Defina o relacionamento - Capítulo 65
Todas as coisas boas que compõem Ash Jones vinham de sua mãe. A razão pela qual ele foi capaz de crescer assim, apesar do ambiente emocionalmente instável em que vivia, provavelmente foi graças à sua mãe.
Ash sempre foi grato pela mãe exemplar que tinha. Mesmo sob circunstâncias desfavoráveis, sua mãe era gentil e forte. Ela acreditava no amor e falava sobre como era difícil encontrar a pessoa certa. Graças a isso, Ash acreditava no amor. O afeto que ela lhe mostrou durante toda a sua infância foi a prova disso.
Desde o momento em que Ash pôde se lembrar, seu pai nunca havia feito sua mãe feliz. Lhe disseram que a relação dos dois não era assim quando sua irmã Natalie nasceu, mas tudo parecia ter mudado com o nascimento de Ash. Isso porque seu pai acreditava que Ash era o produto de um caso.
O início do relacionamento dos seus pais foi como em um filme. Sophia, a filha única de um aristocrata, e Shane, um designer comum, se apaixonaram. Naturalmente, houve oposição familiar. No entanto, eles não puderam abalar a determinação da mulher, então seus avôs acabaram permitindo que eles se casassem. E durante oito anos eles foram felizes. Depois de dois anos de uma lua de mel cheia de amor, ela finalmente deu à luz a sua primeira filha, Natalie.
Sua mãe tinha um amigo de quem era muito próxima desde a infância. Como eram amigos próximos, todos diziam que formariam um belo casal graças a seus diferentes gêneros e características, mas eram apenas amigos – pelo menos na visão de sua mãe. Seu nome era Philip Gordon.
O homem, que herdaria o título de marquês, era nobre por nascimento e sua personalidade era elegante por natureza. Ele era atencioso e discreto. Assim, desde sempre, ele permaneceu sempre em silêncio ao lado de sua mãe. Mesmo quando a mulher que ele amava se casou com outra pessoa e depois disso.
Embora Gordon nunca tenha feito nada desrespeitoso, a própria existência de Philip Gordon sempre foi uma sombra na mente de seu pai. O homem que o gerou, que foi preparado conforme o status de sua mãe, recebeu um sobrenome aristocrático após o casamento e teve que se encontrar com aqueles de mesmo status periodicamente. E, nesse meio, a sombra de Philip Gordon sempre o perseguiu.
O ressentimento de seu pai pela amizade que sua mãe tinha com o Marquês Gordon, mesmo após o casamento, fez com que ela se afastasse dele. No entanto, as histórias que os seguiam dentro dos círculos sociais nunca morreram, e uma dúvida nasceu no coração de seu pai.
A dúvida se tornou tão grande, ao ponto de ele suspeitar que Ash era filho de Philip Gordon com sua mãe.
Mesmo após muita argumentação e súplicas, seu pai continuou desconfiado, embora um teste tenha confirmado a paternidade. A mãe de Ash se certificou de que ambos os filhos tivessem o sobrenome do pai. Contudo, ele não pareceu satisfeito com nada disso.
Desta forma, o senso de traição que se originou em Gordon finalmente irrompeu em uma direção diferente. Seu pai entristeceu a esposa, na qual deveria fazer feliz, da forma mais miserável possível, enquanto a traía abertamente com outras pessoas.
Havia muitas razões pelas quais ela se apaixonou por aquele homem: ele era um homem bonito, um achado raro. No dia em que o plebeu sem ligação com a aristocracia apareceu em uma festa junto a ela, as pessoas viram em seu rosto a razão pela qual ela havia se casado com ele. Sendo um homem assim, não foi difícil encontrar alguém com quem ter um caso.
Não era incomum entre a nobreza, portanto o caso de seu pai não se tornou um grande escândalo. Apenas os rumores sobre sua mãe cresceram. A notoriedade é como uma faca de dois gumes, tornando-se venenosa quando levada longe demais. Sua mãe era uma pessoa brilhante, e isso atraía a atenção. Aquilo cresceu como uma avalanche que ameaçou esmagá-la, e como resultado ela parou de sair em público.
