Deseje-me se puder - Capítulo 150
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Um silêncio pesado pairou no ar. Grayson olhava para Dane sem sequer piscar. O rosto dele, visto de perfil enquanto mantinha o olhar fixo e vazio em uma das paredes, continuava inexpressivo – era impossível saber o que ele estava sentindo.
— Depois que ela morreu…
Dane retomou a fala.
— ….eu conheci meus avós maternos pela primeira vez. Foi assim que descobri como nasci.
Um amargor se espalhou em seu rosto. Dane soltou um suspiro profundo, como se sentisse o peito apertado, e franziu o cenho. Parecia extremamente difícil para ele revelar a verdade; ele manteve a boca fechada por um tempo, sem conseguir dizer mais nada. Só depois de passar a mão pela testa e soltar um suspiro pesado, é que finalmente conseguiu confessar, com a voz quebrada:
— No dia em que ela entrou no ciclo de calor…, foi estuprada por desconhecidos.
Os olhos de Grayson vacilaram. Ainda assim, Dane continuou falando em um tom baixo e abafado:
— Pegaram os culpados. Mas eles disseram que ela queria aquilo. E como ela estava no cio, o tribunal aceitou a versão deles. Minha mãe dizia que tinha sido estupro, mas seus depoimentos foram considerados inconsistentes, então foram considerados pouco confiáveis e acabaram rejeitados. Acho que era inevitável, por causa do cio. A memória dela estava confusa, e a corte não reconheceu como estupro.
A única verdade incontestável, apesar das alegações contraditórias, era que ela era uma ômega. E estava no cio naquele momento.
— Eu também não sei qual é a verdade. Mas o que é certo é que, por causa disso, ela engravidou… e me teve.
〈Por sua causa… Se não fosse por você…!〉
Subitamente, o grito estridente que tantas vezes o atormentava voltou a ecoar em seus ouvidos. Com um tom cheio de amargura, Dane perguntou:
— Agora você entende por que ela me odiava tanto?
Seu único filho acabava sendo, infelizmente, a prova viva da violência brutal que ela sofreu. Alguém a quem ela não conseguia deixar de amar por ser seu próprio sangue, mas que, ao mesmo tempo, também odiava, por fazê-la lembrar de um passado insuportável. Algo tão precioso… e ao mesmo tempo tão agonizante.
⟨Meu filho.⟩
Depois que soube da verdade, Dane também entendeu por que ela tentou matá-lo. Quando descobriu que ele havia se manifestado como ômega, ela deve ter enlouquecido. As lembranças daquele pesadelo voltaram todas à tona, e ela deve ter pensado que seu filho passaria pelas mesmas coisas que ela…
— Meus avós maternos eram religiosos fervorosos. — Dane relembrou aquele tempo com uma voz seca.
— Não toleraram que a filha tivesse engravidado de um estupro. Ela foi expulsa de casa, criou um filho sozinha… e passou a vida afogada no álcool, até morrer.
Sua voz se esfacelou, áspera.
— Me culpando por tudo.
⟨Eu te amo, Dane. Meu único tesouro, meu precioso bebê.⟩
— Bem… Talvez ela tenha me amado.
〈Nojento. Você é nojento! Maldito filho da puta! Eu nunca quis ter você!〉
Um sorriso autodepreciativo surgiu em seu rosto.
— Afinal… o que é o amor? Será que ela me amava de verdade? Ou só queria acreditar nisso?
Era uma pergunta, mas não dirigida para Grayson. Dane acrescentou, mantendo uma distância invisível entre eles:
— Eu não sei.
‘Por que, no fim, ela mudou de ideia e partiu sozinha?’
‘Será que foi por me odiar? Para que eu também passasse pelo mesmo inferno que ela viveu…?’
‘Foi porque ela me amava? Por isso não conseguiu me matar, no fim?’
Essa é uma resposta que ele jamais teria. Ela se foi sozinha, sem deixar sequer uma carta de despedida.
— Você é uma boa pessoa.
A história terminava ali, Dane havia contado tudo. Quem ele era, o tipo de ser humano que tinha se tornado, quanto vazio carregava. Não importava o quanto amor recebesse – no fim, tudo escorreria por aquele enorme buraco negro dentro dele que devorava qualquer afeto.
— Ashley Miller está errado. Você sabe o que é o amor. E sabe como amar também.… Sim, você é diferente de mim.
Dane olhou para ele com um sorriso sereno.
— Com certeza, você vai encontrar alguém que saiba retribuir todo esse amor que você tem para dar
Era o ponto final.
Um alarme estridente disparou na mente de Grayson. Em desespero, ele falou:
— Essa pessoa é você.
— Não sou eu. — Antes que pudesse dizer mais alguma coisa, Dane negou de imediato. E logo acrescentou, sem dar brecha para discussão: — Eu não posso fazer isso.
As palavras foram curtas, porém definitivas. Não havia espaço para réplica. Olhando para Grayson, que estava paralisado no lugar, Dane esboçou um sorriso autodepreciativo.
— Me desculpe.
Grayson continuou sem conseguir dizer nada.
***
Grayson Miller deixou o corpo de bombeiros.
A notícia se espalhou rápido como fogo, e em apenas meio dia, todos no quartel já sabiam.
