No Jardim Das Rosas - Capítulo 07
Seja lá qual tenha sido o processo usado por Klopp, Arok agora carregava seu primeiro filho no ventre. Esse fato não era algo para se gabar, mas também pensou haver nada a esconder. Até porque, mesmo que ele fizesse o possível para “cuidar das aparências”, nenhum conhecido, familiar ou amigos os contactaria.
Além disso, a atitude do alfa mudou consideravelmente quando ele percebeu que seu ômega estava grávido. Ele não batia nele e o verificava uma vez por dia para se certificar de que estava tudo bem.
— Está um pouco atrasado, senhor.
— Sim, eu sei. Hoje em dia, é necessário cautela para não perder dinheiro em investimentos tolos.
Klopp disse, entregando a Marta seu casaco, chapéu e luvas. Arok estava sentado na sala, lendo um livro com uma manta no colo. Não havia nada para fazer, então ele decidiu que seria apropriado dar a si mesmo uma “educação pré-natal” para quando seu filho nascesse. Agora, ele estava lendo os escritos dos antigos filósofos e suas teorias sobre a mudança de corpos. Porém, quando mergulhou em um clássico que o obrigava a mastigar cada linha com atenção, o tempo passou rápido e sentiu-se tão à vontade que parou de pensar em qualquer outra coisa.
A princípio, ele tocava piano ou violino no salão principal, mas agora sua barriga estava tão grande que parecia incrivelmente difícil para ele sentar-se ereto. Suas pernas doíam o suficiente para não conseguir ficar de pé por longos períodos. Tinha uma música que queria ouvir, mas Klopp provavelmente não o deixaria sair e nem teve coragem de pedir que convidassem o artista apenas para isso, então suprimiu seus desejos.
— Como esta?
Arok, que largou o livro, estava prestes a abrir a boca quando Marta, que havia arrumado o casaco no cabideiro, foi a primeira a falar:
— Ele comeu e se exercitou corretamente. O menino está crescendo bem. Fora isso, ele fica sentado e lendo o dia todo.
— Hm. O menino vai ser muito esperto, então.
Arok olhou para os dois por um momento. Sua atenção estava totalmente voltada para a conversa dos dois, como se fosse fofoca na vizinhança. Então, voltou para o livro novamente.
Klopp, que passou a impressão de que iria embora logo, de repente sentou-se no sofá de frente a Arok e perguntou:
— O que está lendo?
— Uma novela…
— Como se chama?
— “Um tipo de pecado”.
Por que ele escolheu este livro hoje? E por que Klopp disse algo que normalmente não perguntaria? Arok não desviou o olhar nem uma vez, mas se surpreendeu ao ver seu companheiro soltar uma gargalhada.
— O que está escrito nesse livro? O que o protagonista faz para que isso seja considerado um pecado? Ele era um pervertido que cobiçava um alfa? Ele pagou um grupo de homens para estuprar o marido do outro e matá-lo, mesmo que a gravidez do ômega estivesse avançada?
— …
— Responda!
— Senhor…
Marta interrompeu.
As mãos de Arok seguraram o livro era tão forte que as pontas dos dedos ficaram brancas. Ele não disse absolutamente nada.
— Os pecados mencionados neste livro são mentais e metafísicos. Eles não têm nada a ver com a lei criminal atual. É lamentável. Como você só lê coisas estúpidas, deve ter pensado que poderia cometer pecados sem punição. Você não tem uma consciência porque você nunca aprendeu nada nesses contos de fadas. Não seria melhor ler “Justiça Humana” antes de ler essas idiotices? Talvez esse te ensine o básico sobre como ser um ser humano civilizado.
Com isso, Arok levantou os olhos e olhou para Klopp. Seu tom era sarcástico, mas sua expressão era séria. Arok suspirou e desviou o olhar.
— Obrigado pela recomendação.
Se levantou, dizendo que iria dormir primeiro. Klopp não o impediu.
Marta, que originalmente substituíra o mordomo, preparava a cama com uma expressão taciturna todas as noites. Ela era confidente de Klopp e estava prestes a assumir todos os afazeres na mansão, exceto os referentes aos aposentos.
— Você pode me trazer uma xícara de chá quente antes de eu ir para a cama?
— Chá não é bom para o bebê.
— A infelicidade de uma mãe não é boa para uma criança.
Nesse momento, Marta, que fazia a cama, olhou-o ferozmente. Ela se apressou e despiu Arok de suas roupas, deixando-o apenas com uma roupa de dormir composta por apenas uma peça: uma camisola branca. Era como uma mãe lidando com um filho mau. Suas mãos estavam duras e quentes e foi pior quando ele forçou Arok a ir para a cama. E enquanto ele estava deitado procurando um livro que ainda não havia lido, Marta bateu dolorosamente em Arok nas costas da mão.
