Pontos de sutura - Capítulo 29
Dohan acelerou os passos e correu pelo corredor que o levava diretamente ao banheiro dos funcionários. Sentiu que estava prestes a chorar e definitivamente não queria que ninguém percebesse isso.
Dohan empurrou o corpo para dentro do compartimento mais distante e trancou a porta. Foi uma tremenda sorte que não houvesse ninguém no andar intermediário, onde havia apenas áreas de descanso como salas para missas e capelas privadas.
Por um momento, ele se sentiu sobrecarregado pela tristeza, mas depois conteve suas emoções tanto quanto seu corpo permitiu e respirou profundamente. Prendeu a respiração e se ajoelhou até que a voz de Hyewon, procurando por ele, e o som de seus crocs batendo no chão de mármore, apenas desaparecessem ao longe. Ele havia olhado para Hyewon todos os dias no hospital durante anos e sempre se perguntava com frequência como o homem estaria em determinado momento ou como se sentiria após o turno… Mas agora não era exagero dizer que ele nem sequer queria vê-lo.
—Meu Deus… O que você realmente pensa de mim?
A tristeza continuava crescendo dentro dele, então Dohan falou consigo mesmo, mesmo que sua voz estivesse incrivelmente embargada. O que ele pensava dele? Não apenas Hyewon, mas todos os outros. Que impressão ele estava passando? Seus colegas o chamavam de “Sex Boy” e é claro que houve um tempo em que ele achou isso satisfatório. Mas agora ele pensava que tudo fazia parte de um karma bastante bem organizado que surgiu de suas próprias e terríveis ações. E olhando para trás em seu passado, Dohan suspirou e bateu a testa contra a porta que dividia sua cabine das outras. Fazer isso não o estava fazendo se sentir melhor nem de longe, mas era uma alternativa mais sensata do que ficar sentado sem fazer nada e se perder em seus próprios pensamentos fatalistas. Além disso, ele pensou que definitivamente iria chorar, quer Hyewon estivesse na frente dele ou não.
E agora, mesmo ele tendo se esforçado muito para suportar, ao se ver sozinho em um espaço tão pequeno, suas lágrimas simplesmente começaram a brotar.
No clube, Hyewon disse que se ele continuasse vivendo assim, seria punido de uma forma completamente terrível. E agora, ficou claro que Kang Hyewon estava se certificando de cumprir suas palavras pessoalmente. Era como se o tivesse golpeado na cabeça com um grande martelo até deixá-lo confuso e dolorido. Desprotegido só por ter ouvido algumas palavras que, para começar, nunca deveria ter saído de sua boca.
—Kang Hyewon… Então, se eu disser para fazermos de novo, você vai aceitar só porque faz parte de quem eu sou?
Dohan sorriu enquanto murmurava para si mesmo, continuando a bater a cabeça contra a porta do banheiro. Para ser honesto, o prazer que Dohan sentiu na noite passada foi incrivelmente fabuloso. Foi sexy, foi terno e foi terrivelmente íntimo. Ele não era do tipo que julgava coisas como inocência porque já havia feito sexo com muitas pessoas, mas, se olhasse bem, Hyewon foi o primeiro homem de Dohan em todos os sentidos da palavra. E só de pensar nisso, ele começou a sentir calor em todo o corpo. O pescoço do homem, com a cabeça inclinada para baixo, estava quente como o inferno e o mesmo acontecia com suas bochechas e suas mãos. Ele não conseguia se lembrar do rosto de Hyewon durante aquela noite, mas sabia claramente que as sensações que ele lhe proporcionou foram incrivelmente boas.
Im Dohan era uma pessoa que se apaixonava facilmente pelo prazer, então se Hyewon respondesse que gostava da forma como ele se movia ou da maneira como se comportava na cama, ele se jogaria em sua direção e teria um relacionamento íntimo com Hyewon novamente sem recusá-lo. Não havia motivo para recusar desde o início! E ele não sabia se deveria ficar feliz ou triste pelo passo que acabaram de dar no jardim sem perceber. Deveria se alegrar com o fato de que, mesmo que não pudesse confessar, eles haviam aberto a porta para um relacionamento em que poderiam compartilhar algo físico? Ou ele deveria lamentar por ser tratado como uma pessoa fácil, não importa o quanto o amasse?
