nos dois anos em que estiveram separados. Em fóruns e comunidades online, era possível encontrar inúmeros relatos, indicando que Valery havia se estabelecido muito bem, até mais do que Alexei imaginava.
‘Então, por que isso?Se ele estava vivendo tão bem, por que chegou a esse ponto?’
Havia muitas especulações de que o acidente de Valery foi, na verdade, uma tentativa de suicídio.
De acordo com os relatos das testemunhas, Valery não tentou desviar do carro que poderia ter evitado. Apesar de o semáforo não ter mudado, ele correu diretamente na frente do último carro que passava, algo que reforçava quase como certeza a suposição de suicídio. Embora os empresários negassem essa possibilidade, os paparazzi espalharam fotos e comentários sugerindo que ele visitava frequentemente um psiquiatra.
Tudo parecia estranho e distante para Alexei. Ao observar a atenção e a fama associadas ao nome “Valery Belov”, ele começou a questionar se realmente deveria estar ali. Especialmente depois de saber que Valery frequentava um psiquiatra. Era impossível não pensar que ele mesmo poderia ser a causa disso – e não em um bom sentido. Alexei acreditava que, ao deixar tudo para trás e vir para cá, Valery finalmente seria feliz. Mas a ideia de que as cicatrizes deixadas por Alexei Sorokin em Valery eram tão profundas a ponto de causarem isso o perturbava profundamente.
‘Será que as coisas que fiz para salvar você acabaram se tornando o gatilho que te levou à destruição?’
As luzes ofuscantes dos arranha-céus de Manhattan, que pareciam quase perfurar o céu, só tornaram a confusão de Alexei ainda mais intensa. Ele havia agido impulsivamente ao vir, mas, agora, percebeu quantas regras havia quebrado. Desde entrar nos Estados Unidos com uma identidade falsa até violar o contrato com Khaleesi Winter, tudo o incomodava. Mais do que isso, ele não conseguia afastar o pensamento de que talvez sua presença piorasse ainda mais o estado de Valery.
‘Eu só vou confirmar e ir embora imediatamente.’
Com as mãos cada vez mais geladas, Alexei abria e fechava os dedos, tentando se acalmar. Quanto mais se aproximava do prédio do hospital, mais pálido ficava. ‘Ele está muito machucado? Será que vai precisar ficar deitado por muito tempo? Seu futuro profissional foi destruído por causa disso? Como ele está agora?’ Esses pensamentos incessantes, somados à culpa e ao medo, quase o enlouqueciam. Ele havia salvado Valery em Saratov, mas nunca imaginou que o encontraria assim, nesse estado, em outro lugar.
Sem tempo para sacar mais dinheiro, Alexei revirou a carteira e encontrou dólares o suficiente para pagar o táxi. Pagou, provavelmente deixando uma gorjeta excessiva, e ignorou o motorista tentando devolver o troco. Sem olhar para trás, abriu a porta do carro e correu para dentro do hospital. Ele sabia onde estava, mas não fazia ideia de onde ficava o quarto de Valery.
Parado no meio do movimentado saguão, Alexei observou as pessoas indo e vindo. Ele era apenas um estranho, e ninguém permitiria sua entrada para uma visita. Se ao menos Valery ainda carregasse o sobrenome Sorokin, poderia haver uma chance, mas agora não havia nenhum laço oficial entre eles. Certamente Valery não estava em uma ala comum, e, se Alexei tentasse vagar pelo hospital todo, seria facilmente percebido como suspeito e acabaria criando problemas.
‘Ele está bem aqui dentro.’
Alexei levantou a cabeça e olhou para o teto. ‘Vamos nos mover e procurar um pouco.’ Movimentar-se discretamente não seria tão difícil. Com tantas pessoas ao redor, ele poderia se misturar facilmente. Não precisava entrar no quarto – apenas chegar perto seria o suficiente. Apenas o suficiente para confirmar que ele estava vivo, ou, talvez, só para vê-lo acordar. Isso já bastaria.
Sentiu sua ambição crescer rapidamente, quase como se ganhasse vida própria. Alexei esfregou os olhos cansados e dirigiu-se ao elevador. Vancouver já era uma cidade bem movimentada, mas Nova York era incomparável. Especialmente em um hospital tão grande quanto aquele, o número de pessoas misturadas em um espaço só, com seus diferentes feromônios e cheiros, era suficiente para deixá-lo enjoado.
Nesse instante, ele captou um feromônio familiar. Era uma fragrância peculiar, como se já a tivesse sentido de relance antes, olhou ao redor e então viu algo que jamais poderia esquecer: uma figura pequena de costas, o cabelo preto, uma postura que conhecia bem.
