Deseje-me se puder - Capítulo 29
Quando Dane terminou de falar, o silêncio foi total. Até o pessoal da mesa ao lado, que claramente estava ouvindo a conversa, ficou quieto. Todos se entreolhavam, esperando que alguém quebrasse aquele clima estranho.
Quem resolveu falar primeiro foi Ezra.
— Ainda assim, eu acredito que um dia você vai encontrar alguém para amar.
— Eu?
— Sim.
Ezra reafirmou com convicção.
— Como eu e a Sandra, por exemplo. Só de estar com ela, já me sinto bem. Quando vejo o rosto dela, quero beijá-la. Penso nela o tempo todo. E se ela não está por perto, sinto como se fosse morrer…
Enquanto falava, ele girava o copo entre os dedos, um sorriso bobo estampado no rosto. Só de pensar na esposa, sua expressão mudava completamente. Era como se Sandra estivesse ali, bem na frente dele, sorrindo.
Provavelmente ele lembrou de momentos simples: caminhar lado a lado e sentir os ombros se encostando, as noites em que ela preparava uma xícara de chá quente quando ele estava exausto, a maneira como seu coração reagia toda vez que ouvia a voz dela chamando seu nome.
Depois de relembrar tudo isso, Ezra olhou direto para Dane.
— Alguém assim.
O silêncio desconfortável voltou a se instalar, até que Dane murmurou:
— Você tem sorte. Parabéns.
— O quê? Ah… bom, eu realmente me sinto sortudo por ter encontrado a Sandra, mas…
Ezra riu sem jeito, claramente feliz só de falar da esposa. Ele deu um tapinha encorajador no ombro de Dane e acrescentou:
— Fique tranquilo. Um dia você também encontrará alguém. Quando isso acontecer, vai entender o quanto o amor pode ser incrível.
Ele parecia esperar alguma reação de Dane, mas tudo que recebeu em troca foi um sorriso cínico.
— Se o amor de fato existir.
Dane esvaziou o resto da cerveja de uma vez e já pediu outra. Os outros acompanharam, fazendo mais pedidos, e logo a conversa mudou para outro assunto. Em poucos minutos, ninguém mais se lembrava do que tinham falado antes.
***
Já era bem tarde quando Dane finalmente se levantou. Depois de virar o resto da cerveja, ele se ergueu, chamando a atenção de Ezra.
— Opa, já vai?
Dane assentiu.
— Está tarde. Minha “Darling” deve estar me esperando acordada. Valeu pela cerveja, Wil.
Ele acenou de leve para os outros e virou-se para sair. Foi nesse momento que, sem querer, seu olhar cruzou com o de Grayson.
Os olhos violeta estavam fixos nele, sem expressão. Dane sustentou o olhar por um instante antes de simplesmente ignorá-lo e sair da mesa. Uma garçonete passou por ele com um olhar sugestivo, mas ele apenas sorriu de leve, como quem diz “fica pra próxima”, e continuou andando. Normalmente, ele não perderia uma oportunidade dessas, mas hoje era um daqueles dias em que tudo o que queria era se jogar na cama e dormir por uma eternidade.
Seguiu pelo corredor e viu, vindo em sua direção, um homem absurdamente alto.
Grayson Miller.
A presença dele era impossível de ignorar. O cara era um maldito modelo de passarela, com um físico invejável, membros longos e bem proporcionados, ombros largos e uma altura que fazia qualquer um parecer insignificante ao lado dele. O blazer impecável caía perfeitamente, destacando cada detalhe daquela postura arrogante, seu cabelo loiro estava penteado para trás, revelando um olhar intenso e afiado.
Mesmo assim, algo no visual refinado dele fez Dane franzir a testa por puro reflexo.
E, para piorar, eles estavam indo exatamente na direção um do outro. Dane percebeu que Grayson devia estar voltando do banheiro e, embora não gostasse nem um pouco da coincidência, não queria parecer incomodado. Então seguiu seu caminho sem alterar o passo.
Ele pensou que Grayson faria o mesmo.
Pensou errado.
Quando estavam perto o suficiente para que um esticar de braço fosse o bastante para se tocarem, Grayson abriu um sorriso enorme.
— Olha só, já vai embora? Mas a noite ainda está só começando.
O tom leve e despreocupado combinava perfeitamente com a fama de cafajeste que ele tinha. Era impressionante como, depois de passarem horas praticamente se matando, o cara conseguia agir como se nada tivesse acontecido. Isso significava que ele era muito maduro ou simplesmente um psicopata sem emoções. Difícil dizer.
