Noite De Caça - Capítulo 105
4 meses depois. Ilha Hawngdo.
Miau.
Algo felpudo e fofo deu um tapa no meu rosto, acompanhado de um suave miado. Abri os olhos e vi Haenim parado, olhando para mim. O gatinho era redondo, coberto de pelos amarelos e seus olhos eram dourados.
— Haenim.
Sorri e estendi a mão para ele, que esfregou a cabeça em minha mão. Após acariciar o carinha que ronronava por um tempo, levantei da cama. O sol estava tão forte que achei que tinha dormido demais, mas ainda eram 9 horas da manhã. Haenim me seguiu para fora da sala de estar, miando.
A primeira coisa que eu fazia ao acordar era alimentar os gatos.
Enquanto eu tirava a ração da caixa, Haenim continuou agarrando em meu braço. Ela gostava muito de pessoas.
— Vamos, coma.
Era uma casa independente, com um jardim junto à porta da sala de estar. Longe de ser luxuosa, essa era uma casa pobre que poderia ser encontrada em qualquer lugar do interior. Ela foi comprada por um preço incrivelmente baixo e eu vivia de maneira adequada, usufruindo do mesmo estilo de vida que o outro inquilino havia deixado para trás. A casa era pequena, mas aconchegante, com um grande jardim e bem ensolarada.
Quando eu colocava as tigelas de comida no quintal, os gatos apareciam de toda parte, ronronando.
As criaturas fofas e peludas se juntavam e mastigavam a ração com muito gosto. Pardais empoleirados nos galhos da árvore de caqui no canto do quintal cantavam docemente.
A vida na ilha se resumia a gastar dinheiro com comida e ração para gatos no pequeno mercado da ilha. Vim para Hwangdo, uma ilha da qual eu nunca havia ouvido falar, mas me apaixonei pelas fotos de um viajante ao ouvir sobre a caminhada em um penhasco na costa da ilha.
Era uma vida à deriva na qual, não importava para onde você fosse, bastava voar para onde quisesse e para onde seus pés o levassem. Foi aqui que me estabeleci após voar de Busan para evitar Baek Doha.
Havia tantos gatos que era melhor chamá-la de Ilha dos Gatos do que de Hwangdo. Os primeiros a me receber quando cheguei de barco foram os gatos na rua no cais.
Fiquei parado em frente a eles por um tempo, aproveitando o sol quente da primavera. A primavera havia finalmente chegado depois de um inverno de frio e tremores com a brisa do mar.
Estou nessa pequena ilha há quatro meses.
Desde que me estabeleci na ilha, tenho vivido sob o nome de Min Woohyun. Comprei o nome fictício e o número de seguro social de um ômega masculino. Não havia nada que não pudesse fazer com dinheiro.
Era um disfarce frágil, mas eu usava óculos e mudei a cor do meu cabelo para castanho-claro. Só isso já fez uma grande diferença.
Nos quatro meses em que vivi como Min Woohyun, eu estava vivendo uma nova vida, diferente da que tinha antes.
Eu estava preso em uma ilha, sem celular, sem telefone, sem TV, apenas alimentando os gatos, cozinhando refeições, andando e conversando com os moradores.
A vida de Min Woohyun era tranquila. Yoo Hyunseo, o presidente Yoo, nem minha mãe existiam. Min Woohyun, morador da Ilha Hwangdo, estava sozinho. Não, eu não estava sozinho porque tinha o Unmyeong (destino) ao meu lado.
Os dias passavam tranquilamente sem altos e baixos. Pela primeira vez na vida, eu me senti como se estivesse em um longo feriado.
— Woohyun, você está aí?
O portão se abriu e uma mulher idosa em um casaco azul entrou. A idosa entrou mancando, com uma bacia na cabeça e um saco plástico preto na mão.
— Haa, essas crianças. Olha só como eles se contorcem. Tão gordinhos!
A idosa sorriu para o grupo de gatos que rapidamente mastigava a ração. Eu me aproximei e peguei a bacia dela.
— O que você está carregando? Está pesado.
— Ontem foi dia de festival do lado de fora da minha casa.
