Deseje-me se puder - Capítulo 74
***
BOOOM!
Outra explosão estrondou pelo ar.
Dane olhou ansioso na direção da fumaça que subia. Parecia que estavam detonando explosivos dentro do prédio, já que a segunda onda de fumaça vinha do mesmo lugar. Pessoas que trabalhavam lá, não muito longe da rua onde a multidão se reunia, corriam para fora, cobrindo o rosto com lenços e casacos.
Sem perder tempo, ele pegou o telefone e ligou para os bombeiros.
— Tem explosivos aqui, precisamos de ajuda imediatamente. O endereço é…
Depois de informar a localização, pediu que chamassem a equipe antibombas para o caso de haver mais explosivos espalhados, em seguida, desligou o telefone. Dane estava prestes a correr para dentro do prédio quando, de repente parou.
Alguém agarrou seu braço com força.
Pegando-o de surpresa, o puxão foi tão bruto que ele quase perdeu o equilíbrio. Dane se virou, já irritado, mas sua expressão logo ficou sombria.
Grayson Miller o encarava, pálido, respirando pesadamente.
— Que merda você está fazendo? Ficou maluco de vez?
Dane estreitou os olhos. ‘Por que caralhos esse cara está surtando?’
— Me solta.
Tentou se livrar do aperto, mas Grayson não cedeu nem um centímetro. Depois de algumas tentativas frustradas, a paciência de Dane se esgotou.
— Porra, me larga. O que você quer?
— O que eu quero? O que você quer, caralho?!
Grayson gritou, e o som ecoou como um tapa no ouvido. Dane travou por um instante, encarando-o incrédulo. ‘Esse desgraçado tá gritando comigo?’ Ele estava prestes a retrucar quando Grayson continuou, cuspindo as palavras em um fôlego só:
— Tem uma porra de bomba lá dentro! Você tem ideia do que pode acontecer se entrar agora?!
Seu rosto estava branco como papel, como se ele realmente acreditasse que Dane poderia ser despedaçado por uma explosão a qualquer momento.
Dane suspirou e respondeu, calmo:
— Alguém tem que fazer isso.
— E por que tem que ser você?! A equipe antibombas já foi chamada! É só esperar—
— Eu tenho que fazer isso.
Dane interrompeu Grayson, que estava falando sem parar.
Por um momento, Grayson hesitou.
— …O quê?
O silêncio pairou por um instante antes de Dane explicar, sem rodeios:
— Eu já desarmei explosivos antes, no exército. Fiz isso várias vezes. Então me solta, esse é o meu trabalho.
Dessa vez, ele tentou puxar o braço com mais força, mas Grayson segurou ainda mais firme, a ponto de os dedos cravarem na sua pele. A dor fez Dane cerrar os dentes.
Grayson hesitou, mas não afrouxou a pegada.
— Por que você tem que fazer isso?
O tom de Grayson era quase desesperado. E, sinceramente? Ele tinha razão. Quem, em sã consciência, entraria num prédio pegando fogo com explosivos prontos para ir pelos ares?
— Por que tem que ser você? Você pode morrer lá dentro!
Ele repetiu, mas Dane nem piscou. Só ficou olhando, com aquela expressão neutra que só o deixava ainda mais irritado. Grayson sentiu sua própria voz fraquejar quando perguntou, num tom mais baixo:
— Você não tem medo de morrer?
Sua voz soou hesitante. Quase baixa.
Dane finalmente respondeu, sereno:
— Tenho.
Grayson franziu a testa.
— Então por quê–?!
Grayson estava prestes a abrir a boca para soltar mais um esporro quando soltou um suspiro pesado e cobriu o rosto com a mão livre. Ele não fazia ideia do que estava acontecendo.O caos na própria cabeça era tanto que ele nem percebeu de imediato que Dane ainda o observava em silêncio.
Então, ele falou:
— Você tem muitos irmãos, certo?
Grayson franziu o cenho.
— …somos seis.
Respondeu meio sem vontade, sem entender onde Dane queria chegar com aquilo. Ele tentou adivinhar o significado por trás da pergunta quando notou algo estranho no rosto dele. Dane sempre parecia indiferente a tudo, mas naquele instante… ele estava sorrindo.
Era um sorriso leve, quase imperceptível, mas ainda assim, um sorriso. Grayson ficou tão surpreso que congelou no lugar. E então, Dane sussurrou:
— Pessoas como você não podem morrer.
— …O quê?
— Por isso eu vou.
Grayson não conseguiu nem piscar. Seu corpo inteiro endureceu como se alguém tivesse puxado o plugue do cérebro dele. Foi nesse exato momento que Dane finalmente soltou seu braço.
Dessa vez, a mão de Grayson não resistiu. Ele simplesmente ficou ali, paralisado, assistindo enquanto Dane dava um pequeno sorriso satisfeito – um sorriso tão tranquilo que parecia pertencer a outra pessoa.
Antes que Grayson pudesse reagir, Dane completou, casualmente:
— Eu sou sozinho. Então está tudo bem.
— Dane…
Grayson tentou chamá-lo, mas ele já havia se virado. Em questão de segundos, sua silhueta desapareceu no meio da fumaça e das chamas, e Grayson ficou ali, impotente, sem conseguir fazer nada para impedi-lo.
