Deseje-me se puder - Capítulo 45
‘Então foi por isso que você entrou no porão?’
Como se estivesse respondendo a uma pergunta não dita, Grayson apenas assentiu.
— Bom, era menos entediante do que ficar sozinho.
Dane ficou em silêncio de novo. Parecia mergulhado em pensamentos complexos, enquanto seus colegas, atrás dele, já estavam prontos para ir embora. Ele já tinha percebido isso, mas não se virou. Ainda havia uma dúvida pairando.
— Mas por que você não saiu de lá?
Ele queria entender por que, em vez de simplesmente tirar o garoto do porão, Grayson tinha decidido entrar e ficar junto. Como sempre, Grayson respondeu sem nem hesitar.
— Se ele saísse, ele ia ser punido de novo. E o castigo ia durar ainda mais tempo.
Logo depois, ele franziu a testa, deu de ombros e continuou:
— Era só esperar um pouco mais, mas aí você apareceu e levou o Santiago embora. Alguém precisava dizer que ele não saiu por conta própria, então eu fiquei. Eu era a prova disso.
Mais uma vez, Dane ficou sem palavras. Ele olhou para Grayson com uma expressão carregada de algo difícil de definir, tentando processar o que tinha acabado de ouvir. Até que, depois de alguns segundos, perguntou:
— Então quer dizer que você acha que fez a coisa certa?
— Eu só estava tentando ajudar.
A resposta veio no mesmo tom despreocupado de sempre.
— Eu sempre faço o meu melhor, mas por algum motivo as pessoas sempre ficam com raiva de mim. Não entendo o porquê.
Para piorar, ele ainda fez cara de injustiçado, franzindo o cenho. Dane só ficou ali, encarando-o, sem conseguir decidir se sentia raiva ou algo mais complicado do que isso. Mas Grayson, como sempre, parecia alheio a qualquer coisa que não fosse sua própria lógica torta.
Foi nesse momento que Ezra, já sem paciência, gritou lá de trás:
— Dane! Tá fazendo o quê? Anda logo, vamos embora!
Dane olhou rapidamente para trás. Todos já estavam dentro do caminhão, só Ezra continuava do lado de fora, acenando impaciente para ele.
Sem dizer mais nada, ele se virou e começou a andar, tinha dado poucos passos quando Grayson, do nada, perguntou:
— Você também acha que eu fiz algo errado?
Ele parou e olhou para trás. Pela primeira vez, o maldito sorriso tinha sumido do rosto de Grayson. Ele estava completamente sério, sem nenhuma expressão.
Dane então respondeu com frieza:
— Pare de ajudar.
Seu olhar era tão gelado quanto a voz.
— Não faça nada, Grayson.
E sem esperar qualquer reação, ele simplesmente entrou no caminhão. Ezra subiu logo depois e cochichou:
— Pra que você ainda perde tempo com esse cara? Ele não bate bem.
Os outros no carro tinham expressões parecidas. Eles provavelmente tinham ouvido a conversa de Dane com Grayson. Dane não disse nada, apenas se sentou em um assento vazio, Grayson também entrou no carro, mas não disse uma palavra até chegarem no quartel. Ele só olhava de vez em quando para o lado de Dane, mas o homem, teimoso, mantinha o olhar fixo na direção oposta, sem se mover.
<Eu te amo, Dane.>
Na memória, uma mulher de cabelos ruivos o abraçou forte e sussurrou:
<Você é o meu tesouro mais precioso. Você é tudo para mim.>
A lembrança, há muito enterrada, voltou com força, e Dane sentiu o rosto se fechar automaticamente. Ele apertou os olhos, tentando afastá-la.
‘Eu ia para o clube hoje, mas essa bosta de dia foi um saco.’
Ele nunca procurava companhia quando estava de mau humor. E, como no dia seguinte era folga, decidiu que ia direto para casa depois do expediente.
‘Essa noite, vou dormir com Darling.’
***
‘Aquele desgraçado.’
