Deseje-me se puder - Capítulo 60

{Quem é o mais louco aqui? (You’re more f****g crazy)}

Quando recebeu o relatório de manhã, o chefe dos bombeiros ficou, obviamente, furioso. Mandou chamar Dane e Grayson na mesma hora, mas quando viu os dois grandalhões parecendo que tinham sido atropelados por um caminhão, ficou ainda mais indignado.

Era difícil dizer quem estava pior. A única diferença visível era que Grayson tinha um curativo do tamanho de uma moeda colado na têmpora, mas, fora isso, os dois estavam igualmente acabados. Rostos inchados, hematomas por toda parte e até cortes cicatrizando. A cena era deprimente.

E foi aí que o chefe perdeu de vez a paciência. Olhou de um para o outro e começou a gritar como se estivesse tentando superar o barulho de uma sirene de emergência.

— O que merda tem de errado com vocês?!

A voz dele ecoou pelo quartel, fazendo Dane se encolher por reflexo e Grayson dar um passo para trás antes de se forçar a ficar no lugar. O chefe, claro, nem ligou para as reações deles e continuou despejando sua fúria.

— Recebo uma denúncia de briga de bar e descubro que os envolvidos são dois dos MEUS bombeiros?! O dever de proteger vidas e propriedades foi pro espaço, é isso? Se queriam resolver alguma coisa, que saíssem e dessem um jeito como adultos! Mas não, vocês tinham que se socar no meio de uma boate feito dois moleques brigando no recreio! O que eu sou agora, diretor de escola? Vocês têm DOIS METROS DE ALTURA e ainda assim estão aqui, de castigo na minha sala? Isso faz algum sentido?! Hein?! Digam alguma coisa! Vocês têm boca, então USEM!

Ah, podia ter parado antes dessa última parte…

Dane ficou tenso. Do jeito que Grayson era, era bem capaz de soltar alguma besteira e deixar tudo ainda pior. Mas, para sua surpresa, o que saiu da boca dele foi algo totalmente inesperado.

— Foi legítima defesa.

Dane e o chefe viraram para encará-lo ao mesmo tempo, mas Grayson apenas deu de ombros, completamente impassível, e continuou falando como se nada tivesse acontecido.

— Foi o Striker quem me bateu primeiro. Eu só me defendi. Olha aqui.

Com o dedo indicador, ele apontou para a lateral da cabeça, onde um curativo grande cobria o ferimento. As palavras saíam fáceis demais, como se ele tivesse ensaiado a própria defesa. Isso só fez o comandante sentir ainda mais raiva, mas agora não podia simplesmente jogá-lo aos leões. Então resolveu mudar de alvo.

— Dane Striker!

— Não foi bem… legítima defesa. — Dane admitiu sem jeito, mas ainda tinha algo a dizer. — Mas ele mereceu.

— O quê?! Mereceu por quê?!

O comandante se agarrou à brecha e pressionou. Dane olhou de relance para Grayson e respondeu com raiva:

— Esse desgraçado me insultou.

— Insultou?! O que ele disse?

Por um momento, o comandante hesitou. Isso mudava tudo. Se Miller tivesse feito algum comentário ofensivo contra Dane, o caso poderia se tornar um problema para toda a corporação. Sua postura endureceu imediatamente, mas a resposta de Dane foi um balde de água fria.

— Não posso dizer.

O comandante soltou um suspiro frustrado.

— Mas como diabos você espera que eu resolva isso? Eu preciso saber o que aconteceu para decidir se vou te punir ou interceder por você!

Ele tentou um tom mais brando, mas Dane nem piscou.

—  Só me puna de uma vez. Não vou falar nada.

A teimosia do outro só fez o comandante sentir o sangue ferver de novo.

— Então por que abriu a boca para começo de conversa?! Era só ter ficado calado!

Dane, indiferente como sempre, respondeu no mesmo tom monótono de antes:

— Só queria deixar claro que não bati nele do nada. Eu não sou um pervertido, nem um lunático como esse idiota. Se eu bati, foi porque ele mereceu.

Diante da insistência de Dane em justificar suas ações, o comandante irritado acabou virando-se para Grayson, como se dissesse: “Fala você então”. Mas Grayson apenas deu de ombros e esboçou um sorriso irônico.

— Bom, eu pessoalmente não considero ofensivo, mas já que ele disse que é um insulto, melhor eu ficar quieto. Vai que acabo sendo processado?

‘Que tipo de bobagem é essa?’

O comandante sentiu a pressão subir. Precisava de um remédio. Desde quando um Miller tinha medo de um processo? Isso era tão absurdo que até um cachorro riria.

— Ah, por favor, Nathaniel Miller te livraria de qualquer problema!

Mas Grayson fez uma cara de pavor exagerada e balançou a cabeça.

— Ah, claro! E depois ele quebra minha cabeça de novo com uma bengalada? Prefiro evitar a dor, chefe. Se Striker não vai falar nada, eu também não vou.

O comandante soltou um gemido frustrado. Era óbvio que esses dois tinham aprontado alguma, mas sem saber exatamente o quê, como diabos ele poderia puni-los direito? Depois de alguns segundos segurando a cabeça, bufou e finalmente decretou:

— Ambos terão um corte de salário de três meses!

