Deseje-me se puder - Capítulo 77
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— Me convide para sua casa.
Ao ouvir essas palavras inesperadas, Dane, que estava prestes a tirar a camisa, parou o movimento e olhou para Grayson. Ele ficou em silêncio, encarando-o fixamente, até que Grayson falou novamente.
— Tenho algo para te dar. Ou melhor, para Darling.
— Algo para Darling?
Dane voltou a se mexer, tirando a camisa devagar antes de jogá-la na bolsa e pegar outra. O fato de que, mesmo assim, Dane mantinha os olhos fixos nele trouxe a Grayson um certo prazer. Encostado no armário, ele inclinou a cabeça, mas logo percebeu que era muito mais alto do que o móvel e voltou à postura normal.
— Isso mesmo. Então, preciso ir até a sua casa.
Dane, ainda sem tirar os olhos dele, puxou a camisa nova sobre os ombros. Grayson, por um momento, se pegou hipnotizado ao ver os músculos do peito desaparecendo sob o tecido. Mas logo desviou o olhar de volta para o rosto dele.
— E o que é?
A curiosidade veio, como esperado. Grayson manteve a expressão tranquila e respondeu sem pressa:
— Um arranhador.
— Arranhador?
Dane franziu o cenho, repetindo a palavra como se ela soasse estranha. Grayson, sem se preocupar em explicar com palavras, pegou o celular e mostrou a foto do que havia comprado.
O silêncio de Dane enquanto analisava a imagem já dizia tudo.
— Isso é grande demais. Não cabe na minha casa.
— Dá para reduzir o tamanho.
Grayson rebateu no mesmo instante, apontando para algumas partes do arranhador na foto.
— Se não montarmos essa parte, já diminui bastante. Aqui também dá para tirar. E se a altura for o problema, podemos deixar só até essa parte.
Com cada toque do dedo, ele ia ajustando mentalmente a estrutura. Dane permaneceu calado, mas internamente estava calculando tudo.
Ele conhecia aquele modelo. Aliás, aquele era o arranhador que ele vinha namorando há meses. Precisaria juntar dinheiro por um bom tempo para comprá-lo, e agora esse desgraçado simplesmente apareceu oferecendo como presente.
Que ódio.
A irritação subiu, mas Dane era um cara prático. O dinheiro que estava economizando poderia ser usado em outra coisa para dar a Darling. No fim, não era uma proposta ruim.
— E o que você quer em troca?
— Hã?
Dane perguntou casualmente, e foi a vez de Grayson travar por um segundo.
— Quer os meus peitos, é isso?
Sem hesitar, Dane começou a puxar a camisa de volta, como se fosse tirá-la. Grayson abriu a boca para falar algo, mas no final só suspirou. Dessa vez foi Dane quem parou, confuso.
Grayson então falou como se estivesse repreendendo um aluno:
— Você precisa parar de tentar resolver tudo com os seus peitos.
— O quê?
Dane não acreditou no que estava ouvindo. ‘Esse fetichista doentio está mesmo dizendo isso?’
Enquanto Dane olhava para ele incrédulo, Grayson continuou calmamente.
— Eu já disse. Só quero que me convide para sua casa. — E, antes que Dane pudesse abrir a boca para responder, ele acrescentou: — Eu quero ver a Darling.
Dane olhou para ele sem dizer uma palavra, mas sua expressão dizia tudo: “Que tipo de bobagem você está falando?” Mas, claro, Grayson continuou.
— Você mesmo disse que gatos não devem ser tirados de casa, não foi? E ela acabou de sair do hospital, então faz ainda menos sentido levá-la para fora. Sendo assim, a única opção é eu ir até a sua casa.
Ele ainda deu de ombros, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. Dane ficou em silêncio por um momento, analisando. O desgraçado não tinha deixado nenhuma brecha, a desculpa era perfeita, como se tivesse ensaiado.
Claro… porque ele provavelmente ensaiou.
Ainda desconfiado, Dane perguntou de novo:
— E por que você está tão desesperado para ver a Darling?
Era exatamente a pergunta que Grayson estava esperando. Com um sorriso satisfeito, ele abriu os braços e disse:
— Porque eu sou um ‘fã’ da Darling.
Dane demorou um segundo para reagir.
— …O quê?
Com a cara toda franzida, ele olhou Grayson, que apenas sustentou o sorriso.
***
A casa de Dane ficava num bairro residencial tranquilo, na última curva de uma rua sem saída. Era uma casinha pequena, discreta, diferente do que Grayson imaginava. Ele estacionou o carro em frente, pegou a sacola que estava no banco de trás – naturalmente, providenciada pelo secretário – e saiu.
A chegada do carro esportivo, claramente deslocado naquela área, chamou atenção. Um garoto, que brincava com uma bola na casa ao lado, parou e olhou para ele, de olhos arregalados. Grayson lançou um sorriso breve antes de seguir para a porta.
