Ovos Benedict - Capítulo 03
À noite, ele estava bastante cansado. Enquanto esperava por Kyle, Nick acendeu um cigarro e ajeitou o casaco. Depois do trabalho, um grupo de advogados a caminho de um bar parou e cumprimentou Nick. Era estranho que, embora fossem rostos que ele sempre via, hoje pareciam desconhecidos para ele.
Pensando bem, foi assim desde que chegou na empresa. Seu corpo estremecia toda vez que seus colegas sem hesitar o comprimentavam com tapinhas nas costas. Fazia muito tempo desde que ele sofreu de dores no corpo, foi uma sensação tão estranha que se perguntou se estava realmente doente.
Nick continuou olhando para o cigarro queimado e refletiu sobre seu dia. O seu olfacto era desnecessariamente sensível, e até captava cheiros que normalmente não conseguia sentir, o que lhe dava uma dor de cabeça. Cada cheiro era farejado na empresa, desde o aroma do detergente seco ao incenso de toranja flutuando pela sala de reuniões, ele podia sentir tudo claramente.
Era algo difícil de definir. Como um cheiro de almíscar agridoce, era como um perfume fresco que o prendia firmemente, de tal forma que se lamentava em ter de tirar férias anuais e se manter longe do cheiro.
Depois de jantar no La Chapelle, um restaurante francês com Kyle, seu estômago começou a se sentir enjoado e teve que resistir ao impulso de tirar sua beca durante toda a argumentação na sala de audiências. Foi uma sorte estar fazendo uma defesa conjunta, ou poderia ter estragado tudo.
Quando ele terminou o cigarro, alguém colocou a mão em volta da cintura de Nick. Um cheiro forte, mas suave, tomou conta de Nick. Sua nuca ficou gelada como se o vento frio tivesse soprado.
— Nick, me desculpe.
Quando virou a cabeça, viu Kyle. Seu cabelo preto, cuidadosamente penteado, estava espalhado. Suas sobrancelhas estavam curvadas desajeitadamente sob a franja que cobria levemente sua testa. Nick riu diante da expressão no rosto do outro.
— O que há de tão ruim para lamentar, te fazendo mostrar essa expressão?
— Eu fiz você esperar… saí e fiquei preso por um tempo. Sinto muito.
Depois de esfregar o cigarro no cinzeiro, Nick estendeu a mão e abraçou Kyle pelas costas. Kyle fechou a boca enquanto ele dava tapinhas em suas costas. Como sempre, ele agia como se Kyle fosse seu irmão mais novo. De facto, houve muitas vezes em que Nick se preocupou mais com ele do que com os seus Júniors no ensino médio.
Nick ficava com o coração partido toda vez que via o garoto tão frágil sendo atormentado pelas pessoas apenas por ser um alfa dominante. Como estava cheirando a fumaça de cigarro, em vez de tocar o rosto de Kyle com a mão, ele disse para acalmá-lo.
— Não fiquei parado esperando. Saí para fumar um cigarro. Podemos ir agora?
— …Sim. Como está o resfriado? Piorou?
Kyle pôs as costas da mão na testa de Nick. Nick fechou os olhos com o calor do toque. Foi bom ver Kyle, mas o seus tremores aumentaram. A área onde a mão tocou começou a ficar cada vez mais quente, e então o cheiro desconhecido tornou-se mais espesso.
Parecia estranho. À primeira vista, pensou que o cheiro ambíguo corporal que não podia ser explicado, era como o cheiro de feromônios do qual ele só tinha ouvido falar. Não poderia ser. Nicholas White tinha vivido como um beta por 29 anos. Era estranho se sentir assim de repente. Nick abriu a boca enquanto lutava para suprimir o calor vertiginoso.
— Estou bem.
— Sua testa está tão quente, Nick. Eu posso fazer as compras depois, então vamos para casa.
— Não, eu realmente estou bem.
As sobrancelhas de Kyle caíram levemente. Nick rapidamente se rendeu enquanto os lamentáveis olhos azuis o encaravam. Não conseguia lidar com a expressão de Kyle quando ele ficava assim. Nick estendeu a mão e apertou o nariz de Kyle levemente.