— O que você está fazendo!?
— Dormir tarde demais é inaceitável. O sono é essencial para o bebê crescer bem.
Ele ficou ofendido com a linguagem dela, ríspida demais para alguém de posição inferior a dele, e que carregava o filho de seu mestre.
— Por mais que você seja a governanta de Klopp, você foi longe demais. Seu mestre está ciente de sua grosseria?
Ele não gostava muito quando dizia algo desagradável diretamente para os criados, mas achava que era inevitável, pois a mulher estava fora de controle. No entanto, ela cuspiu palavras duras sem se importar com o que ele disse:
— O filho de meu mestre não era pra vir de você. Portanto, não tente me convencer de que é digno de bom tratamento usando de desculpa essa… Gravidez mesquinha. Eu já tinha um bebê para esperar e um homem para atender antes… E não era você.
— …
Marta deve ter sido criada de Rafiel. Agora ele entendia por que essa ômega de meia-idade era tão ríspida e feroz. E após saber o que ele fez, ela poderia ser tão dura quanto quisesse com Arok pelo resto de sua vida.
Marta apagou a luz e saiu sem perguntar. Ele não conseguiu dormir muito e ficou deitado no quarto escuro até que o teto se iluminasse graças a luz do sol. Arok decidiu que iria administrá-la assim que o bebê nascesse.
— Tome.
Marta, que finalmente revelou seus verdadeiros sentimentos, intimidava Arok ocasionalmente. No começo, ele queria superar isso educadamente, mas as coisas pioraram desde então. Ela não gostava de ter que morar com ele, então obviamente o maltratava sempre que tinha a chance.
— Se você não terminar de comer, eu direi ao mestre.
— Não gosto de peixe. Leve para quem quiser comer.
— Coma para a criança, não para você. Existe a tradição familiar de alimentar quem vai dar à luz com peixes vinda do lado paterno. Rafiel ficou feliz com isso. Pessoas educadas são outro nível, não é mesmo?
No momento em que ouviu essas palavras, Arok ergueu a cabeça e olhou para Marta como se quisesse matá-la. Ele não conseguia nem ouvir as palavras por trás do vocabulário chocante e não tinha uma única frase para a responder sobre. Não importava que ele tivesse perdido tudo, mas ver um plebeu dizer tal coisa para um nobre, era imperdoável.
Arok não aguentou a crescente raiva e humilhação e falou em tom áspero, com a pele levemente corada:
— Vou mandar você embora quando meu filho nascer.
Diante disso, Marta bufou.
— Seu filho?
— Como mãe de uma criança que sucederá ao visconde no futuro, não posso mais tolerar sua atitude.
— Minha atitude… Então eu tenho que tolerar o infeliz que mandou matar uma pessoa igual a um porco e matou sua criança…
— Suficiente.
— Eles mataram a criança arrancando-a do estômago e pendurando-a pelo cordão umbilical!
— Já chega!!!
Arok não pôde deixar de gritar. Ele raramente ficava com raiva, mas… Isso era demais. Ele não aguentava mais passar por isso.
— Saia! Agora! Minhas orelhas estão apodrecendo com sua linguagem vulgar! Saia!
— Melhor assim. Eu não quero continuar respirando o mesmo ar que alguém que nem é humano.
Marta se retirou do cômodo, o amaldiçoando durante todo o trajeto. A mão de Arok, que agora segurava a maçaneta da cadeira, tremia em um estado de choque intenso que lhe dava vontade de vomitar.
E a partir do dia seguinte, o peixe foi adicionado a cada refeição que ela serviu.
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O primeiro parto foi terrível.
Arok, incapaz de se deitar em sua cama, era um verme preso a um mar de cobertores e agarrado a uma prancha de madeira podre. Ele enterrou o rosto nos travesseiros e começou a gritar com todas as suas forças.
— Isso… dói!!!
Arok estava tonto com a sensação de que sua parte inferior estava sendo arrancada e desejou que alguém retirasse o bebê à faca imediatamente.
O médico logo entrou.
Houve lágrimas fisiológicas, mas não o suficiente para parecer choro. Em vez disso, o suor frio, nariz escorrendo e saliva bagunçavam seu rosto pálido.
— O canal de parto ainda não está bem dilatado.
— Dói! Oh, dói! Dói, por favor! Por favor, faça isso parar! Por favor. Prefiro morrer!