É provavelmente por isso que Ash viveu uma vida muito distante da aristocracia.
Apesar do relacionamento conjugal instável, foi graças à dedicação de sua mãe que Ash pôde crescer bem e prosperar. Seus avôs cuidaram de seus únicos netos e Ash foi banhado em amor. À medida que foi ficando mais velho, começou a conviver com o pai, que praticamente não teve contato durante toda a vida, mas não tinha sentimentos fortes por ele. Bastava-lhe apenas saber que havia ali aquela figura materna.
Mas o que ele não conseguia entender era porque sua mãe não se divorciava.
Era um assunto complexo. Estavam separados há vários anos, e mal se viam, mas ele não tinha chegado ao ponto de se divorciar dela. Mesmo quando sua mãe, cansada da longa espera, pediu o divórcio, ele não deu ouvidos. Nem a conciliação de seus avós funcionou. Ele não queria nenhum dinheiro, apenas se agarrava a figura da mulher.
Ela o amava, mas não podia continuar ao seu lado e foi se afastando lentamente. O amor era tão estranho e, embora não pudesse compreender a situação racionalmente, sua mãe nunca culpava o homem. Ela apenas contava uma história para Ash com frequência.
“Se um dia você encontrar alguém que ama, bombom, você não deve ser egoísta”.
Não era apenas uma história sobre seu pai.
“Amar significa não impor seus próprios desejos. Mamãe descobriu isso com o tempo.”
Esse provavelmente foi seu testamento. Sua mãe morreu em um acidente um dia depois de dizer isso. No dia em que foi comprar ferramentas de pintura, tudo porque Ash disse querer aprender a pintar.
Ao ver Ash, cujo rosto e talentos eram tão parecidos com os de seu marido, Shane, Sophia atendeu o desejo de seu filho com um olhar nostálgico no rosto. Mãe e filho foram animados para o primeiro passeio em muito tempo. Chegaram à galeria de arte do centro de Londres, de mãos dadas, onde ela costumava ir com seu pai. E por acaso, realmente por acaso, eles encontraram Philip Gordon.
Depois disso, suas memórias ficaram nebulosas. Em pouquíssimo tempo, a pacífica cidade de Londres se transformou em caos. O noticiário, então, disse ser um crime terrorista que havia sido planejado antecipadamente. Homens-bombas suicidas explodiram em diversos lugares da cidade.
O metrô e os ônibus foram bombardeados aleatoriamente. Os transeuntes na rua foram apanhados pelas explosões trovejantes. Chamas ardentes, fumaça preto-acre e estilhaços afiados caíram por toda parte.
Philip, que cumprimentou sua mãe, foi o primeiro a se mover. Assim que o homem se sentiu ameaçado, ele envolveu seus braços ao redor do menino a sua frente, e sua mãe empurrou o amigo, que estava com os braços envoltos ao redor de seu filho, para longe dos escombros que caíam. Quando os empurrou na direção de um prédio que não foi afetado pelas consequências da explicação, ela chamou o nome de alguém. Tanto Philip quanto Ash ouviram claramente.
Sua mãe chamou Ash pouco antes de morrer.
Entretanto, a situação não parecia ter refletido bem sobre a figura de seu pai. Ao tomar conhecimento da situação, ele acreditou que sua mãe havia escolhido morrer em nome de Philip Gordon. O sentimento de traição que ele nutria sozinho tornou-se uma obsessão e, na qualidade de cônjuge dela, ele guardou todos os pertences dela. Até mesmo as cinzas de sua mãe.
Após a morte de sua mãe, o homem que abrigava ressentimento procurou aumentar sua influência. O homem sem sangue nobre queria se misturar com o mundo aristocrático mais do que qualquer outro. Eventualmente, ele até começou a usar a influência de Philip Gordon, a quem ele tanto desprezava e odiava.
Seu pai usou a culpa e o afeto de Philip Gordon por Ash e Sophia como meio de arranjar um casamento vantajoso. Quando ele encontrou uma conexão com o Marquês Frost através dos nobres que conhecia, ele chantageou Ash com termos ultrajantes.