Explosões continuavam a ecoar. Era impossível distinguir quais sons eram de bombas explodindo e quais eram de edifícios desmoronando. Ouvindo os gritos das pessoas misturados com os sons assustadores, Grayson simplesmente ficou parado, sem reação.
***
O que foi que acabou de acontecer?
Ele tentou processar. Tentou colocar os pensamentos no lugar. Mas sua mente estava uma bagunça, incapaz de organizar qualquer coisa de forma coerente.
O céu, obscurecido pela fumaça, tornava até mesmo a passagem do tempo incerta. Ele não sabia há quanto tempo estava ali, parado. Só sabia que ainda estava olhando. Olhando os bombeiros correndo de um lado para o outro. Olhando as pessoas gritando e se afastando.
…E Dane, que ainda não voltava.
Como alguém podia fazer isso?
Grayson repassou tudo na cabeça, de novo e de novo, mas não conseguia entender. Dane entrou naquele inferno sabendo que podia morrer. E ele nem estava de serviço. Não era um soldado em missão, nem um policial seguindo ordens. Ele não era obrigado a nada. Não ia ganhar reconhecimento, dinheiro, nem sequer um “obrigado” de quem quer que estivesse lá dentro.
Então por quê?
A única outra vez que Grayson viu algo assim foi com Joshua Bailey. Joshua arriscou a vida por Chase, o irmão de Grayson.
Mas Joshua e Chase eram um casal. Eles estavam apaixonados.
Era esse o tipo de amor que Grayson sempre ouviu falar – o tipo que fazia alguém dar a própria vida pelo outro. Ainda que achasse isso uma estupidez, pelo menos fazia sentido.
Mas Dane?
Dane não tinha um namorado lá dentro. Na verdade, ele provavelmente não conhecia ninguém naquele prédio. Mesmo assim, ele entrou, sem hesitar, para salvar completos desconhecidos.
Isso não fazia sentido. Não podia fazer sentido.
Grayson ainda estava parado, olhando para o prédio em chamas, enquanto a fumaça negra se espalhava pelo céu como uma nuvem de tempestade.
Depois de algumas horas, Dane finalmente saiu do prédio. Estava coberto de fuligem, com o cabelo chamuscado e respirando com dificuldade, apoiado no ombro de um bombeiro. Mas, milagrosamente, não tinha um arranhão sequer.
— Sorte a sua que não tinha mais nenhuma bomba lá dentro — comentou Ezra, em um tom que ficava entre alívio e bronca.— O que diabos você achou que ia fazer entrando lá sem equipamento?
Dane, como sempre, não parecia ver problema algum na própria decisão.
— Bom, tinha um escritório lá dentro. Podia ter encontrado um estilete, alguma ferramenta… No pior dos casos, pelo menos ia conseguir descobrir a localização da bomba e passar a informação.
— Para de fazer coisas perigosas, Dane.
Ezra soltou um suspiro exasperado antes de dar um tapa estalado nas costas de Dane e empurrá-lo para dentro da ambulância. Depois disso, sumiu no meio da confusão.
Agora sozinho, Dane aceitou a garrafa d’água que um paramédico lhe entregou e se concentrou em tentar acalmar a garganta, ainda irritada pela fumaça. Engoliu o líquido com avidez, esvaziando a primeira garrafa em questão de segundos. Ele estava abrindo a segunda quando notou uma sombra se projetando sobre ele.
Levantou o olhar e sorriu de canto.
— Você ainda está aqui?
Grayson o encarou de cima, com um expressão fechada, estranhamente contida. Normalmente, o outro homem estava sempre resmungando ou jogando sarcasmo para todos os lados, mas agora… nada. Apenas silêncio.
Dane piscou, intrigado. Grayson demorou um instante antes de finalmente abrir a boca, e sua voz saiu surpreendentemente calma.
— Você estragou meu encontro.
Dane arqueou uma sobrancelha. Pelo tom, parecia que Grayson estava apenas constatando um fato, mas algo na maneira como disse aquilo fez com que ele se sentisse esquisito.
— Ah é. Desculpe.
Como se não fosse grande coisa, deu de ombros e soltou uma risadinha.
— Podemos remarcar. Quando quer ir?
O silêncio voltou. Grayson não respondeu de imediato, parecendo ponderar sobre algo. Dane o observou de soslaio e, pela primeira vez, percebeu que entendia muito pouco sobre aquele homem.
Finalmente, depois de um longo momento, Grayson falou:
— Algum dia.
— Algum dia?
— Quando eu quiser.
Era um pedido absurdamente simples. Dane apenas assentiu, relaxado.
— Como você quiser.
Grayson ficou parado ali por mais alguns segundos, apenas o observando, antes de se virar e ir embora sem dizer mais nada. Nenhuma despedida. Nenhum comentário sarcástico. Nada.
Dane o acompanhou com o olhar até que ele desaparecesse no meio da multidão. Então, voltou a atenção para sua garrafa d’água e tomou mais um gole. O céu estava tingido de laranja e vermelho, e a fumaça negra do incêndio ainda se erguia no horizonte, se misturando com o pôr do sol.
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Continua..