Arok esqueceu sua aparência e se agarrou ao médico. Arregaçando as mangas e levantando a bainha úmida da roupa, o homem sorriu timidamente e disse:
— O que você está fazendo pedindo a morte assim? Faz parte do processo de nascimento da criança. Mais tarde, quando a pelve começar a se abrir corretamente, vai doer muito mais do que isso… Você deve ser forte.
— Eu não aguento…
— Precisa ter paciência. Como é a primeira vez, deve demorar bastante. Respire fundo. Inspirei e expirei. É isso, inspire de novo. Deve ser difícil por sua pélvis ser pequena.
A respiração profunda que o médico ordenou ajudou um pouco, mas logo a dor intensa veio e Arok agarrou a almofada e gritou até achar que sua garganta iria estourar. Ele não conseguia entender por que ele tinha que passar por essa dor. Ele era um alfa. Um maldito alfa. Por que ele teve de ser transformado em ômega e lutar contra a dor de ser partido ao meio?
Ele odiava e se ressentia desse homem, que agora estava tendo uma conversa séria com o médico e que o olhava do lado de fora da porta, sorrindo para ele como se achasse divertido assistir seu sofrimento.
Arok, encarando aquele olhar preocupado que se fazia de “mártir” diante do médico, mordeu o lábio com tanta força que seus dentes tremeram. Ele não queria derramar nenhuma lágrima ali, então, por um momento, pensou que isso seria o suficiente para aguentar tanto em tão pouco tempo. Ele não queria dar essa satisfação à outra pessoa, que agora derramava descargas sentimentais pela boca sobre algo que, no fundo, nem se importava.
— Aaaah! Ah, ah…
Arok, que esteve em trabalho de parto a manhã toda, finalmente deu à luz um menino ao pôr do sol. Ele estava exausto e não tinha forças para abrir os olhos, então abraçou a almofada e respirou fracamente até ouvir a voz de Klopp ecoando em seus ouvidos.
— Um menino ômega. Ele é loiro.
— Parabéns, Visconde.
— Marta, leve a criança para o quarto imediatamente.
— Ah, meu… Meu bebê.
— Você tem que dar um banho nele imediatamente.
— É lindo, senhor.
— Meu bebê?
Foi ele quem o teve em seu ventre por nove meses e abriu a pélvis para dar à luz. Ele tinha todo o direito de conhecê-lo.
No entanto, embora Arok gritasse, ninguém parecia ouvi-lo.
Um homem alto apareceu em sua visão embaçada.
— Como ele esta?
— Exausto. Ele perdeu muito sangue, mas não é perigoso para seu corpo. No entanto, a gravidez é muito difícil para ele devido ao tamanho de seu corpo, então eu recomendo usar alguma contracepção no futuro, se possível.
— Isso não é do seu interesse.
Pela resposta ríspida, o médico compreendeu a conversa como finalizada e não disse mais nada.
Logo outras pessoas entraram, carregando Arok que, por agora, apresentava uma aparência flácida e sem vida e o levaram para outro lugar. Ele não recordou nada a partir de então, provavelmente porque desmaiou no caminho. No entanto, quando abriu os olhos novamente e com um corpo fraco, que parecia estar prestes a quebrar, descobriu ter sido levado para um barraco em ruínas que ele nunca tinha visto antes. Ele não conseguia entender nada, então pensou que era um sonho, e então sentiu um medo terrível. Após desmaiar uma última vez, percebeu o início de uma realidade cruel. Sentiu que ali era o início da verdadeira vingança.
Inicialmente, não pôde acreditar. Como ele poderia confinar um ômega que deu à luz a seu próprio filho em um lugar tão sujo e desolado como esse? O lugar não era nada além de um quarto empoeirado com uma cama de madeira suja e sem luz.
Arok, ainda incapaz de andar direito, arrastou seu corpo dolorido para fora da cabana. A mansão era visível ao longe, então ele caminhava com uma das mãos em volta da barriga, que ainda estava inchada, e com a outra, apoiada em um galho de árvore ou qualquer coisa que pudesse agarrar. Ocasionalmente, algo quente escorria entre suas pernas, mas mesmo sem olhar, ele sabia que era sangue. Descalço, pisou em seixos pontiagudos e dolorosos como espinheiros rumo ao roseiral, e ao longe, pela janela iluminada, viu Marta segurando uma criança envolta em renda comprida. Ela estava extremamente feliz, como se fosse seu neto. Klopp, que sorria para o bebê recém-nascido ao seu lado, olhou para o lado. Seus olhos finalmente se encontraram. Sua excitação desapareceu e um sorriso frio vazou. Ele abriu a grande janela que servia como porta para o jardim e logo parou na frente de Arok.
— Você ainda consegue andar? Uau, você está pingando sangue.
