Deseje-me se puder - Capítulo 06
‘Calma. Você não tem prova de nada. Um Ômega dominante? Isso é coisa que só se vê uma vez na vida – se tiver sorte.’
Grayson, por um acaso do destino, conhecia dois. Um era Koy, sua mãe biológica. O outro, Angel, mãe do seu amigo Keith Pittman. Mas ele só “conhecia” esses “seres” no sentido mais básico da palavra, e eles não tinham nada a ver com a vida dele.
‘E agora, do nada, um aparece no meio de um incêndio? Que tipo de coincidência ridícula é essa?’
Sua cabeça tentava racionalizar, mas as emoções traíram a razão. O coração martelando no peito não podia estar mentindo. A vida toda, Grayson suprimiu seus instintos com pura força de vontade. A única exceção era quando ele sentia que tinha encontrado seu “destinado”.
E aqui estava ele, se iludindo de novo. Caindo na mesma armadilha, sabendo que ia se arrepender depois. Mas… e se fosse verdade desta vez? E se ele fosse a pessoa que Grayson estava procurando esse tempo todo?
“Fogo.”
Aquela lembrança absurda surgiu de repente – palavras ditas por uma cartomante que ele tinha rido na cara. Mas agora, pareciam o único caminho claro à sua frente. Ele sabia que estava certo. Não era mais uma teoria. Só precisava confirmar.
‘Como?’
Grayson parou por um instante antes de voltar a andar em círculos.
‘Botar fogo na casa? E se eu incendiar esse hospital agora? Como eu encontraria ele entre os bombeiros? Ele poderia estar de folga, né?’
O problema era que sua memória não ajudava. Lembrava de ter olhado para trás, mas o outro usava um capacete e tinha se aproximado sem ser visto. Ele até achou que ouviu a voz dele, mas não conseguia lembrar o que foi dito ou como era o tom. Nem sabia se era homem ou mulher. Ou… não, devia ser mulher, já que disseram que os seios eram grandes.
‘Mas fora isso? Nenhuma pista. A voz? Fraca demais para ser útil, mesmo que ouvisse de novo, provavelmente não reconheceria.
‘Então, e agora? Ficar tacando fogo nas coisas até encontrar a pessoa certa? Muito trabalho. Preciso achar um jeito mais eficiente.’
‘… Ah, eu sei.’
Poucas horas depois, Grayson já estava a caminho do leste para encontrar seu pai, Ashley Miller.
***
O cara mais cotado para ser o próximo presidente. Ex-CEO do maior escritório de advocacia da América do Norte, ex-advogado, e atualmente senador. Na época do colégio, era capitão do time de hóquei no gelo e um verdadeiro VIP. Com mais de 2 metros de altura, cabelos platinados e uma beleza de tirar o fôlego, ele era o definitivo “alfa dominante”.
Esse era Ashley Miller.
Pai de seis filhos, ele olhava para o segundo mais velho com a mesma expressão impassível de sempre, parado atrás da mesa. Mesmo depois de ouvir Grayson, ele não mudou a expressão. Depois de um silêncio que pareceu durar uma eternidade, Ashley finalmente abriu a boca.
— O que você acabou de dizer?
A voz era baixa, mas pedir para repetir não era algo que ele costumava fazer. Grayson, com um sorriso largo e cheio de si, olhou para o pai.
— Eu disse que quero ser bombeiro. Mas como não estão contratando no momento, pensei em entrar por um processo seletivo especial. Então… queria sua ajuda.
Repetiu a frase, dessa vez acrescentando um pouco mais de contexto. Ashley continuou olhando para ele sem expressão e então falou novamente.
— Repete.
— Quero ser bombeiro, pai. Como não é época de concurso, pensei em conseguir uma vaga especial. Queria que você usasse sua influência para me colocar lá.
Já era a terceira vez que dizia a mesma coisa. Qualquer um estaria de saco cheio, mas Grayson continuava sorrindo. Um sorriso ensaiado, tão familiar que Ashley apenas o encarou sem dizer nada. Depois de outro silêncio pesado, ele finalmente aceitou que essa conversa era real e recostou-se na cadeira.
— E por quê?
— Porque ajudar pessoas é um ato nobre.
Uma resposta digna de um panfleto motivacional – e, obviamente, nada do que Ashley esperava ouvir. Não era o tipo de coisa que seu filho diria com sinceridade.