— O que aconteceu? O Miller pediu demissão?
Deandre exclamou surpreso. Dane, que estava inspecionando o caminhão dos bombeiros, quase acertou um soco em Deandre, que havia se aproximado do nada e gritado bem em sua cara. Por sorte, ele conseguiu parar a tempo. Após um suspiro prolongado, respondeu:
— Eu entenderia mesmo se falasse mais baixo. Quase te dei um soco.
— Tá, tá bom. Mas o que aconteceu? Você sabe, não sabe?
As perguntas se seguiram rapidamente, Dane desviou o olhar de leve. Perto dali, os colegas que já tinham ouvido a notícia estavam reunidos, esperando em silêncio por sua resposta. Ele voltou a mexer no motor, com desinteresse:
— Parece que ele terminou o que tinha para fazer aqui. Que diferença faz?
— Ah…
Todos ali presentes ficaram atônitos com aquela resposta simples. Trocaram olhares confusos entre si e, logo depois, começaram a falar todos ao mesmo tempo:
— Como assim? O que quer dizer com “terminou o que tinha pra fazer”?
— Não faz diferença? Ele fazia parte da nossa equipe! É claro que isso importa para todos nós!
— Então o Miller realmente saiu? Ele não vai voltar mesmo?
— Como ele pôde ir embora sem nem se despedir da gente…?
Dane ignorou os gritos que ecoavam ao redor. De qualquer forma, logo parariam. No fim, aquela turma sempre se agitava por qualquer coisa – era só esperar que se acalmassem sozinhos. Pensando assim, ele começou a organizar os equipamentos, quando de repente, viu a ponta de um sapato no canto do campo de visão. Ao levantar a cabeça, seus olhos encontraram os de Ezra.
— Dane.
Ezra o cumprimentou com um leve aceno, mas Dane apenas o olhou com indiferença. Com um olhar que parecia dizer “você também?”, Ezra sorriu constrangido e respondeu:
— Não, é que… não é bem isso, quer dizer, pode até ser…
Gaguejando e falando sem nexo, Ezra coçou a nuca antes de falar com cautela:
— É que… o Miller não vai mais voltar mesmo? E você, o que vai fazer agora?
— Ah…
Dane relaxou a expressão. Sua casa havia pegado fogo e, desde então, ele estava ficando na casa do Grayson. Mas agora que Grayson havia se demitido, Ezra devia estar se perguntando onde Dane estava morando. Era uma pergunta que ninguém mais pensara em fazer, algo típico da personalidade gentil e atenciosa de Ezra. Dane sentiu uma sensação estranha por dentro, já que não esperava ouvir essa pergunta – e, ao mesmo tempo, ficou aliviado.
— Me mudei. Voltei para o hotel onde estava antes.
— Hotel? Aquele onde o Miller disse que sofreu um assalto?
Ezra perguntou, surpreso. Dane respondeu com um vago:
— É…
Não era exatamente um lugar agradável, mas considerando o dinheiro que ele tinha, não havia lugar mais adequado. Ainda assim, Ezra claramente pensava diferente.
— Mesmo assim, lá é perigoso demais! Você devia procurar outro hotel…
— Eu já estou procurando um lugar para alugar, então não se preocupe tanto.
Dane descartou as preocupações dele com simplicidade. Ezra parecia querer continuar falando, mas percebeu o momento certo para se calar. Sabia que, se insistisse só mais um pouco, Dane com certeza ficaria irritado. Ele detestava ser incomodado.
— Mesmo assim, é triste ele ter ido embora sem nem se despedir. — Ezra suspirou, murmurando quase para si mesmo: — Não tem como fazermos uma despedida individual? Ele certamente não se reuniria só comigo….
Dane lançou um olhar breve para Ezra, que sorria de forma envergonhada, e respondeu com naturalidade:
— Você tem o número dele? Pode ligar só para saber como ele tá.
— É mesmo?
Ezra perguntou, animado de repente. Dane assentiu com a cabeça, sem muito entusiasmo. Na verdade, tanto fazia, Grayson tinha desaparecido completamente da sua vida.
Conforme tinham combinado no começo.
Dane pegou a caixa de ferramentas e virou o corpo. Colocou os itens de volta no lugar de onde vieram e se virou, mas então sentiu algo estranho. Parou no lugar, olhando devagar ao redor, mas nada parecia ter mudado. Passou os olhos novamente pelo corpo de bombeiros, desta vez no sentido oposto. Foi então que o celular tocou com uma notificação. Ele tirou o telefone do bolso e verificou a mensagem – logo em seguida, sua expressão ficou vazia.
— Era só um spam.
Resmungando baixinho, Dane apagou a mensagem e enfiou o celular de volta no bolso.
Uma semana se passou desde então. E nesse tempo, não houve nenhum contato de Grayson. Nem mesmo as longas mensagens de texto, que antes chegavam com frequência, apareciam mais.
Dane se virou e saiu caminhando a passos largos, com a incômoda sensação de que tudo ao redor estava silencioso demais, sem motivo.
°
°
Continua…
Armyizhan
Ah 😭😭😭😭
Ize
É gente, vou ali beber água sanitário
Duda
Vou comer vidro ali e já volto
Klein
Ai meu Deus tá começando a sentir falta do nosso doidinho hehehehe