— Dói… estou com muito frio e…
— Isso mesmo, é o que acontece quando você anda com roupas tão finas. Se estiver frio, volte e ligue o fogão. Se você se sentir mal, tome o analgésico que deixei.
Mesmo as pessoas que ele conheceu pela primeira vez não eram tão frias.
Incapaz de apoiar os joelhos trêmulos, ele agarrou o braço de manga de seda de Klopp, implorando para ser ouvido. Ele resmungou um pouco, mas em vez de se afastar, ele estendeu a mão e segurou o cotovelo de Arok antes que ele caísse.
— Por que me deixou ali? E o menino?
— Não se preocupe com o menino. E alí será a sua casa agora. Se você não gostar, pode ir embora.
Ele não conseguia entender o que estava ouvindo. Ele não queria acreditar. Arok apertou sua camisa.
— Eu te dei ele…
— Você me devolveu uma das coisas que tirou de mim. Mesmo assim, meu primeiro bebê está morto.
— Você disse querer seu marido e filho de volta.
Os olhos castanhos escuros de Klopp olharam para Arok.
— E daí? Ha… Agora que você deu à luz a meu filho, está dizendo que vai ser meu marido?
Arok não sabia como reagir. Não que quisesse ser o substituto de Rafiel… Ele simplesmente pensou que, como mãe que deu luz a um filho, ele tinha a responsabilidade e autoridade de cuidar da criança.
— Eu vou cuidar do menino, então não se preocupe. Pelo menos, não vou criá-lo como um vilão que descaradamente exibe uma cara gentil mesmo após cometer um assassinato.
— Mas…
— Já disse que, se não gostar, pode ir embora. Mas se você ficar, espero que não volte a ficar rondando a mansão com essa cara lamentável. Você não disse que os aristocratas perdem o prestígio se tiverem contato com conhecidos inúteis? Bem, você vai ter que corresponder às minhas expectativas. Vou preparar o peixe e mandá-lo para você não machucar os dedos.
Olhando para o homem cruel que escolheu as palavras mais ofensivas possíveis, sem qualquer consideração por sua pessoa, Arok sentiu o mundo mergulhar em completa escuridão.
E tudo entrou em parafuso.
Foi vingança? Você estava procurando uma oportunidade para isso? Vagar para sempre nesta escuridão, como um abismo…?
Ele havia perdido propriedades, família, pessoas e, agora, o filho. Tudo o que restava era seu ego e ele sabia disso. É o que Klopp estava tentando tirar dele agora.
Deitado na cama dura da cabana, Arok decidiu acabar com tudo sozinho. Ele não comeu nada e também não bebeu nada. Não tinha vontade e nem inclinação para fazê-lo. Ninguém visitou a cabana, então ele pensou que seria uma morte fácil e solitária.
O corpo que teve um filho murchou rapidamente um ou dois dias depois. Ele não sabia quanto tempo havia se passado, mas podia sentir sua respiração ficando mais fraca e seus batimentos cardíacos diminuindo cada vez mais. Além da visão, que havia renunciado, o ouvido que trabalhava por conta própria foi, aos poucos, perdendo a força, abraçando o silêncio total.
Desaparecer assim parecia o final mais razoável.
E quando sua vida secava e cada grama de sua energia evaporou, Arok sentiu seu corpo sair da cama e ir para outro lugar. No testemunho de um padre, num livro chamado “No Paraíso”, que leu há algum tempo, dizia-se que a morte era como uma leve brisa. Segundo a obra, as pessoas se transformavam em bolhas e flutuavam até chegarem ao destino determinado: o céu brilhante ou a terra. E, se ele estava flutuando agora, então para onde ele estava viajando e por que estava tão quente? O homem pelo menos esperava que a morte fosse aconchegante.
Em seu campo de visão turvo, ele viu um deus da morte carregando sua alma imunda nos braços. Cabelos castanhos escuros e um rosto forte. Olhos inabaláveis que o encaravam de volta e uma boca reta. Alguns diziam que o deus da morte era um deus aterrorizante, mas para Arok, ele pareceu um deus muito gentil. Arok passou o braço dormente em volta do pescoço do outro e enterrou o nariz no ombro forte enquanto inspirava.
— Klopp… Sempre pensei em você como meu alfa. Foi muito difícil e doloroso, mas fiquei feliz em ser seu ômega… O final não foi bom, mas não posso evitar… é o preço que paguei com minha estupidez.
No entanto, a voz que voltou para ele apenas disse:
— Você não pode morrer. Porque seus pecados não são leves o suficiente para você descansar fácil assim.
A voz do deus da morte era fria o suficiente para congelar o ar. No entanto, seu coração já havia congelado antes.
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Continua…
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Tradução: MiMi
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