— Não faça essa cara de novo.
— Mas…
— Está bem, vamos pegar um táxi. Ouvi dizer que haverá uma greve de ônibus na semana que vem. Vamos pegar um táxi por um tempo.
Kyle colocou a mão em volta da cintura e guiou Nick. Era uma postura excelente para os outros mal-interpretarem, mas estava claro que Kyle ficaria triste se ele apontasse esse fato, então apenas o deixou levá-lo até a rua desse jeito.
Kyle conseguiu facilmente chamar um táxi que mal se espremia entre as fileiras de ônibus vermelhos. Os táxis pretos tinham uma demanda relativamente baixa. Mesmo os advogados mais bem pagos sofrem com os aluguéis sem escrúpulos em Londres, empréstimos estudantis remanescentes e despesas de subsistência antes de completarem mais de cinco anos de experiência. Portanto, não havia razão para pagar o dobro da tarifa de um táxi normal e ficar com um táxi preto todos os dias.
Mas Kyle nunca pegava um táxi que não fosse preto. Dinheiro não era problema para ele. Quando era jovem, Nick muitas vezes discutia, mas agora era uma coisa pela qual não sentia vontade de discutir. Ainda era uma parte dolorosa para Nick, que era próximo das pessoas comuns, mas o que podia fazer? Nick, que havia entrado no táxi que parou bem na frente deles, disse seu destino.
— Por favor, vá para Bedford Place, 39.
— Por qual rua você quer que eu vá?
— Apenas evite Holborn. Embora a construção da estação do TCR tenha sido concluída, ela ainda está bloqueada.
Kyle fechou a porta e esfregou as costas da mão de Nick. Rindo com a sensação de cócegas, Nick se recostou no assento. Estava cansado. O taxista mudou a estação de rádio para o canal 1, e a voz de Scott Mills ecoou baixinho no táxi.
Nick olhou fixamente pela janela e esfregou os olhos. O calor parecia aumentar e tomar conta do seu corpo, e seus olhos estavam pegando fogo. Sentia a pressão em seus olhos aumentar e a testa onde Kyle havia tocado esquentou. Quando puxou a gravata um pouco, porque estava se sentindo desconfortável, Kyle percebeu imediatamente.
— Devo ligar para Luther?
Luther, o médico pessoal de Kyle, às vezes também atuava como médico de Nick, mas depois de ele ser chamado para fazer um curativo em um pequeno corte na mão do homem, Nick parecia ter ficado constrangido. Ele balançou a cabeça.
— Não, não precisa. Acho que só tenho que dormir.
Embora não precisasse de um médico, Nick, que acabou admitindo sua condição, balançou a cabeça enquanto olhava para Kyle. Sua visão estava turva e Kyle se via como um borrão. Os lábios vermelhos carnudos no rosto branco do homem chamaram sua atenção.
Será que o meu cérebro também está enlouquecendo por causa da febre? Nick estalou a língua enquanto pensava isso. Kyle, que costumava cheirar a ar fresco, agora tinha um cheiro refrescante e doce. Ele mudou o perfume? Kyle nem usa perfume. Seu cérebro estava confuso. À medida que uma impaciência incompreensível crescia, Nick continuou olhando para os lábios de Kyle como se estivesse possuído. Com o olhar gritante, Kyle estendeu a mão e tocou os lábios.
— Há alguma coisa neles?
— Oh, desculpe.
Ele se distraiu um pouco. Parece realmente haver algo de errado. Talvez devêssemos ligar para Luther. Nick rapidamente virou a cabeça, olhou para o banco do motorista e cerrou os punhos. Faz muito tempo desde que estive doente, então meu sistema sensorial deve estar confuso.
Enquanto fazia suposições, o táxi entrou em um beco e chegou a Russell Square. Depois de virar em uma placa vermelha do <Pret A Manger> e entrar em uma rua tranquila, o táxi parou logo em seguida. O medidor marcava 25 libras. Kyle entregou ao homem duas notas roxas e abriu a porta do táxi sem pegar o troco.
