Deseje-me se puder - Capítulo 38
A ligação informando que um gato estava preso em uma árvore e não conseguia descer havia chegado cerca de uma hora atrás. Normalmente, Dane Stryker lidava com chamados com a mesma empolgação de quem assiste tinta secar – cheio de bocejos e claramente entediado. Mas, dessa vez, ele largou tudo e entrou na viatura sem hesitar.
E, por algum motivo que nem ele mesmo entendia, Grayson Miller fez o mesmo. Não houve tempo para racionalizar a decisão – quando percebeu, já estava no banco do passageiro, vendo a cidade passar pela janela.
Curiosamente, ninguém questionou sua presença. Os outros bombeiros estavam tão acostumados a evitar encrencas com ele que nem sequer fingiram interesse em suas intenções. Grayson não se importava, ele também não queria conversa. A única coisa captando sua atenção naquele momento era uma pessoa.
Dane Stryker.
Sentado de braços cruzados, a perna mexendo com inquietação incomum, ele parecia, pela primeira vez, verdadeiramente ansioso. Desde que Grayson conhecia Dane, o cara nunca demonstrava pressa, nem mesmo quando enfrentavam incêndios de grandes proporções. Mas, quando se tratava de animais, tudo mudava. Já tinha visto esse mesmo brilho nos olhos dele ao resgatar um esquilo preso em um bueiro e ao recolocar um filhote de pássaro no ninho. Era sempre assim, intensidade pura enquanto a missão durava, seguida por um olhar vago e sem brilho assim que terminava.
Grayson já tinha se acostumado com isso.
O que não era familiar era sua própria atitude, que havia mudado recentemente. De alguma forma, desde “aquele dia”, Grayson começou a notar cada ação de Dane, ele não sabia por que isso estava acontecendo. Nem mesmo ele conseguia se entender. E isso era irritante.
Mas o que realmente o incomodava era o fato de ainda estar ali. Não era hora de ficar perdendo tempo assim. Ele já havia cumprido seu papel no corpo de bombeiros e deveria partir, como sempre fez. Seu pai pediu que ficasse pelo menos um ano, mas sempre havia uma maneira de escapar mais cedo. Sempre havia um jeito. E ele precisava encontrar um – porque a vida era curta demais para desperdiçá-la longe do verdadeiro amor.
Ainda assim, já fazia um mês desde aquele dia e, de alguma forma, ele continuava ali. E pior, respondendo aos chamados como se fosse um bombeiro de verdade. Ou, para ser mais exato, seguindo Dane como um idiota sem noção.
‘… Espera aí.’
‘Eu estou seguindo esse cara?’
A constatação fez seu rosto franzir. Mas, antes que pudesse aprofundar essa crise existencial, a viatura parou. Dane foi o primeiro a sair, jogando um casaco por cima do uniforme enquanto caminhava em direção à árvore onde o gato estava preso.
Os outros bombeiros começaram a montar a escada, e, um pouco mais afastados, uma mulher – provavelmente a dona do gato – e alguns vizinhos observavam a cena, inquietos.
— Acho que não vai dar. Não tem como apoiar a escada.
Depois de algumas tentativas frustradas, Deandre desistiu e recuou. Ezra imediatamente pegou o rádio.
— Vamos chamar o caminhão com a escada hidráulica. Enquanto isso, ficamos de prontidão.
Enquanto aguardavam, os bombeiros que vieram como reforço começaram a circular pela área, conversando e brincando com os moradores. Mas, mesmo entre as piadas, seus olhos sempre voltavam para o topo da árvore, atentos a qualquer sinal de perigo para o gato.
Dane, por sua vez, estava no meio de um grupo de colegas, jogando conversa fora, e, aparentemente, chamando atenção.
Um grupo de mulheres começou a cochichar e a trocar olhares animados.
— É ele, né? Nossa…
— É o cara do calendário.
A confirmação foi seguida por um coro abafado de gritinhos e reações exageradas, pulos no lugar, mãos tapando a boca e punhos sacudindo no ar. Algumas já estavam segurando os celulares para tirar fotos, com os dedos tremendo de excitação.
— Meu Deus, eu nunca vi um homem tão bonito assim.
— E esse corpo? Eu daria tudo por um único encontro.
— Ele é enorme! Tem uns dois metros, não tem?
— Eu vou chorar… Ele parece ter saído direto dos meus sonhos.
— Cherry é um verdadeiro anjo! Olha só a retribuição por todos os petiscos que ganhou!
— Eu sempre soube que esse dia chegaria. Cherry é um gato que sabe agradecer as pessoas.
Os comentários não passaram despercebidos. Ezra, que já tinha lançado uma olhada rápida para o grupo histérico, cutucou Dane com o cotovelo e fez um gesto com o queixo na direção das mulheres.