Mesmo sem ver o rosto, Alexei sabia que era Ryan Winter. Um lampejo de hostilidade surgiu, mas logo foi suprimido pela ideia de que Ryan poderia ser útil. Se o seguisse, com certeza o levaria ao local onde Valery estava. Alexei sabia do vínculo entre Ryan e Valery, e isso tornava sua dedução mais que lógica, embora essa linha de pensamento o deixasse com um gosto amargo. No entanto, não havia tempo para perder em reflexões inúteis.
Enquanto observava Ryan esperando o elevador, Alexei misturou-se à multidão e entrou primeiro. Por sorte, havia um alfa de estatura semelhante à sua, o que permitiu a Alexei esconder-se atrás dele. Ele espiou Ryan discretamente para ver se ele reconheceria seu feromônio, mas o outro parecia completamente absorto, apertando os botões do elevador com um olhar ansioso fixo no painel que mostrava os andares. Alexei seguiu seu olhar, observando o painel também.
À medida que os andares passavam, as pessoas foram saindo do elevador. Quando finalmente chegaram ao 15º andar, restaram apenas quatro pessoas: Ryan, Alexei e dois outros homens. Assim que a porta se abriu, Ryan saiu imediatamente, e Alexei o seguiu alguns passos atrás, mantendo uma distância segura.
Uma enfermeira que passava pelo corredor lançou um olhar curioso a Alexei, talvez por não reconhecer seu rosto, ela pareceu avaliá-lo, analisando sua expressão e suas roupas, como se tentasse decidir se ele era algum repórter. No entanto, logo perdeu o interesse e seguiu em frente.
Tudo parecia correr bem, até que Ryan virou em outro corredor, indo em direção à ala de quartos privativos. Antes que Alexei pudesse segui-lo, foi parado por um segurança que bloqueou seu caminho com firmeza. O uniforme trazia a palavra “Security” em destaque, e o homem o encarava com profissionalismo.
— A partir daqui, é necessário um crachá de acesso. Se for visitante, por favor, apresente o crachá.
O tom foi cortês, mas firme. Alexei sorriu ligeiramente, os olhos estreitados em um gesto que parecia casual, embora claramente estivesse improvisando uma desculpa.
— Sou o guarda-costas do Sr. Ryan Winter, que acabou de entrar. Vou permanecer por aqui enquanto ele resolve as coisas. Não precisa se preocupar.
Mencionar o nome de Ryan foi uma jogada certeira. O segurança ficou momentaneamente confuso, observando Alexei com uma expressão indecifrável. Após um momento de hesitação, assentiu com a cabeça, permitindo que Alexei ficasse por perto.
— Não me lembro de você trazê-lo antes.
— Os paparazzi têm sido extremamente incômodos ultimamente.
A resposta pareceu convencer o segurança, que assentiu com um semblante compreensivo.
— Graças a isso, mal conseguimos descansar. Ontem mesmo, em apenas alguns minutos de troca de turno, um deles conseguiu invadir, e tivemos que chamar a polícia imediatamente.
— Deve ser bem cansativo.
Demonstrando que não queria causar problemas, Alexei recuou alguns passos e caminhou em direção ao banheiro. Ele não estava familiarizado com a rotina de um hospital, e isso só tornava tudo ainda mais difícil. Alexei nunca havia ido a um hospital, nem mesmo em situações de emergência. Lavou as mãos demoradamente sob a água corrente e, ao sair, o cheiro característico de desinfetante que pairava nos corredores o fez respirar um pouco mais aliviado. Era um aroma forte, mas menos sufocante do que o da movimentada recepção.
Ainda assim, só o pensamento de que Valery estava logo adiante fazia seu coração acelerar. Pelo que pôde perceber no rosto de Ryan, a situação não parecia tão grave. Ryan parecia inquieto, mas não estava com uma expressão de desespero absoluto. Apesar de seu desprezo pelo Omega, Alexei reconhecia que o outro realmente se importava com Valery. E, se Valery estivesse em estado crítico, Ryan certamente não teria aquela expressão.
Tentando tranquilizar a si mesmo, ele esfregou o rosto com as mãos.
‘Está tudo bem. Já faz dez dias desde o acidente, e nenhuma outra notícia grave saiu na mídia. Ele está vivo. Em um hospital deste porte, ele vai bem. Só preciso ter certeza que ele vai poder voltar a dançar e viver normalmente.’
… E se Valery estivesse gravemente ferido?