Dentro do carro, a caminho do quartel dos bombeiros, Grayson começou a sentir uma irritação crescente.
‘Que porra de olhar foi aquele? O que ele estava pensando quando me olhou assim? Por quê?’
Nunca tinha visto aquela expressão antes. Não fazia ideia do que significava. Isso o irritava profundamente.
Desde que se lembrava, Grayson Miller sempre teve dificuldade em entender as expressões das pessoas. Provavelmente, nasceu com algum defeito no cérebro. Ele não conseguia decifrar se alguém estava feliz ou com raiva, e isso sempre o deixou confuso. Foi então que seu pai, Ashley Miller, deu uma sugestão ao filho que tinha tanta dificuldade:
<Aprenda a ler emoções.>
Depois disso, professores renomados, especializados em atuação e psicologia, começaram a frequentar a mansão para ensinar a ele a arte do *cold reading. No começo, era simples: se os cantos da boca subiam, era um sorriso; se desciam, era tristeza. Depois, ele aprendeu a decifrar até os menores movimentos dos dedos, entendendo cada detalhe que revelava o que as pessoas realmente sentiam.
(Nota: Cold reading é uma técnica usada para obter informações sobre uma pessoa sem que ela perceba, apenas observando sua linguagem corporal, expressões faciais, tom de voz e reações.)
Por sorte, Grayson tinha um talento absurdo para isso. Absorvia tudo como uma esponja, aprendeu a ler as pessoas num piscar de olhos, e logo começou a antecipar o que elas queriam antes mesmo que percebessem.
E não parou por aí. Também ficou muito bom em imitar emoções. Sabia exatamente como deveria agir em qualquer situação para parecer a pessoa perfeita para quem estivesse na sua frente. Seu talento era tão impressionante que um dos professores de atuação tentou convencê-lo a seguir carreira:
<Já pensou em seguir esse caminho? Eu posso falar com o senhor Miller, você tem um talento incrível! Imagina você e Chase juntos no tapete vermelho? Que espetáculo seria, hein?!>
O professor estava realmente animado. Mas Grayson recusou sem hesitar. Ele sabia onde estavam seus limites.
No fim, tudo que fazia era imitar. Por isso, nunca poderia ser como Chase Miller, o irmão mais novo e um dos melhores atores da atualidade. Chase conseguia transmitir emoções reais. Grayson, não. Na verdade, quando assistia aos filmes de Chase, Grayson só via aquilo como uma oportunidade de aprendizado: “Ah, então nessa situação ele faz essa expressão”. Ele nunca se impressionou com a atuação, porque não sentia a emoção por trás. Ele sabia quando alguém estava chorando, gritando ou sorrindo, mas nunca entendia o “porquê”.
Além disso, ele só se dava ao trabalho de atuar quando julgava que alguém valia a pena. E, quando decidia que valia, se dedicava 120%. Era por isso que, sem exceção, todos – homens e mulheres – acabavam caindo de amores por ele. O problema era que, quando enjoava, descartava sem a menor piedade.
De qualquer forma, o fato era que Grayson Miller nunca falhou. Mesmo aqueles que o odiavam no começo, com alguns presentes caros e as palavras certas, acabavam cedendo. E, claro, os que o detestavam de verdade… realmente o detestavam.
Grayson estava acostumado com isso. Ou era amor incondicional, ou ódio absoluto. No fim, era tudo a mesma coisa. Amor e ódio andavam de mãos dadas.
Ele sempre olhou para o mundo de cima.
Então… que porra aquele olhar significava?
A dúvida estava o corroendo por dentro. Ele sabia ler emoções. Ele aprendeu tudo. Mas aquela expressão… aquela expressão ele nunca tinha visto antes.
Ele precisava saber o que era.
Grayson começou a sentir uma ansiedade incomum. Ele não podia permitir que existisse uma emoção que ele não conhecesse, precisava descobrir o que aquilo significava, mesmo que tivesse que estrangular Dane Striker para isso.
Agora mesmo.
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Continua…