Ele nem sabia por que manteve a boca fechada daquela forma em vez de se confessar. Não sabia por que não…
Por que simplesmente não…
Nesse momento, sua respiração ficou presa. As lágrimas encheram seus olhos e ele não conseguiu dizer mais nenhuma palavra. Suspirou mais uma vez e segurou sua cabeça trêmula com ambas as mãos. A sacola de compras batendo em seu pé estava o incomodando muito naquele momento, então ele simplesmente a jogou fora como se fosse um saco de lixo. E daí se ele tinha trazido um presente bonito? Para que serviu mesmo!? Dohan chutou a sacola que estava ao lado da porta, depois chutou também a caixa até destruí-la, jogou no cesto e calçou os crocs que estavam dentro. Ele estava soluçando com muita força, mas mesmo assim tentou se acalmar o máximo possível apenas para se concentrar nos jibbitz e nos sapatos brancos que pareciam excepcionalmente limpos devido ao cenário. Assim como os de Kang Hyewon.
Quando ele fungou e seu humor pareceu se acalmar de repente, Dohan desabafou sua raiva pisando no peito do pé de seus sapatos novos até que eles fizeram um barulho semelhante ao de um rasgo. Agora, ele tinha que parar de agir como uma criança e voltar ao trabalho. Ele tinha que ser profissional e era seu dever aceitar o que havia acontecido e tirar apenas o melhor disso para poder aprender com seus erros. No entanto, Dohan saiu do banheiro como uma vaca indo para o matadouro, e voltou ao centro cirúrgico da mesma forma que um zumbi. E estava tão exausto que até se sentou no primeiro banquinho disponível que encontrou.
Kim Hee-jae se aproximou dele e disse:
—Professor, pare de chorar. Não sei exatamente o que aconteceu, mas garanto que tudo ficará bem em breve.
—…
Ele não queria que ninguém percebesse o que acabara de acontecer com ele, mas aparentemente Kim Hee-jae era um fofoqueiro. Dohan, que ainda estava com coração partido por culpa de seu melhor amigo, olhou para Hee-jae com uma expressão deprimida e então, ao contrário do que pensava que faria, apenas sorriu para ele. Hee-jae estava certo, mas Dohan, que não podia admitir isso, simplesmente olhou para o rosto inocente dele e disse que “não sabia o que ele estava tentando dizer.” Ele limpou a garganta e fixou agora seu olhar no monitor, então revisou o registro da cirurgia que havia escrito mais cedo e tentou se concentrar nas letras pretas e verdes que estavam se espalhando diante de sua folha. Mas como era de se esperar, ele não conseguia se livrar facilmente das muitas emoções complexas que estavam consumindo sua mente naquele momento.
—Hee-jae, você sabe que o que acontece comigo não é da sua conta, certo?
—Bem…, eu só queria dizer que acho que o doutor Kang está tão triste quanto você.
Ele tentou canalizar toda sua raiva em Kim Hee-jae, como se quisesse descontar nele sobre o que havia acontecido… Mas quando se deparou com o rosto do Omega, que respondeu de maneira casual e depois teve a audácia de olhá-lo com uma expressão de cachorrinho em apuros, tudo desmoronou tão rapidamente que ele ficou sem saber o que fazer. E enquanto observava Kim Hee-jae, que aparentemente não se importava com o que ele ia dizer, e notava suas mãos ao mesmo tempo, de repente veio à sua mente o rosto Kang Hyewon e suas palavras, isso foi o suficiente para fazer seu peito começar a arder novamente.
—Ele… Tem trabalho. Não há tempo em sua agenda para ficar triste.— Então ele disse.— Ou talvez ele esteja sentado com as pernas esticadas na sala dos médicos pensando na maneira correta de preencher seus amados relatórios. Afinal, é a única coisa que importa para alguém assim.
—Mas o turno está bem tranquilo hoje…
—… Senhor Hee-jae, o que acabou de dizer?
Eram palavras que não deveriam ser ditas no pronto-socorro, no posto de enfermagem ou em qualquer lugar do hospital. Hee-jae imediatamente se inclinou ao perceber isso e pediu desculpas a todos os seus colegas, que o olharam com uma expressão incrivelmente nervosa no rosto.
Havia uma crença entre a equipe, fossem médicos ou enfermeiros, de que quando não havia pacientes, vários apareceriam em massa se alguém dissesse essas palavras: “É um turno tranquilo.” E por isso, todos ficaram quietos em seus lugares, prendendo a respiração como se o tempo tivesse parado por um momento, tremendo de medo e olhando uns para os outros como se quisessem começar a correr. E quando Dohan tocou o ombro de Hee-jae com a intenção completa de repreendê-lo, o telefone tocou violentamente na seção de emergência. Às duas e meia da manhã, uma chamada entrou no centro cirúrgico informando que havia ocorrido um acidente horrível na estrada e que precisavam de todos os quartos disponíveis que pudessem oferecer. Dohan se apressou em sair assim que ouviu isso.