Se houvesse sequelas irreversíveis, Alexei permaneceria em Nova York para cuidar dele? A ideia parecia ridícula. Na verdade, ele começou a questionar por que estava ali em primeiro lugar. Quando viu a notícia, seu primeiro pensamento foi que Valery estaria sozinho, mas ele se esqueceu de Ryan. E, enquanto buscava informações sobre Valery na internet, percebeu que o outro tinha tudo de que precisava. Valery havia alcançado o sucesso, como se estivesse apenas esperando para se livrar de Alexei.
Yuri estava errado, ou talvez estivesse apenas parcialmente errado. Era verdade que Alexei não conseguia esquecer Valery. Mas mostrar-lhe o artigo da notícia foi um ato inútil. Não mudaria nada e só prejudicaria o próprio Yuri.
‘Nada vai mudar.’
Uma sensação de vazio tomou conta de Alexei. Sua racionalidade finalmente retornou. ‘O que você pretende fazer aqui?’ Se Valery o visse, isso só poderia piorar seu estado, e Alexei tinha certeza de que isso aconteceria. Para evitar criar uma situação desconfortável e agravar as coisas, o melhor seria ir embora imediatamente.
Como um mecanismo de defesa, assim que esse pensamento surgiu, Alexei tomou uma atitude. Ele pensou em sair para qualquer lugar e estava prestes a voltar pelo caminho que tinha vindo antes. No entanto, ao tentar virar para o corredor que levava à enfermaria, ele ouviu a voz de Ryan Winter bem à sua frente.
— Você consegue andar, Lerusha?
Seu coração afundou. Com os olhos bem abertos, Alexei apressou-se e voltou rapidamente pelo caminho de onde veio. No final do corredor bloqueado, havia um banheiro e uma sala de hospital comum, diferente da enfermaria protegida pelo segurança. Não sabia se estava vazia, mas se dirigiu até a sala de hospital. Pegou a maçaneta e girou, a porta não estava trancada, então abriu-se. Alexei entrou na escuridão com alívio, sem saber o que estava evitando.
— … Sim, estou bem.
Antes que a porta se fechasse, ele ouviu a voz de Valery, sua mão parou antes de fechar a porta. No artigo, dizia que ele estava em estado grave, então Alexei não esperava que Valery fosse capaz de andar, mas parecia que os ferimentos não eram tão graves quanto ele imaginou.
— Você realmente teve sorte. Quando se jogou o carro diminuiu a velocidade, por isso não se machucou tanto… Ainda não consigo acreditar. Se os outros carros não tivessem parado…
— Ryan, estou bem. Estou inteiro.
— Como assim inteiro? Tem muitos ossos quebrados, vai passar um bom tempo sem poder fazer nada.
— Desculpe.
— Não, eu não queria dizer isso. Eu só estava com medo de te perder…
— Eu já consigo andar, então logo vou estar melhor.
Ryan, com uma voz cheia de preocupação, se queixava para Valery, enquanto ele respondia com ternura e maturidade. A conversa entre eles era natural, como se fossem pessoas que se conheciam bem. Ao contrário de como falava com ele, Valery estava calmo e sereno. Quando Alexei ouviu aquela voz tranquila, pensou que talvez tivesse se preocupado à toa. Lentamente, ele fechou a porta.
TAC.
O som abafado da porta do hospital se fechou, cortando o barulho do lado de fora. A luz entrava apenas pela pequena janela da sala, que estava coberta por cortinas. Escondido na escuridão, sem a luz alcançá-lo, Alexei encostou lentamente suas costas na porta.
‘Ainda bem.’
O fato de Valery poder caminhar e falar assim indicava que ele não estava em um estado crítico. Conseguir andar significava que suas pernas não estavam gravemente feridas. E com Ryan Winter ao seu lado, ele tinha alguém para cuidar dele, dinheiro e recursos suficientes.
Alexei soltou um riso amargo. Já haviam se passado dois anos, então ele deveria estar mais indiferente ao ver Valery com Ryan Winter, mas ouvir apenas algumas palavras entre eles já fazia Alexei se sentir mal. A sensação de querer explodir a qualquer momento tomava conta dele. Enquanto a outra pessoa nem o considerava, Alexei ainda agia como se Valery fosse o primeiro capítulo de sua vida. Ele se sentiu um idiota por ter corrido até ali logo após ver a notícia sobre o acidente.
Era hora de voltar.