Eu me sentei em uma cadeira no jardim e abri o pano que cobria a bacia. Ela estava cheia de todos os tipos de comida: peixe grelhado, almôndegas, bolos de arroz e muito mais. Eu estava com fome, então peguei um pedaço de carne e o coloquei na boca. Foi a primeira coisa que comi quando acordei de manhã e acabei me engasgando.
A mulher sentou-se em um banco próximo à mesa e colocou em cima da mesa uma garrafa de plástico que estava no saco plástico preto.
— Se você não se alimentar bem e beber bastante líquidos, vai acabar se sentindo mal.
Rapidamente peguei a garrafa e engoli o líquido. Era uma *sikhye com abóbora doce e fresca.
N/T – Sikhye é uma bebida doce tradicional coreana feita de arroz e normalmente servida como sobremesa. Além de seus ingredientes líquidos, sikhye contém grãos de arroz cozido e, em alguns casos, pinhões.
— Uau. Isso é delicioso.
— Coma bastante. É preciso comer muito quando se está grávido.
Eu estufei as bochechas e sorri. Comi panquecas e bebi o sikhye de arroz para encher o estômago. A mulher idosa observava, sorrindo, como se estivesse vendo seu próprio filho comer.
Quando cheguei à ilha pela primeira vez, me senti estranho com o comportamento excessivamente amigável dos moradores, mas agora estou acostumado.
— Eu estava assistindo ao noticiário ontem, e aquele alfa real está virando o país de cabeça para baixo. Ele é muito barulhento.
— O que está acontecendo? Não tenho TV em casa.
— O que ele disse? Oh, Deus. Não consigo me lembrar. De qualquer forma, o alfa real é um maluco.
— Todos os alfas reais são um bando de malucos.
Eu apenas ri. Não me importava. De qualquer forma, era assunto de outra pessoa na terra do outro lado do mar.
Não havia nada ameaçador nessa ilha pacífica. Meus únicos inimigos eram os javalis e outros animais selvagens que vinham até as casas ocasionalmente. Além disso, os habitantes da ilha eram todos betas comuns.
Não havia alfas, nem ômegas, nem alfas reais. Sem um alfa, não havia hierarquia, nem posição, e todos eram iguais.
Eu fui o primeiro ômega da ilha: um ômega masculino grávido.
Mas os moradores não tinham nenhum preconceito e me acolheram sob suas asas. Nos quatro meses em que vivi aqui, recebi o tipo de amor fraternal que nunca havia recebido em minha vida.
— Você vai ao posto de saúde hoje?
Assenti com a cabeça, muito ocupado, engolindo minha comida. Não há hospitais ou postos de saúde na ilha, por isso era necessário viajar de barco até o continente.
— Li que os ômegas masculinos ou algo do gênero precisam ser operados para quando vão dar à luz. Já fiz uma cirurgia antes e precisei ter um acompanhante. Você tem um acompanhante?
— Não. Estou por minha conta.
— O bastardo que plantou a semente em você não apareceu de onde quer que esteja, não é? Você é muito corajoso por está fazendo isso sozinho.
Tenho certeza de que Baek Doha está com os olhos arregalados, sem dormir cheio de ansiedade, abade de remédios, viajando pelo país a minha procura, e eu estou aqui sorrindo.
— Não se preocupe com o parto e os cuidados pós-parto. Nós nos revezaremos para fazer tudo. Se você quiser, posso ser sua acompanhante. Woohyun, não se preocupe com nada. Cuide de você, sim?
— Obrigado. Desculpe… estou acostumado a não ser amado e a ser ignorado, por isso não pensei nisso… mas é bom ser notado e amado assim.
Vivendo aqui, eu me tornei uma criança porque os mais velhos me dão muito amor e atenção.
— Tsk, tsk, tsk. — A vovó estalou a língua com um ar de tristeza, deu um tapinha nas minhas costas e acariciou meu cabelo.
O calor da brisa, o toque da mulher ao me acariciar e o calor de Haenim que pulou em cima de mim e se esfregou no meu rosto, fez meu coração aquecer.