O pai usou os sentimentos de culpa e afeição de Philip Gordon por Ash e Sophia como um meio para um casamento arranjado. Como ele encontrou um link para o Marquês Frost através dos nobres que conheceu, ele ameaçou Ash com condições surpreendentes.
Os termos de seu pai eram todos sobre sua mãe. Se ele se casasse com o nobre, o homem daria a seus avôs e Ash o que eles tanto queriam: as cinzas de sua mãe e sua antiga casa, que agora pertencia a seu pai.
Tendo-o conhecido nestas circunstâncias, Ash não achou que fosse possível amar Carlyle Frost. Ele realmente nunca pensou que o amaria tanto. Isto porque o amor que Ash experimentou, como sua mãe havia dito, se manifestou em um momento inesperado. Nunca pensei que me apaixonaria por alguém através de um encontro forçado como este… Não conseguia imaginar isso.
— Ash.
Ao ouvir seu nome, Ash desviou o olhar para frente para encontrar um homem com um terno impecavelmente feito sob medida. Um homem, que parecia perfeito só de olhar para ele, logo se tornaria seu ex-marido.
Ash piscou e colocou o oponente em seu campo de visão. A luz que iluminava a sala de estar, cobriu Carlyle. Misturando-se com a luz branca do sol, uma cor prata se espalhou sobre cabelos acinzentados de Carlyle.
Uma testa reta, um nariz escultural, sobrancelhas escuras que eram perfeitas em todos os sentidos e belos olhos cinzentos que mudavam de cor com a luz ao seu redor. Desde o primeiro momento em que pôs os olhos em Carlyle, parado no parque e esperando por ele, Ash soube que podia se sentir facilmente atraído por ele, sem considerar suas preferências.
Carlyle não era, por assim dizer, o tipo que Ash estava acostumado a encontrar. Ash amava os defeitos das pessoas, e achava adorável o atrito que eles causavam. No entanto, Carlyle não tinha nada além de uma aparência impecável. Às vezes, ele se perguntava se o homem era perfeito demais para ser um ser humano.
Sim, ele ainda é o mesmo.
Sem responder, Ash olhou fixamente para seu marido: o homem que seus olhos procuravam todos os dias. Ele se perguntava diversas vezes o que o homem estava pensando por trás daquele rosto inexpressivo. Será que ele está ressentido comigo? Carlyle poderia estar com raiva de mim por não tê-lo ouvido quando ele disse que não queria o divórcio?
O que quer que fosse, Ash desejava que Carlyle demonstrasse alguma emoção. Mas era como se não sentisse mais nada, com aquele rosto monótono.
— Ash, você está bem?
Ash, que estava imerso em pensamentos turbulentos, foi puxado para a superfície pelas palavras de Carlyle. Ele se aproximou e olhou para o marido. À primeira vista, eram semelhantes, mas, de perto, Carlyle era mais baixo do que ele. Era um dos aspectos do homem que Ash mais gostava.
A leve elevação de seu olhar era tão adorável, que Ash respirou fundo. Ele não podia acreditar que estava se divorciando daquela pessoa, apesar de ter tomado a decisão sozinho. Ele desejava poder retirar o que havia dito no dia anterior.
— Oh, sinto muito.
No entanto, ele não conseguiu abrir a boca quando olhou para a sala vazia onde Carlyle estava de costas para ele. Não se podia abalar. Ele já tinha tomado uma decisão. Ash deu um sorriso embaraçoso e tirou a franja do rosto. Apesar do fato de que os bens de Ash ainda permaneciam lá, a casa parecia particularmente vazia.
— Estou um pouco cansado.
Após pedir o divórcio, sua consciência ficou tão pesada, que ele não podia dizer que tinha conseguido dormir. Carlyle olhou fixamente para Ash ao dizer aquelas palavras. O silêncio ocupava o espaço entre eles. Carlyle não era um homem de muitas palavras e geralmente falava baixo daquele jeito.
Pergunto-me se é por isso que não podemos continuar.
Os pensamentos que há meses estavam rodeando a cabeça de Ash apareceram do nada. Ele só tinha dito a palavra “divórcio” porque estas perguntas continuavam a incomodá-lo. Não era que as coisas estivessem ruins entre eles. Eles nunca tinham brigado e Carlyle sempre atendera aos desejos de Ash. Onde viviam, como viviam, os passeios que faziam, o que dizia, e até mesmo os momentos em que faziam amor…….
