Deseje-me se puder - Capítulo 97

— Ah, Dane.

De repente, alguém falou, e Grayson virou a cabeça. Dane estava parado na entrada do vestiário, olhando para ele. Quando Grayson se virou, o olhar de Dane também se moveu. Percebendo que o olhar do homem seguiu suas costas e depois se perdeu, Grayson abriu um sorriso e acenou.

— Oi, Da–

—Temos que conversar.

Dane interrompeu antes mesmo que Grayson terminasse a frase, virou-se de repente e saiu andando com passos rápidos. Grayson inclinou a cabeça, intrigado, depois deu de ombros e vestiu a camisa de qualquer jeito. Assobiando, seguiu saltitante atrás dele.

***

— O que aconteceu? O que é isso aí?

Assim que ficaram a sós nos fundos do prédio, Dane foi direto ao ponto. Grayson coçou a nuca antes de responder:

— Quase fui assaltado ontem…

— Onde exatamente foi esse assalto?

Dane o cortou de novo. Com a mão ainda na cabeça, Grayson o olhou de cima. O que era aquilo? Preocupação? Irritação? Por que ele estava reagindo assim?

‘Quando for difícil entender a situação, mude de assunto.’

Desde pequeno, essa era uma regra básica para Grayson. E ele fez exatamente isso:

— E a Darling? Está bem?

Seguindo os ensinamentos da infância, Grayson tentou mudar de assunto. Ele trouxe à tona o tema mais fácil que Dane poderia aceitar. E o nome da gatinha foi a primeira coisa que lhe veio à mente – um desvio estratégico. Mas, em vez de distraí-lo, só serviu para deixá-lo ainda mais irritado. Dane franziu o cenho, claramente de mau humor.

— Responda a pergunta. Onde você encontrou o assaltante?

O tom dele não deixava espaço para fuga. Grayson ficou em silêncio. Dane não esperou. Soltou um suspiro impaciente e decretou por conta própria:

— Foi no estacionamento do motel, certo?

Grayson não respondeu. Ele apenas piscou os olhos e olhou para Dane. Vendo que Grayson estava claramente tentando entender a intenção por trás da pergunta, ele suspirou profundamente,  abaixou a cabeça e disse.

— Eu já disse que você não precisa me acompanhar toda vez. Eu não sou uma donzela indefesa.

O tom irritado pegou Grayson de surpresa.

Era a primeira vez que alguém reagia assim. Normalmente, quando ele inventava alguma história sobre acidentes, as pessoas ficavam preocupadas, tentavam cuidar dele. Mas Dane? Ele parecia mais zangado do que qualquer outra coisa.

‘Por quê?’

Grayson refletiu por um momento e logo chegou a uma conclusão que fazia sentido: Dane se sentia responsável. O típico senso de dever dele devia estar gritando que tudo isso era culpa sua e, como sempre, culpa gerava algum tipo de frustração.

— Eu estou bem.

— Eu não estou.

Dane respondeu imediatamente, com o rosto franzido. Ele pareceu mergulhar em pensamentos por um momento e então murmurou, como se estivesse falando sozinho:

— Agora você não tem mais motivos para ir lá…

— Eu? Não tenho motivo? Como assim?

De repente, Grayson pegou a deixa e perguntou. Dane, que estava massageando a testa, parou e olhou para ele. Dessa vez, foi Dane quem pareceu não entender, com uma expressão confusa.

—Eu disse que, enquanto estivermos namorando, não vou mais ao clube e não vou me encontrar com mais ninguém. Então, agora não tem mais motivo para você aparecer no motel.

— Eu vou mesmo assim.

Dane parou por um segundo, surpreso com a resposta descarada, e Grayson, com um sorriso brilhante, acrescentou:

— Não posso deixar você sozinho em um lugar tão perigoso. Vou te acompanhar todo dia quando você sair do trabalho.

— Eu disse que não preciso de escolta, você não ouviu?

Agora a irritação estava evidente na voz de Dane. Ele não estava acostumado com esse tipo de insistência, as pessoas diziam que aquilo era um relacionamento, mas, para ele, só parecia um incômodo. Por isso, nunca tinha se envolvido profundamente com ninguém até agora.

— Mesmo assim, eu quero te levar.

A teimosia de Grayson foi a gota d’água.

— Então é isso? Você quer me vigiar para ter certeza de que eu não estou dormindo com mais ninguém?

O tom ríspido foi acompanhado por um olhar cortante, mas Grayson balançou a cabeça sem hesitar.

— Não é isso, eu sei que você é uma pessoa que cumpre suas promessas.