— Elas não param de falar de você. Vai lá, dá um oi pelo menos.
Dane ergueu a mão em um breve aceno e logo a abaixou, sem dizer nada, mas com um leve sorriso nos lábios. Foi o suficiente para que o alvoroço das mulheres triplicasse. No entanto, os colegas de equipe mal reagiram, acostumados com esse tipo de cena, enquanto isso, para matar o tempo, alguns conversavam com as crianças que assistiam à operação ou discutiam sobre beisebol. Pouco depois, o caminhão com a escada chegou.
Como era de se esperar, Dane subiu na escada sem hesitar, escalando com a mesma facilidade de sempre. Lá de baixo, todos observavam enquanto ele se aproximava do gato encurralado.
— Isso mesmo, bonitinho, fica calmo.
Sua voz, incrivelmente suave e paciente, contrastava completamente com a imagem que ele costumava passar. Ele avançava devagar, cada movimento calculado para não assustar ainda mais o bichano. O silêncio ao redor era quase absoluto – todos prenderam a respiração enquanto observavam.
Quando Dane finalmente estendeu o braço – tão longo quanto seu próprio corpo – o gato encolheu ainda mais, os músculos tensos. As orelhas estavam abaixadas, o rabo eriçado, pronto para dar o bote a qualquer momento. Mas, no instante certo, com a precisão de um profissional, Dane agarrou firmemente a pele da nuca do animal.
O gato soltou um miado estridente e se debateu, mas as mãos de Dane eram firmes e experientes. Com um movimento rápido e seguro, ele o puxou para perto e o envolveu nos braços. A tensão que pairava no ar se desfez em uma explosão de aplausos e gritos de comemoração.
— Uaaaau!
— Conseguiu! Ele conseguiu!
— Graças a Deus, muito obrigada!
— Meu Deus, eu quase morri de susto!
Com o alívio tomando conta, as conversas voltaram ao tom animado. Assim que desceu da escada com o gato em segurança, Dane procurou pela dona. Uma mulher com os olhos cheios de lágrimas pegou o bichano nos braços, apertando-o contra o peito enquanto agradecia repetidamente. Os espectadores suspiravam emocionados, algumas mãos pousando sobre os próprios corações.
Até que, no meio da multidão, alguém soltou um comentário em tom de interesse.
— Será que podemos puxar assunto com ele?
— Com quem? O bombeiro? Você vai perguntar se ele é o cara do calendário?
— Claro que não! Precisa ser mais sutil.
— Tipo… perguntar se ele foi eleito o ‘O bombeiro mais sexy do Ano’?
— Você está louca!
No meio do caos das mulheres andando de um lado para o outro, uma delas, que até então parecia invisível, surgiu com um brilho determinado no olhar. Em suas mãos, vários exemplares do famoso calendário de bombeiros – todos com Dane estampado na capa. Com as bochechas vermelhas, ela estendeu os calendários e uma caneta para ele.
— E-eu… você pode autografar?
A mulher, normalmente discreta e de poucas palavras, reuniu uma coragem monumental para fazer o pedido. Atrás dela, as outras, que antes faziam alvoroço, ficaram boquiabertas com a ousadia. Mas a coisa não parou por aí.
Quando ela, trêmula, puxou o celular e perguntou se poderia tirar uma foto com ele, Dane pegou o aparelho e, sem hesitar, chamou um colega para tirar a foto. Ele mesmo tomou a iniciativa! Um gesto que, para os outros, era praticamente uma bênção divina. Afinal, não é todo dia que se tem uma foto ao lado do homem do calendário.
E, claro, ninguém ali ia deixar essa oportunidade escapar.
— Ei, eu também quero! Dane, por favor!
— Olha aqui, eu compro esse calendário TODO ano! Eu posso provar, olha!
— Espera aí, eu cheguei primeiro!
— Você? Nem pensar, é minha vez!
De repente, uma multidão apareceu – algumas até voltaram correndo para casa só para buscar o calendário. Outras, que claramente já tinham o exemplar há tempos, trouxeram apenas a capa solta, amassada de tanto ser folheada.
O resultado? O tempo que Dane levou assinando e tirando fotos foi muito maior do que o tempo que gastou para salvar o gato.
‘Isso é ridículo.’
De braços cruzados e expressão azeda, Grayson assistia àquela cena absurda. Era como se tudo isso fosse parte de uma rotina bem ensaiada – Dane e os outros agindo como máquinas programadas para agradar.
‘Que palhaçada…’
— Tsk.
Ele estalou a língua, irritado. Foi então que, por um breve momento, achou ter ouvido algo. Um som distante, abafado pelo burburinho das vozes, quase como um sussurro perdido no meio da multidão.
Ou ele estava tendo alucinações agora?
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Continua
joicevidal
Agora fiquei curiosa 🥰