—Eu me oponho.

A contestação veio na mesma hora. Dane franziu a testa e apontou para Grayson.

— Esse cretino é rico. Mas para mim, um corte no salário é devastador. Sem falar que tenho uma gata para sustentar. Três meses sem pagamento? Isso lá é justo? Como pode ser justiça se a nossa conta bancária é diferente

Ele tinha um ponto. O comandante coçou o queixo e reconsiderou.

— Está bem, então. Dane, um mês. Miller, três meses como antes.”

— Nossa, isso sim é um verdadeiro exemplo de igualdade.

Grayson abriu os olhos em falsa surpresa, e fez um comentário carregado de sarcasmo. O comandante, no entanto, ignorou a insolência.

— Agora sumam da minha frente, os dois! Só de olhar para vocês já me dá dor de cabeça! Fora daqui, agora!

Os gritos foram ficando cada vez mais altos, até que os dois perceberam que não tinham escolha a não ser irem embora. O comandante continuou berrando mesmo enquanto eles saíam:

— Da próxima vez, atirem logo! Por que usar os punhos? Por acaso estamos na Idade da Pedra? Não sabem que existe armas de fogo?! Da próxima, exploda a cabeça do outro, um vai para o céu, o outro para cadeia, e eu fico em paz—

A frase foi abruptamente cortada quando a porta do escritório se fechou na cara dele, cortesia de Grayson.

A secretária ficou olhando, atônita, enquanto os dois saíam.

Dane, ainda digerindo a merda em que tinha se metido, pegou um cigarro e colocou na boca. Um mês de suspensão salarial… Isso significava que o novo arranhador de luxo que ele tinha separado no carrinho de compras ia ter que esperar mais um mês.

‘Merda.’

Ele estava esperando por aquilo há meses.

Tudo por culpa de um vídeo que ele tinha visto, mostrando a casa absurda de um famoso, repleta de brinquedos e móveis luxuosos para os gatos. Aquilo tinha despertado um desejo incontrolável de dar algo parecido para Darling. Ele pesquisou, e claro, todos os produtos eram caríssimos. No fim, escolheu um e passou meses economizando para comprar.

E agora, por causa dessa confusão, ia ter que adiar o plano.

Suspirou pesadamente. Mas fazer o quê? Pelo menos o comandante tinha dado um desconto e reduzido a pena.

Ainda assim, dava para ver que ele estava verdadeiramente puto. Ele sempre protegeu Dane como se fosse um tesouro do quartel, mas dessa vez, parecia que a raiva não ia passar tão cedo.

‘Talvez eu deva dizer que vou fazer trabalho voluntário no fim do ano.’

No corpo de bombeiros, havia uma atividade anual em grupo. Eles visitavam orfanatos e hospitais, entregavam presentes para as crianças e brincavam com elas. Não era uma atividade obrigatória, então Dane costumava aproveitar o final do ano tranquilamente, viajando com Darling ou fazendo outras coisas.

Só que, ao lembrar disso, ele imediatamente pensou na causa de toda essa confusão. Grayson Miller. Se aquele desgraçado não tivesse falado merda…

— Você está satisfeito agora, seu louco de merda?

Dane rangeu os dentes, lançando um olhar furioso para ele. Mas Grayson, apenas deu de ombros.

— Eu recebi uma punição mais severa, não entendo por que você está bravo.

— Porque essa merda toda só aconteceu por causa da sua boca grande.

Dane rebateu no mesmo tom, como se fosse óbvio. Grayson, no entanto, inclinou a cabeça para o lado e sorriu de um jeito provocador.

— A maioria das pessoas simplesmente responde “não” quando perguntam se são ômegas. Não parte logo pra quebrar a cabeça de alguém.

‘Ainda nessa, hein?’ Dane pensou. ‘Mas também, o que mais esperar? Um alfa dominante não pode ser normal.’

— Já te falei dezenas de vezes, mas vou repetir de novo. Eu sou um beta.

Ele falou entre os dentes, como se estivesse mastigando as palavras.

— Depois de tanto repetir, até o seu cérebro minúsculo, menor que uma noz, deveria ter memorizado, seu imbecil.

Para reforçar, empurrou a testa de Grayson com o indicador e começou a andar, indo embora a passos largos. Como esperado, o outro não se deu por vencido e foi atrás, andando no mesmo ritmo relaxado de sempre.

— Você chama muita atenção. — Ele falou mais alto, como se quisesse garantir que Dane ouvisse, e continuou: — Alguém com uma aparência tão impressionante quanto a sua, difícil acreditar que seja um beta. Deve ser um alfa ou um ômega. Mas um alfa jamais esconderia suas características, e um alfa dominante não conseguiria passar despercebido. Agora um ômega? Por que faria isso?

Ele deixou a última frase no ar, como se estivesse realmente ponderando, mas seus olhos estavam fixos na nuca de Dane quando murmurou:

— A não ser que você seja um ômega muito, muito especial.

Daine só respondeu erguendo o dedo do meio por cima do ombro. Nem parou, nem olhou para trás, apenas acelerou o passo para se afastar mais rápido.

Aquele desgraçado definitivamente não podia ficar solto.

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Continua…