— Então por quê?

Dane estava pronto para mostrar a Grayson, com os punhos, que ele estava errado em pensar que precisava protegê-lo. Enquanto esperava por uma resposta, Grayson, que estava coçando a bochecha, surpreendeu-o com uma reação inesperada. Evitando o olhar de Dane e parecendo um pouco constrangido, ele finalmente falou:

— Eu só… quero passar mais tempo com você.

A declaração inesperada fez Dane hesitar.

Era mentira? Mais uma das falácias de Grayson? Ele o observou com desconfiança, tentando decifrá-lo, mas o outro só piscou de volta, sem desviar o olhar. O silêncio ficou incômodo. Dane não sabia o que dizer, aquilo era novidade.

— …Por quê?

Ele finalmente soltou, com a testa franzida. Grayson inclinou a cabeça e sorriu de canto.

— Porque eu me sinto feliz quando estou com você.

A resposta saiu incerta, a entonação subindo no final, como se nem ele tivesse total certeza. Dane continuou olhando para ele, cético. Grayson hesitou por um instante e depois tentou explicar:

— Tipo… meu coração dispara, meus pés ficam inquietos, meus dedos formigam, e eu sinto vontade de ser gentil com todo mundo.

Grayson listou as sensações que sentia e sorriu brilhantemente.

— Isso não é felicidade?

…ah.

Dane piscou, atordoado. Pela primeira vez, o sorriso de Grayson não parecia forçado. Sempre o achou artificial, como se ele interpretasse um papel. Mas agora…

Ele realmente parecia feliz.

Isso era possível?

Ele ainda queria acreditar que Grayson era incapaz de sentir algo de verdade. Mas, naquele momento, não conseguia mais ter certeza.

— …Parece que sim.

Talvez.

Na verdade, ele mesmo não sabia o que era felicidade, então como poderia afirmar com certeza?

‘Acho que, definitivamente, eu não seria um bom professor.’

Dane pensou com amargura. De repente, uma dor de cabeça surgiu. De qualquer forma, a culpa pelo ferimento de Grayson era dele. Ele tinha dito várias vezes para o alfa não segui-lo, então, tecnicamente, não era responsável. Mas ele não podia ignorar o peso na consciência.

De qualquer forma, mesmo que dissesse para Grayson sumir, aquele desgraçado iria continuar grudado nele.

Agora, a única maneira de se livrar do homem era esperar os três meses passarem. E faltam mais ou menos dois meses e meio.

Nesse caso… talvez fosse melhor simplesmente…

Dane soltou um suspiro longo e pesado. Desde que trombou com Grayson Miller, percebeu que andava suspirando o tempo todo. E, por mais que soubesse disso, não conseguia evitar. Inspirou fundo mais uma vez e, por fim, declarou:

— Está bem. Vamos morar juntos.

O som que saiu dos lábios Grayson foi um engasgo misturado com um suspiro de pura incredulidade. Antes que ele começasse a soltar um discurso empolgado, Dane acrescentou friamente, como se quisesse cortar qualquer empolgação:

— Eu vou morar na sua casa. Mas só pelo tempo que falta. Quando esses três meses acabarem, é fim de jogo.

— Tudo bem.

— E não fique me seguindo por aí.

— Claro, sem problemas.

Grayson respondeu sem hesitar, como se estivesse assinando um contrato sem ler as letras miúdas. Mas Dane não era idiota. Pelo jeito que esse cara grudava feito chiclete mascado nele, dava mesmo para confiar nessas promessas? Ele tinha lá suas dúvidas, mas, por enquanto, não tinha escolha a não ser fingir que sim.

Ele estava prestes a se virar e entrar, mas parou ao ter um pensamento repentino e olhou para trás.

— Aliás, fala a verdade. Como você sempre consegue me achar?

Grayson, com seu sorriso radiante, respondeu na mesma hora:

— Coloquei um rastreador no seu carro.

— …aaaah

Dane soltou um suspiro de pura exaustão. Nem era surpresa, para falar a verdade. Apenas balançou a cabeça e voltou a andar, enquanto Grayson o seguia com passos animados, como se tivesse acabado de ganhar na loteria.

Ele não teria ido tão longe a ponto de se machucar de propósito… teria?

A ideia surgiu do nada e Dane tratou de chutá-la para longe o mais rápido possível. Não. Não, ele não faria isso. No momento ele precisava acreditar nisso.

E foi naquela mesma noite, já bem tarde, que Dane e Darling finalmente cruzaram os portões da mansão de Grayson.

°

°

Continua…