Havia um lugar para onde voltar, então Alexei se apoiou na porta e se deixou cair no chão, cobrindo o rosto, um cansaço tomou conta dele rapidamente. Mas o mais irônico, o mais absurdo, era que, só de saber que Valery estava perto, seu corpo, que antes estava cheio de calafrios, encontrou um certo alívio. Isso o deixou irritado, como se esse fosse o reflexo de seu próprio estado mental. Parecia que ele não conseguia despertar, mesmo depois de ver tudo o que tinha acontecido. Ele respirou fundo e contou o tempo. Observando a escuridão, ele se forçou a se recompor. Hoje seria o dia em que ele apagaria as mágoas que deixou para trás, no dia em que permitiu que Valery e Ryan seguissem juntos. Mesmo que não fosse possível, ele faria isso acontecer.
‘Você não é mais a razão da minha vida.’
Sussurrou para si mesmo, como se estivesse se doutrinando. Depois de repetir a mesma frase dezenas, centenas de vezes, ele se levantou. Já havia se passado um bom tempo, então ambos provavelmente já tinham ido para o quarto, ele se consolou com isso. Assim que saísse pela porta, pegaria o elevador e desceria para voltar ao aeroporto.
O turbilhão de emoções quase fez Alexei explodir. Quando ele pegou a maçaneta e a virou, seus sentimentos chegaram ao auge. ‘Eu não vou mais pensar em você. Eu juro, nunca mais vou te ver—.’
A intenção de sair correndo pelo corredor foi interrompida no momento em que ele abriu a porta, ao se deparar com alguém à sua frente. O cheiro de desinfetante e o avental de paciente foram os primeiros a atingir seu olfato. Ele pensou que fosse o dono do quarto e levantou a cabeça. Nesse gesto, ele sentiu uma estranha sensação de déjà vu.
Ao levantar o olhar, seus olhos se depararam com um par de olhos verdes. A dor e a raiva que haviam tomado conta de seu corpo um segundo antes desapareceram em um instante, ao ver aqueles olhos. Surpreso, Alexei ficou com os olhos arregalados e paralisado. O outro o observava com um olhar baixo. Além do cheiro do desinfetante, ele percebeu um leve aroma de feromônio, um cheiro familiar, sutil como uma fragrância floral. Mesmo que estivesse quase imperceptível em seu casaco, ele não conseguia esquecer e ainda se lembrava daquele cheiro:
O cheiro do corpo de Valery.
—É verdade …
A voz baixa dele sussurrou. Alexei apertou com força a mão que segurava a maçaneta, se não fizesse isso, sentiu que iria tropeçar.
‘Por que você está na minha frente?’
—Alexei é você?
A voz suave, como uma luz prestes a se apagar, soou estranhamente desesperada. Valery tinha uma expressão como se estivesse sonhando, Alexei conseguiu olhar para seu rosto, onde os olhos estavam vagos e o observavam. Apesar das marcas de ferimentos e hematomas no rosto branco, Alexei ainda o achava bonito.
—…É você, não é?
Mesmo olhando diretamente para ele, Valery continuou perguntando. Alexei não conseguia responder, sua garganta parecia bloqueada. Era difícil entender por que ele o olhava assim, com aquela expressão. Seu peito começou a bater forte.
—Não é um sonho, mas…
Valery continuou falando sozinho. Ele se aproximou de Alexei, encostando-se à porta. Aquela cena, onde ele o prendia sem possibilidade de fuga, trouxe lembranças do passado. Quando viu o alfa impedindo sua saída, todo o seu corpo ficou em chamas, seu coração bateu como se tivesse encontrado seu dono.
A mão de Valery se estendeu lentamente para Alexei. Sua mão esquerda, que não estava engessada, se aproximou cuidadosamente do rosto dele. Seus dedos ficaram a milímetros de tocar sua bochecha, hesitando. Valery inclinou a cabeça, com um olhar incrédulo, e falou novamente.
—Como o Ryan veio antes, com certeza… não é um sonho.
De repente, a mente de Alexei, que estava paralisada, voltou a funcionar. Ao ouvir o nome Ryan o corpo, que antes estava congelado, voltou ao normal como se tivesse tomado um balde de água fria.
—Você está me confundindo.
(N: Não! Tu vai meter essa 😂😂)
Alexei afastou a mão de Valery, que estava prestes a se aproximar dele. Nunca havia feito algo assim com Valery em toda a sua vida. O som que a mão fez ao se afastar foi mais forte do que ele imaginava, e ela caiu sem forças. Um pensamento fugaz passou pela cabeça de Alexei: o que eu estou fazendo com um paciente? Mas ao ver Valery e Ryan, ele se lembrou das decisões que acabara de tomar.
‘Eu não preciso do Valery de outra pessoa.’