—Para onde está indo?
—Como para onde estou indo, Hee-jae? Temos trabalho graças a você! Você também deveria começar a se mover.
Era hora de deixar de lado toda a questão da confissão fracassada e do amor não correspondido por seu melhor amigo. E determinado a isso, Dohan pegou suas coisas e saiu.
***
Foi uma madrugada terrível. E por causa disso, Dohan não pôde sair do centro cirúrgico, mesmo que já tivesse passado muito além do horário de seu turno. Na verdade, ele até teve que fazer algumas horas extras para ajudar seus colegas. Ele havia começado a trabalhar à noite, quando estava absolutamente escuro, e só conseguiu sair no dia seguinte, quando o sol já estava alto no céu.
Uma tempestade atingiu o hospital a ponto de ser impossível dizer se foi por causa da regra que Hee-jae quebrou ou apenas algo provocado por sua má sorte. Devido a uma colisão em larga escala em uma estrada próxima, todos os funcionários do Hospital Universitário de Deokwon estavam correndo de um lado para o outro sem chance de descanso. Foi uma emergência tão grande que até Kim Byung-jun, que deveria ter o dia de folga, também foi arrastado para o campo de batalha por seu supervisor.
Dohan entrou no centro cirúrgico às 3 da manhã e saiu de lá depois de 6 longas horas. Obviamente, suas pernas, que já estavam inchadas porque ele não estava usando meias de compressão, agora estavam quase irreconhecíveis, então ele reclamou várias vezes antes de se sentar em um banco em frente à cafeteria. Kang Hyewon também estava lá, mas ainda não havia percebido isso.
Hyewon teve que operar uma paciente que foi colocada na mesa de cirurgia com os órgãos completamente destruídos devido ao impacto do acidente de carro. E quando a mulher morreu, ele teve que aguentar ver a filhinha dela morrer também, além de um paciente com câncer que acabara de ser transferido para a UTI. Então foi uma vez no pronto-socorro, uma vez na mesa de operação e depois numa maca que estava no corredor. Agora não era hora de brigar emocionalmente com ele ou dizer coisas sobre quem estava certo, quem estava errado ou quem tinha o direito de estar chateado. Dohan sentou-se ao seu lado sem dizer uma palavra e deu tapinhas no ombro dele. Seu cabelo, que sempre estava meticulosamente penteado, estava bagunçado em seu rosto, e vestígios do sangue de outra pessoa ainda pareciam escorrer de seus sapatos.
Hyewon ficou no banco, encarando o teto sem piscar uma única vez. Ser médico, ver as pessoas à beira da morte sem poder fazer nada para impedir, era realmente difícil. Era terrível, não importava o quanto estivessem acostumados com isso. Porque talvez o tempo os tornasse especialistas, mas não insensíveis. Embora Hyewon fosse reservado e pouco expressivo, ele era o médico mais devotado e afetuoso que Dohan já conheceu. Além disso, para variar, o paciente com câncer terminal que faleceu era um homem jovem que havia estado sob os cuidados de Hyewon por um bom tempo e tinha estabelecido uma amizade com ele.
O robodoc tinha um coração mais caloroso do que o esperado.
—Ei… Ei, venha. Vamos para casa.
Ao ouvir as palavras de Dohan, Hyewon assentiu sem abrir a boca. Através de seus óculos tortos, um rosto cansado e triste se desenhou, chamando completamente a atenção do enfermeiro. Seus longos cílios tremiam e a pele sob seus olhos havia se tornado tão escura que parecia estar roxa. Dohan segurou a mão branca que pendia sobre o banco e entrelaçou os dedos com os dele até que a temperatura corporal deles começou a esquentar. Então ele se levantou e o ajudou a fazer o mesmo para tirá-lo dali.
Hyewon estava inexpressivo, como se nada tivesse acontecido, mas agora era a hora em que ele precisava de conforto e companhia. E a única pessoa neste mundo que poderia notar cada uma de suas mudanças e acalmá-lo exatamente como ele precisava era Im Dohan. E a verdade era que ambos sabiam disso perfeitamente.
Os dois caminharam de mãos dadas sem soltá-las nem uma única vez.