— Tô cansado.
Dane cortou o assunto ali e seguiu andando, mas Grayson insistiu:
— A Martha parecia bem interessada em você. Vai mesmo sair assim?
‘Martha… Ah, a garçonete que jogou olhares mais cedo. Então até isso Grayson tinha reparado?’ Dane riu pelo nariz, achando aquilo ridículo.
— Impressionante você ter percebido, considerando que passou a noite inteira dando em cima de todas as funcionárias do bar.
A provocação não fez Grayson recuar nem um pouco. Na verdade, ele sorriu ainda mais.
— O amor é impossível de esconder. Acaba sempre chamando atenção.
Dane olhou para aquele sorriso convencido e revirou os olhos mentalmente.
É, tecnicamente, até uma transa de uma noite pode ser considerada “amor”, né?
Com esse pensamento irônico na cabeça, ele tentou simplesmente seguir em frente, mas, de repente, sentiu um aperto firme em seu braço.
Que porra é essa?
Ele virou-se, claramente irritado, apenas para encontrar o sorriso despreocupado de Grayson.
— Ei, ei, ei. Onde pensa que vai? Você deveria dar uma chance para a Martha.
— Já falei que tô cansado.
— E se você se arrepender depois?
— Arrepender? Eu? De quê?
Dane franziu a testa, jogando três perguntas seguidas. Grayson, em resposta, adotou um tom um pouco mais sério.
— E se a Martha for o amor da sua vida?
A voz dele soava leve e descontraída, como sempre. Dane estreitou os olhos.
— E daí?
— Se você deixar passar agora, pode nunca mais ter outra chance. Já pensou que coisa triste? Meu Deus, só de imaginar, dá vontade de chorar.
Grayson fez uma expressão exageradamente emotiva, até limpando um canto dos olhos como se estivesse prestes a derramar lágrimas. Claro, não tinha nada ali. Era pura encenação.
Dane o encarou, sem acreditar na palhaçada, antes de soltar uma risada sarcástica.
— Tá bom. Então me explica… o que é esse amor que você tanto procura?
A pergunta tinha um tom provocativo. Como se Grayson fosse mesmo do tipo que pensa seriamente sobre essas coisas. Só que, para a surpresa de Dane, ele reagiu de um jeito inesperado. O sorriso ainda estava lá, mas algo nos olhos dele brilhou diferente.
— Amor é ser feliz, estar leve, querer ficar junto o tempo todo. É ter alguém que te apoia, não importa a merda que você faça…
Enquanto falava, ele parecia quase encantado, como alguém sonhando acordado. No final, concluiu com um ar satisfeito:
— E, no fim das contas, é alguém que fica com você, para sempre.
Dane escutou tudo com uma cara de tédio monumental. Quando Grayson terminou, ele soltou um som indecifrável e riu de leve.
— Então tá. Ou seja… isso não existe.
Ao contrário do discurso longo de Grayson, Dane só precisou de uma frase para encerrar o assunto. Ele se virou sem cerimônia e foi embora, deixando para trás até o perfume enjoado que sempre cercava Grayson.
E por um momento, parecia que a conversa tinha acabado ali.
Mas então, Grayson falou de novo.
— Você realmente não foi naquele dia?
Dane nem olhou para trás.
— Não, não fui.
Respondeu no automático, sem dar importância. Mas um segundo depois, percebeu que algo estava errado.
Um silêncio estranho se instalou atrás dele.
Dane não sabia explicar porquê, mas teve a sensação incômoda de que Grayson estava sorrindo.
E, de fato, ele estava.
— Engraçado… eu nem disse que dia era.
Dane parou.
Lentamente, ele se virou e encarou Grayson, que ainda o observava com um sorriso no rosto.
Um canto da boca de Dane se ergueu.
— Até que você é bom.
Ele riu de leve, enfiou as mãos nos bolsos da jaqueta e foi embora sem olhar para trás.
Não fazia sentido perder tempo com esse cara. Óbvio que não fazia.
Enquanto isso, Grayson ficou parado ali, ainda sem acreditar que tinha soltado aquelas palavras.
“Que merda que eu estou fazendo? É claro que não é esse idiota.”
Murmurou para si mesmo, antes de dar meia-volta e seguir pelo corredor oposto, de volta para onde veio.
°
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Continua…
Armyizhan
Pior que é 🤣❤️