O que fez Alexei decidir sair dali foi o turbilhão de sentimentos que ele mal conseguia controlar. Ele forçou sua mente a se acalmar e ignorou os olhos verdes piscando lentamente enquanto se afastava de Valery. Com um movimento brusco, Alexei se desvencilhou de seu abraço e passou pela pequena abertura entre ele e a porta, caminhando na frente.
— Espera.
A voz suave o chamou, e o som de uma voz frágil, quase infantil, fez com que ele quase parasse. Mas Alexei, decidindo com firmeza, apertou os passos e virou a esquina do corredor.
— Alexei, espera!
O som repetido de seu nome fez seu coração vacilar.
— Espere, espere, me de só um minuto…
A voz de Valery chamou com mais urgência, mas de maneira fraca, quase implorante. Alexei não entendia por que ele estava agindo assim agora, depois de tanto tempo sem se importar. Se fosse no passado, ele provavelmente teria aceitado sem saber o que fazer, mas tudo o que ele passou e o que acabou de ver impediram-no de olhar para trás.
— Não vá, Alexei.
A súplica veio, mas com esforço, Alexei ignorou o pedido.
— Por favor, eu preciso falar com você.
Não tinha nada a dizer. Era difícil de acreditar que Valery, que nunca havia procurado por ele antes, tivesse algo a dizer agora. O corredor do hospital apareceu à frente, e ele começou a ver os seguranças. Enfermeiras da enfermaria também estavam visíveis. A maneira como eles olhavam para ele indicava claramente que Valery estava o seguindo.
— Alyosha…!
A voz de Valery, carregada de emoção, soou antes que uma mão segurasse seu pulso. Alexei não esperava que Valery conseguisse alcançá-lo já que estava machucado, mas uma grande mão agarrou seu pulso. O rosto pálido e quase morto de Valery estava tenso, e a força com que o segurava mostrava o quanto ele estava desesperado. Alexei, para se libertar, não teve escolha a não ser se virar para enfrentar a situação.
— Me solte.
Sem mudar sua expressão, Alexei tentou afastar Valery, mas o alfa balançou a cabeça e persistiu.
— Você veio me ver?
— Não, agora me solte. Antes que eu tenha que te empurrar.
— Não pode só dizer que sim?
Enquanto Alexei levantava a mão para afastá-lo, Valery implorou. Sua voz soou como se estivesse chorando, e isso fez com que, sem querer, Alexei olhasse diretamente em seus olhos. Realmente, seus olhos verdes estavam marejados.
— Você… veio me ver…? Veio me procurar…?
— O que eu vim procurar?
Alexei rosnou, sua voz baixa e ameaçadora.
— Por que eu procuraria alguém que disse me odiar e achar repulsivo?
Valery parou abruptamente. Alexei sentiu a força de sua mão se dissipar. Ele não queria dizer isso, mas as palavras saíram de sua boca, alimentadas pela raiva crescente em seu coração. Um ressentimento que nunca tinha sentido antes surgiu ao ver o rosto de Valery. Ele não tinha vindo para isso, mas seus pensamentos se contradiziam.
— Deve ter sido um engano. Então solte minha mão e me deixe ir embora.
As palavras saíram de sua boca com um tom que ele nunca tinha usado com Valery. Os olhos verdes, antes assustados, começaram a se alargar, e ele viu lágrimas começando a se formar. O coração de Alexei apertou.
— Eu só quero que você volte para o quarto porque parece estar machucado. Me solte. Você não deveria estar perto de alguém como eu. Eu sou seu inimigo.
Ele falou palavras que nem mesmo acreditava. Talvez fosse algo que quisesse dizer há muito tempo, mas a forma estava errada. Mesmo assim, ele não conseguia deixar de se machucar com o fato de que Valery havia escolhido ir embora com Ryan. ‘Você escolheu Ryan.’
‘Por que, então, de repente está fingindo querer me ver?’
— Me solte, Valery Belov.
Quando Alexei disse isso com a voz mais fria que ele já usou, uma lágrima finalmente caiu dos olhos de Valery. O barulho repentino atraiu olhares de enfermeiras e outras pessoas ao redor. Alexei, sem querer se tornar o centro das atenções, fechou e abriu a mão rapidamente. Quando viu os olhos verdes de Valery manchados de lágrimas, a dor em seu peito se intensificou. Mesmo tendo falado de maneira cruel, ele não conseguia evitar a agonia que sentia.
‘Por que está chorando?’