Ding dong.
O som suave e delicado da campainha ecoou no ar, soando quase como se estivesse batendo diretamente no coração de Grayson. Do outro lado da porta, ouviu-se um leve movimento, um sinal de vida dentro da casa. Segundos depois, a porta se abriu. Como esperado, Dane estava parado ali, olhando pra ele.
— Oi. Obrigado por me receber.
Grayson sorriu e entregou a sacola.
…Não que Dane tivesse, de fato, convidado. Mas ele também não se deu ao trabalho de corrigir. Apenas pegou a sacola e se virou, deixando Grayson entrar.
Grayson reparou que ele estava descalço e, sem cerimônia, tirou os sapatos na entrada, calçando os chinelos extras que estavam ali.
O interior da casa era inesperadamente aconchegante. Os tons claros e a iluminação natural davam uma sensação de calma. Era fácil imaginar alguém sentado no sofá, com uma xícara de chá e um gato no colo, enquanto o sol entrava pela janela.
Ele fez um rápido mapeamento do lugar: passando a despensa à esquerda da sala, uma escada levava ao segundo andar. Mais adiante, havia um segundo cômodo que se conectava à garagem. Se descesse três degraus na outra direção, chegaria à cozinha que estava conectada à sala de jantar.
Levou menos de um minuto para Grayson entender o layout da casa. Poucos passos e ele já tinha visto praticamente tudo.
Dane, por outro lado, já estava na cozinha, esvaziando a sacola na mesa. Quando viu que a sacola estava cheia de sachês e latas de comida para gatos – e não qualquer comida, mas os petiscos mais caros do mercado — ele percebeu que tinha feito a escolha certa ao deixar Grayson entrar.
Era um estoque das melhores rações e petiscos para gatos, os tipos mais caros, aqueles que ele mesmo não podia comprar com frequência.
‘Isso aqui dá para alimentar a Darling por um ano inteiro.’
Satisfeito, ele começou a guardar as coisas no armário onde deixava os petiscos da gata. Mas, ao levantar a cabeça, viu Grayson do outro lado da sala, simplesmente parado, olhando ao redor.
Sem nem perceber, sua testa se franziu.
‘…O que você está fazendo?’
Como se tivesse captado os pensamentos de Dane, Grayson virou-se para ele. Quando seus olhares se cruzaram, Dane desviou sutilmente os olhos para o lado. Grayson o acompanhou, seguindo sua linha de visão até encontrar o imponente arranhador no canto da sala.
— Darling está lá em cima, no topo.
— Ah…
Por um momento, ele se esqueceu do próprio pretexto para estar ali. Rapidamente recompôs sua expressão, assumindo um semblante afetuoso antes de se aproximar da gata. No nível mais alto do arranhador, Darling repousava de olhos fechados, deitada de maneira preguiçosa. Não parecia estar dormindo, já que a cauda, caída para fora da plataforma, balançava suavemente para os lados. Grayson a observou em silêncio.
Continua feia.
Cada vez que olhava para aquela gata, mais difícil era entender o fascínio de Dane. Como podia tratar aquele bicho como um tesouro? E, além de tudo, era cega e surda. Como diabos interagiam? Sempre ouviu dizer que, com o tempo, os animais criavam laços com seus donos, mas… era possível criar esse tipo de conexão mesmo com tantas limitações?
Movido por uma curiosidade genuína, ele inclinou-se levemente para analisar Darling mais de perto. Foi então que, sem aviso, a gata se encolheu. Seu nariz tremia, farejando o ar com inquietação. Até mesmo Grayson, que não sabia quase nada sobre gatos, percebeu que algo estava errado.
— Neutralize seus feromônios.
Grayson piscou, surpreso com a voz baixa de Dane ao seu lado. Sem dar mais explicações, Dane se inclinou e pegou Darling nos braços, murmurando algo baixinho enquanto roçava o rosto contra a pelagem dela. Ele até estalou a língua de leve, como se tentasse acalmá-la.
‘Ela nem pode ouvir isso’, Grayson pensou, mas Dane parecia pouco se importar.
E então…
Ahhh.
Grayson reconheceu o cheiro no ar. Uma fragrância sutil, mas inconfundível.
Dane estava liberando feromônios para acalmar a gata. Os feromônios de um ômega dominante tinham efeitos bastante específicos: quando bem controlados, podiam não apenas acalmar e inibir reações agressivas, mas até gerar uma sensação de segurança e conforto.
A questão era… Será que isso funcionava em animais também? Ou Darling simplesmente já estava acostumada com o cheiro de Dane?
Ele não sabia dizer. Mas, fosse qual fosse o motivo, a gata relaxou, soltando um leve ronronar de satisfação.
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Continua…