O mundo era sempre frio e cinza. As cores e as temperaturas do mundo não faziam sentido para mim em uma vida anterior. Para mim, era natural ser julgado como mutante e aguentar isso de cabeça baixa sem resistir.
Foi Baek Doha que me fez perceber que o mundo era aromático. Aquele homem era quente, tão quente quanto o sol escaldante durante o verão.
Quando a temperatura do meu olhar mudou graças a Baek Doha, percebi que o mundo brilhava com cores diferentes a cada momento. O cheiro do mundo era sempre diferente. A temperatura do vento que tocava minhas bochechas era mais quente também.
O mundo era cinza para aquele homem antes dele me conhecer? Será que ele aprendeu o que era calor e percebeu a beleza de um mundo onde todas as luzes brilham? Será que ele percebeu que o ar frio e seco do inverno comigo se transformou em uma brisa suave com o perfume das flores?
Espero que sim… — pensei.
*
Depois do café da manhã com a comida do festival trazido pela mulher, me lavei, me vesti e fui ao cais para pegar o barco.
No caminho para o cais, vi as cerejeiras em plena floração. As folhas da flor de cerejeira tremulavam com a brisa e as pétalas que caíam pareciam neve branca.
— Olhe Unmyeong (destino), são flores de cerejeira.
Olhei para as flores que haviam caído no chão. Esfreguei a parte inferior da barriga com uma das mãos e sussurrei para mim mesmo. Depois de um tempo, meus enjoos matinais diminuíram e minha barriga ficou um pouco mais protuberante.
Era um menino. Toda vez que íamos ao posto de saúde para fazer exames, ele estava perfeitamente saudável. Apesar de meu útero mutante, instável e fraco, a criança estava crescendo muito bem. Surpreendentemente.
Gostaria de saber se as flores de cerejeira estão florescendo em Seul neste momento.
Talvez seja porque a estação mudou, mas tenho pensado muito em Baek Doha ultimamente.
Será que ele não conseguiu me encontrar por quatro meses? Ou será que ele desistiu de procurar? Sorri e balancei a cabeça. Claro que não, ele não pode desistir de mim. Era uma confiança bem fundamentada.
Eu podia ver o barco chegando do outro lado do mar.
***
— O feto está bem saudável.
O funcionário do posto de saúde que fazia o ultrassom abdominal sorriu, e eu ri junto quando conferi a imagem de um feto saudável e esvoaçante.
— Você está estável, então só precisa continuar se cuidando.
Eu lhe agradeci, saí da cama e me esforcei para me vestir.
— Oh, a propósito, Sr. Woohyun.
— O quê?
Olhei para ele enquanto vestia meu roupão, imaginando se havia algo errado.
— Você almoçou?
— Não. Pensando bem, já está quase na hora do almoço.
— Bem, gostaria de almoçar comigo? Tenho algo para te dizer.
Fiquei em silêncio por um momento, estudando o rosto do homem sentado em frente ao aparelho de ultrassom. Seu rosto era inocente. Era um rosto que eu sabia ser próximo ao meu em idade, mas que parecia ter 20 e poucos anos, recém-saído do exército. Ele não parecia ter segundas intenções. Seu nome era Kim Hyunwoo.
— Claro, claro.
— Então me espere no primeiro andar. Já estou indo.
O largo sorriso em seu rosto era extremamente inocente. Enquanto eu caminhava até o saguão do primeiro andar do posto de saúde para esperar, a TV estava ligada no noticiário.
Um alfa real havia entrado com uma ação judicial épica contra a sede do sistema de empareamento. Parecia ser o que a senhora idosa da casa do portão azul estava falando pela manhã. Era o primeiro caso na Coreia e o primeiro no mundo. A TV parecia ter organizado um furo de reportagem porque o sistema de empareamento era o protagonista.
Não posso acreditar que se trata de um processo contra o sistema de empareamento. E ainda mais movido por um alfa real, que geralmente são os que mais recebem os benefícios oferecidos pelo sistema. Não sei que tipo de maluco ele era, mas com certeza era um cara muito legal.
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Continua…
Tradução: Rize
Revisão: MiMi