Contrariando sua determinação, Alexei reprimiu o instinto de confortá-lo. Valery parecia tão frágil, como uma criança, que Alexei quase se sentiu compelido a abraçá-lo, mas resistiu. Mesmo derramando lágrimas silenciosas, Valery não soltou sua mão. Alexei respirou fundo, forçando-se a manter o controle, e girou o pulso, os dedos de Valery, momentaneamente sem força, se abriram devagar. Bastava puxar o braço, mas Alexei hesitou por um instante.
Para ser honesto, ele não esperava essa reação de Valery. E, por mais absurdo que fosse, uma ponta de desejo surgiu dentro dele. Era irônico. Apenas alguns minutos atrás, ele estava furioso ao ouvir a conversa entre Valery e Ryan.
— Lerusha!
No entanto, qualquer traço desse desejo foi despedaçado ao som da voz de Ryan chamando ao longe. Alexei viu o Omega ao fundo, olhando para eles com olhos arregalados de surpresa. Sem pensar duas vezes, Alexei puxou o pulso e se libertou. O olhar de Valery, agora vazio, permaneceu em sua mente enquanto ele se afastava, caminhando em direção ao elevador.
— Lerusha, você está bem? Por que ele estava aqui…?
Alexei ouviu a voz de Ryan se aproximando de Valery, mas ignorou e apertou o botão do elevador. Ele tentou ignorar os olhares que sentia em suas costas, que queimavam como agulhas. Tudo dentro dele dizia para sair correndo pelas escadas de emergência, mas ele não queria se rebaixar a isso, não na frente de Ryan Winter. Ele se manteve firme, encarando o painel que mostrava o andar mudando lentamente, o elevador parecia mais lento do que nunca. Ele praguejou mentalmente, pressionando o botão de forma quase mecânica.
Mas então, de novo, alguém segurou sua mão.
— Não vá, Alyosha.
Valery, com o rosto ofegante, o puxou. As lágrimas manchadas em sua bochecha fizeram o belo homem loiro parecer ainda mais melancólico e vulnerável. Alexei não disse nada, nem mesmo para mandá-lo soltar sua mão, ele simplesmente escolheu ignorá-lo. O elevador finalmente começou a se mover no ritmo que ele queria. O número mudou de 14 para 15, e a seta indicou a direção correta. Quando as portas deslizaram suavemente para abrir, Alexei suspirou de alívio ao ver que não havia ninguém lá dentro.
Mesmo ferido, Valery não conseguiu impedir que Alexei se livrasse de sua mão. Sem olhar para trás, ele entrou no elevador. Mas antes que a porta se fechasse, Valery a segurou com sua mão trêmula e pálida mais uma vez. Um segurança, que se aproximava com cautela, parecia pronto para tirar Valery dali.
Sem dizer uma palavra, Alexei pressionou o botão para fechar a porta, ignorando tudo ao seu redor. Ele fechou os olhos, tentando se isolar. Mas então, naquele momento, ouviu Valery sussurrar.
— Tentei te procurar… mas não consegui. Por isso, não pude ir até você.
O corpo de Alexei traiu sua vontade, a intenção de ignorar Valery foi completamente inútil. Sem perceber, seus olhos se arregalaram enquanto o encarava. Valery, afastou o segurança e se sentou em frente ao elevador, levantou o olhar para Alexei e sussurrou novamente:
— Eu queria te ver Alyosha todos os dias, mas parecia errado até pensar nisso, então nunca disse em voz alta. Não é assim? Eu deveria odiar Alyosha, não é? Pelo que Alyosha fez comigo, mas… —Valery balançou a cabeça, frustrado.— Sabe… Não importa o que tenha acontecido. Eu sempre… Sempre amei você.
Alexei sentiu que tinha algo a dizer, mas sua mente ficou completamente em branco ao ouvir aquelas palavras finais.
— Não consigo viver em um mundo sem Alyosha. Eu não quero viver. Não posso. Não consigo fazer nada.
Recuperando-se com esforço, Alexei finalmente abriu a boca para responder:
— Isso é um erro. Você viveu bem por dois anos. Você fugiu de mim como queria, conquistou tudo o que desejava.
— E se não fosse isso o que eu queria?
Valery, ignorando sua própria dignidade e os olhares ao redor, empurrou com o ombro o braço do segurança que tentava retirá-lo e, desesperado, sussurrou:
— Mas era exatamente isso que você queria. Você queria ir para uma cidade grande, conhecer alguém que apoiasse você e fazer o balé que sempre sonhou.