Deixando para trás os agradecimentos do taxista pela generosa gorjeta, ele pisou na estrada. O ar frio ardeu em seu corpo, o vento parecia espetar sua pele. Kyle subiu as escadas da casa georgiana branca, construída no estilo palladiano. O som de inserir e girar a chave ecoou à distância. Sua tontura aumentou.
— Kyle…
Sentindo-se atordoado, Nick mal conseguia chamar Kyle. O pequeno eco que ele emitiu enquanto segurava sua cabeça em colapso deve ter chegado aKyle. Nick balançou a cabeça enquanto olhava para o homem correndo em sua direção, com o rosto distorcido.
Espere um minuto, por favor, me ajude …
As palavras não terminaram. O estuque branco que adornava a casa estava inclinado e o chão virado. Nick fechou os olhos assim que o cheiro de Kyle atingiu seu nariz. Os seus pensamentos pararam assim que a sua visão se tornou negra.
* * *
Quando Nick desabou, o coração de Kyle começou a bater descontroladamente. Parecia que o chão sólido estava desmoronando em um instante. Antes mesmo de entender o que estava acontecendo, Kyle moveu as pernas, saiu correndo e agarrou Nick. O corpo sólido em seus braços estava quente como uma bola de fogo. Podia sentir o calor mesmo através do casaco. O som do seu coração batendo era ensurdecedor. Sentindo o seu sangue frio em contraste com o corpo quente do homem, Kyle empurrou a porta aberta com o pé, apoiando Nick em seus braços.
Ele estava extremamente nervoso. A partir de amanhã, mesmo que seja necessário, não vou deixá-lo ir para o escritório. Não, agora tenho que ligar para Luther imediatamente. Isso só aconteceu porque estive hesitante e não consegui tomar uma decisão, como um estúpido.
Kyle, que tinha trabalhado arduamente para suprimir a forte irritabilidade que sentia por si mesmo, conduziu Nick para dentro. Olhou para o corpo que pendia sem força e parecia estar inconsciente. Estava sufocando com a terrível sensação de ansiedade que corria em suas veias. Partindo do pensamento de que morrer assim não ajudaria Nick, o sentimento de inquietude que ele havia suprimido por muito tempo atacou Kyle como se fosse cronometrado.
Ele deitou Nick no sofá, deixando as emoções negativas correrem em sua mente. Estendeu a mão, mediu os batimentos cardíacos no pescoço de Nick e imediatamente ligou para Luther. Seu médico não atendeu imediatamente o telefone. Após cerca de cinco chamadas, ouviu a voz do homem gentil de meia-idade.
[Aqui é Luther Milan.]
— Sou eu Luther. Você poderia vir até a minha casa agora, imediatamente?
[Agora mesmo?]
— Nick desmaiou. Sua febre está alta.
Uhh. Um suspiro soou através do telefone. Kyle, reprimindo a respiração ofegante e a ansiedade que iria surgir a qualquer momento conseguiu acrescentar algumas palavras. Seu autocontrole estava tão instável que os seus dedos agarrando o celular estavam brancos.
— Gostaria que você viesse o mais rápido possível. Vou pagar o que for necessário.
Se ele não pudesse ir imediatamente, teria que encontrar outra pessoa. Se Luther não chegasse em 20 minutos, teria que dirigir até a estação de Euston. O hospital universitário mais próximo ficava ali. Claro, era melhor que Luther pudesse ir. O médico que cuidava de Kyle desde ensino médio, era uma das pessoas mais talentosas da Europa.
[Ei, Roger. Conhece a Universidade (SOAS) certo? Dirija nessa direção… Roger: Sim senhor. Fica perto de King’s Cross, por isso devemos estar lá dentro de dez minutos.]
— Muito Obrigado.
[Kyle, não entre em pânico. Feromônios tão fortes como os seus podem ter um efeito negativo no paciente. Vai ficar tudo bem, só espere um pouco.]
— …Certo.
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Continua …