Mas Grayson já antecipava essa reação e, sem perder tempo, acrescentou com naturalidade:
— Minha alma gêmea trabalha no corpo de bombeiros. Quero ir lá checar pessoalmente.
— Aah…
Ashley estreitou os olhos e soltou um longo suspiro, como se finalmente tudo fizesse sentido. Não parecia muito impressionado, mas Grayson continuou como se não tivesse notado.
— Claro, há sempre a chance de eu estar errado dessa vez também. Mas, como se diz, você nunca saberá até tentar, certo? Você sempre disse que eu podia fazer o que quisesse, contanto que não fosse crime. E ajudar os outros não é um crime, então…
O discurso bem ensaiado não arrancou nenhuma reação de Ashley. Ele apenas olhou para o filho, observando como aquela palavra – alma gêmea – sempre o fazia entrar num estado de empolgação ridículo. Depois de um instante, ele arqueou a sobrancelha e perguntou com um sorriso torto:
— Você sabe quantos quarteis de bombeiros existem no país, certo?
Grayson hesitou por um segundo, mas logo retomou o sorriso.
— É claro, já conferi.
— Com uma vidente, imagino.
— Com as cartas de tarô.
Ashley claramente estava debochando, mas Grayson pegou a deixa sem hesitar. Ele sabia que explicar a história real – que um Omega dominante estava entre os bombeiros que atenderam o incêndio da Festa de Feromônios e que ele acreditava que aquele era seu par perfeito – só faria Ashley ter certeza de que seu filho finalmente surtou. Dizer que “consultou uma vidente” soava muito mais fácil de engolir. Então, ele esperou a resposta de Ashley, confiante na sua estratégia.
Ashley estudou o rosto liso e calculista de Grayson, um traço que ele herdou do avô, Dominic. Ele reprimiu o incômodo crescente e tentou, mais uma vez, enxergar no filho algum traço da pessoa que ele amava, mas, infelizmente, foi em vão, Ashley aceitou a realidade sem resistir.
— Bom, pelo menos você está motivado.
Os olhos de Grayson brilharam na mesma hora, e suas orelhas se mexeram levemente. Isso fez com que o coração de Ashley amolecesse um pouco. Ele fixou o olhar nas orelhas do filho – uma peculiaridade que ele compartilhava com seu único Omega – e finalmente cedeu.
— Certo, eu vou dar um jeito. Mas tem uma condição.
— Qualquer coisa.
Grayson respondeu no ato, sem nem esperar para ouvir qual era a condição. Ashley considerou alertá-lo sobre como essa impulsividade sempre o metia em encrenca… mas decidiu que aprender da pior forma fazia parte da vida.
— Você vai ficar pelo menos um ano. Sem desistir no meio do caminho.
De novo, Grayson parou e ficou paralisado. O motivo do silêncio ser mais longo que o anterior era óbvio: se desse errado outra vez, ele ia querer cair fora na mesma hora. Precisava partir o quanto antes em busca do próximo candidato.
‘Sem chance.’
Mas é claro que não seria tão fácil.
Ashley observou o filho hesitar e, como se tivesse lido sua mente, acrescentou com a voz fria:
— Jackson veio reclamar comigo. Disse que você arruinou os preciosos gêmeos dele.
— Foi legítima defesa. Eles tentaram me estuprar.
Grayson piscou ao ouvir um nome que já tinha até esquecido, mas rapidamente se recompôs, defendendo-se com um sorriso. Ashley estreitou os olhos e, em um tom ainda mais cínico do que o normal, rebateu:
— Porque você provocou os dois despejando feromônio nos corpos deles.
Grayson abriu a boca para retrucar, mas Ashley foi mais rápido.
— Então, como punição, você vai compensar isso prestando serviço à comunidade. Sua obsessão com o seu destinado é um problema seu. Mas isso que você fez? Você vai assumir a responsabilidade. Ou veio até aqui só para implorar por um atalho porque não tem coragem nem de bancar suas próprias escolhas?
Touché.
Ele merecia ouvir isso. O sermão era tão irrefutável que nem valia a pena tentar se justificar. Mas Grayson hesitou em responder com medo de que pudesse estar errado de novo. ‘E se não for essa pessoa?’ Quantas vezes ele já não caiu nesse mesmo erro, confundindo instinto com desejo? Quem poderia garantir que desta vez seria diferente?
‘Mas e se, dessa vez… for real?’
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Continua…