— Não era isso…
Valery se apoiou na porta e, tremendo, conseguiu se levantar. Com uma voz trêmula, como a de uma criança perdida, murmurou para Alexei:
— Foi por sua causa Alyosha que comecei no balé. Não lembra? Você dizia que, se eu fizesse balé, poderia ganhar dinheiro… muito dinheiro. Então, continuei sem parar. Eu fiz isso porque queria que você fosse feliz. Por que… você não entende isso?
‘Não pode ser verdade. Você não pode ter feito balé por um motivo tão absurdo.’
Alexei sentiu que continuar ouvindo só aumentaria sua confusão. Decidido a encerrar aquilo, ele segurou firme a mão de Valery, que ainda estava agarrada à porta. Valery piscou, surpreso com o toque repentino. Por um instante, Alexei teve a impressão de que o rosto dele ganhou um breve e delicado traço de cor, como se um vestígio de vida tivesse voltado.
— Eu preciso entender?
Alexei respondeu friamente soltando a mão de Valery que estava na porta:
— No fim das contas, não fui eu quem você escolheu.
Para evitar ouvir qualquer outra coisa, Alexei apertou o botão de fechar a porta do elevador. Valery tentou alcançá-lo novamente, mas, naquele momento, o segurança conseguiu contê-lo. Assim que as portas se fecharam, Alexei pressionou o botão para o térreo e deixou-se cair no chão do elevador. Sua mente zunia, e o coração batia tão forte que parecia prestes a explodir.
‘Por pouco, você quase se deixou levar pela situação sem saber o seu lugar.’
A imagem de Valery chorando e a expressão dele insistiam em inundar seus pensamentos. Era algo que ele jamais esperava. Incapaz de se acalmar, Alexei esfregou o rosto com as mãos.
“Eu amo você. Eu Sempre… sempre amei você”
As palavras ecoavam incessantemente em sua mente. Tentando afastá-las, Alexei tampou os ouvidos. ‘Não pode ser verdade. Foi só uma fala impulsiva.’ Mais cedo ou mais tarde, se ele decepcionasse Valery novamente, o outro certamente voltaria para Ryan. Afinal, ele já havia dito que entre eles não havia confiança e que estava cansado dele. Era apenas o desespero falando. Talvez fosse o efeito de estar fragilizado ou o resultado de nunca ter vivido sem Alexei.
Sem saber ao certo por que estava tentando convencer a si mesmo, Alexei chegou ao térreo. Quando as portas do elevador se abriram, o local estava lotado. Vozes questionavam por que ele demorou tanto e até o confrontavam diretamente. Ignorando tudo e todos, Alexei passou pela multidão e dirigiu-se ao saguão.
No entanto, antes que percebesse, olhou para trás.
Era óbvio que Valery não estava lá.
Confuso, Alexei se perguntou o que estava esperando ou desejando. Ficou parado por um instante, encarando as pessoas ao seu redor, antes de se virar novamente. Quando entrou no prédio, havia alimentado uma pequena expectativa. No entanto, quando Valery realmente o procurou e implorou, ele não conseguiu acreditar, e agora que o tinha afastado, nada fazia sentido.
Alexei caminhou lentamente, forçando-se a seguir em frente.
— Vai ficar tudo bem — murmurou para si mesmo. — Ryan Winter está lá com ele.
Era contraditório. Ele ficou furioso ao ver Valery com Ryan, mas, quando Valery o procurou desesperadamente, ele o afastou. Alexei não conseguia entender a si mesmo. E, no momento em que percebeu que não havia lógica em suas ações, finalmente entendeu o motivo.
Ele não conseguia suportar a ideia de perder Valery novamente.
Depois de tudo o que havia dito, o medo de que Valery o deixasse de novo o paralisava. Ele sabia que Valery não confiava mais nele, que a relação entre os dois estava completamente arruinada, apesar de ter se agarrado e se prendido a ele durante tanto tempo, no momento em que teve a chance, Alexei não conseguiu aproveitá-la. Não parecia ele mesmo. Mesmo depois de ter sido tantas vezes empurrado e machucado por Valery, ele sempre tinha se recusado a deixá-lo ir.
Com tantas cicatrizes acumuladas, ele realmente deixaria Valery escapar por causa de um simples medo?
O que realmente importa para você é que ele não consegue se livrar de você, não é?
A imagem de Valery, desmoronando sem se importar com os olhares ao redor, invadiu sua mente. Alexei lembrou-se de como ele ignorou Ryan, que o chamava, e de como o segurou, implorando para que não fosse embora. Ele pensou que a versão de Valery que conhecia já tinha desaparecido, mas, ao olhar para o rosto desesperado e suplicante do homem, foi como reviver o momento em que ele entrou em sua vida. Naquela época, Valery também havia agido da mesma forma, como se o pensamento de Alexei partir fosse a coisa mais aterrorizante do mundo. Ele se agarrou a Alexei como se sua vida dependesse disso.
Alexei parou e se virou. Ele voltou pelo mesmo caminho, correndo por entre as pessoas, rumo ao elevador. Sua escolha não fazia sentido lógico, mas ele seguiu seu instinto. Desde o começo, os sentimentos que nutria por Valery nunca foram algo que o senso comum pudesse compreender.
Não importa como o vínculo entre eles seria definido.
Enquanto apertava o botão do elevador, ofegante, Alexei sabia que só havia uma coisa importante. Sob o nome de família, sob o nome de amantes, sob qualquer definição que fosse…
Ele precisava de Valery.
Quando as portas do elevador se abriram, ele o viu. Valery estava lá, de pé com dificuldade, o rosto completamente destruído pelas lágrimas que não conseguiam parar de cair. Era o seu Valery, frágil e chorando como uma criança.
— Não vá… Alyosha.
Valery soluçava, balançando a cabeça como uma criança assustada.
— Se você for embora, eu também vou. Para onde você for, Alyosha, eu vou com você…
Mesmo enquanto o segurava, Valery parecia hesitante, como se não tivesse coragem de tocá-lo completamente. Ele parecia uma criança com medo de que Alexei fosse desaparecer se o tocasse de forma errada. As palavras do garoto ecoaram em sua mente: “Tive medo que meu irmão me odiasse, que você me abandonasse…”
—Eu também vou… se você me levar… não pode me levar?
O Valery que Alexei pensou ter desaparecido com o passar dos anos ainda era o mesmo daquela época, ainda tão pequeno e vulnerável. Seus olhos verdes, cheios de lágrimas que não paravam de cair, encaravam Alexei, com desespero. O silêncio entre eles se estendeu, e Valery mexeu os dedos nervosamente, mordendo o lábio com força. As portas do elevador começaram a se mover lentamente, como se fossem se fechar.
—Desta vez, se você vier comigo…
Foi então que Alexei falou. Valery rapidamente colocou a mão na fresta da porta, que se abriu novamente com um som surdo.
— Você nunca vai conseguir se livrar de mim, mesmo depois da morte.
De pé na linha que separava o interior do elevador e o chão do térreo, Alexei falou calmamente, com uma expressão que poderia ser vista como severa ou arrogante. Ele não parecia gentil, muito menos afetuoso, aquele ar autoritário que Valery conhecia tão bem ainda fazia parte de Alexei e provavelmente o acompanharia por toda a vida.
— Mesmo assim, você ainda vai querer vir comigo?
Apesar da dureza nas palavras, o rosto de Valery começou a se iluminar lentamente. Observando a alegria que surgia no rosto dele, Alexei repetiu:
— Eu não sou do tipo que muda por causa do que você quer. Mesmo assim, você ainda quer vir comigo?
Mesmo com palavras que poderiam fazer alguém hesitar, Valery assentiu devagar. Seus olhos verdes, cheios de lágrimas, começaram a brilhar. Com um rosto que misturava choro e sorriso, difícil de decifrar, Alexei deu um passo para trás. Quando Valery se assustou e mostrou um olhar de pânico, ele sorriu em seu lugar.
Seus dentes brancos apareceram sob os lábios rosados, revelando o sorriso travesso e juvenil que Valery tanto amava, ele estendeu a mão. Antes que a porta se fechasse por completo, Valery saiu lentamente do elevador. Mesmo com a aparência completamente desarrumada, ele olhou fixamente para Alexei e, com cuidado, estendeu a mão esquerda e logo segurou a mão do homem com delicadeza.
— Sim.
E então, com um sorriso que não combinava em nada com alguém que acabou de fazer a pior escolha da vida, ele pareceu incrivelmente feliz. Como se finalmente tivesse voltado ao lugar onde sempre deveria estar, suas mãos se entrelaçaram. Ignorando completamente as pessoas ao redor, que murmuravam sobre a cena incomum, Alexei puxou Valery pela mão. Como naquele dia frio de inverno em que ele correu com Valery, que o esperava imóvel no mesmo lugar.
Mas havia uma diferença em relação àquele dia…
Dessa vez, eles não estavam fugindo de nada, nem de ninguém. Seguravam as mãos apenas por si mesmos e pelo amor dos dois.
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Fim do volume 3.
nathkiss
mds, essa obra me faz ter muitas opiniões!! só sei q preciso de mais!! mto obrigado por traduzirem essa obra!