E nada disso era o que Carlyle queria de verdade.
Apesar de ter perguntado muito sobre ele quando o conheceu, Ash não deu ouvidos ao que Carlyle queria durante um ano. Ash ainda não sabia o que ele realmente queria. Até se perguntava se havia algo que o homem desejava. A partir do momento em que se deu conta disso, as palavras de sua mãe começaram a circular por sua cabeça.
“Amar significa não impor seus próprios desejos. Mamãe descobriu isso muito.”
Sabendo como sua mãe havia terminado, Ash se perguntou em que ponto havia começado a agir como o pai. Temia não apenas parecer com o homem externamente, mas também ter herdado sua personalidade e imposto seu egoísmo sobre da pessoa que amava. O pensamento de que o fim de Carlyle poderia ser um infortúnio causado por ele persistia em sua mente…
Então ele decidiu se divorciar.
Carlyle não era de mostrar emoção, mas não conseguia escondê-las em um determinado momento. Ele se sentia esmagadoramente constrangido quando seus corpos se misturavam. Não era como se seu corpo não estivesse satisfeito. Ele estava claramente sentindo, mas parecia não aceitar aquele prazer e ficava confuso, sem saber como lidar com a situação.
Pensou que as coisas iriam melhorar com o tempo, mas estava errado. Durante as últimas semanas, toda vez que o sexo terminava, Carlyle acabava vomitando no banheiro.
Após perceber isso, não conseguiu nem sequer encostar a mão nele.
Uma pessoa que expressou rejeição ao próprio relacionamento desde o início.
Ele demonstrou sua desaprovação ao relacionamento em si desde o início. Afinal, ele era um homem que cresceu sem sequer pensar que um Alfa poderia se conectar a outro Alfa, e por extensão nunca conseguiu imaginar como as relações entre Alfas seriam conduzidas.
Será que não conversamos o suficiente?
Não te disse como é bom, que não é estranho, ou o quanto me deixa louco toda vez que me abraça?
Nem houve tempo para isso. Durante o ato sexual, Carlyle ficava excitado demais para manter sua mente no lugar e, quando o sexo acabava, ele evitava ficar cara a cara com o parceiro.
Então, há apenas algumas semanas, ele exagerou. Com o passar do tempo, a distância só cresceu, em vez de ser preenchida. Para garantir que Carlyle não conseguisse se afastar e tomar banho sozinho depois do ato, Ash o abraçou até que ele perdesse a consciência. Segurando-o firmemente, enquanto o parceiro fechava os olhos e desmaiava, Ash sussurrou para ele algumas vezes.
Eu te amo.
Levou um tempo para reconhecer plenamente seus sentimentos. Sentia que, quanto mais os dias passavam, mais se apaixonava por ele… mas seu fogo emocional atingiu o ponto mais alto após meio ano juntos. Nem mesmo o próprio Ash imaginava que a relação, que começou como uma tentativa de assumir uma responsabilidade, acabaria se tornando tão sincera.
Acabei me casando com alguém que amava, o que foi uma coisa boa… mas o problema era que essa pessoa não me amava. Na vida, aprendi que algumas pessoas não podem superar as diferenças de características e, infelizmente, esse era o caso de Carlyle Frost.
Ash percebeu que ele estava pensando demais, o que não era característico dele. Talvez a convivência com Carlyle o tenha mudado um pouco.
—….. Se você não se sente bem, chamarei seu médico.
Carlyle, que tinha ficado em silêncio perto de Ash, disse cautelosamente. As palavras que saíram de sua boca após pensar por um tempo pareciam preocupadas. Ash gostava da gentileza por trás daquele exterior frio, mas isso fez seu coração se sentir apertado. O homem parecia tranquilo demais para estar preocupado com Ash, e isso machucou seu coração mais uma vez.
— Não. É porque eu estou um pouco cansado. É culpa do trabalho. Eu não quero te incomodar, Lyle.
Tirou um tempo do trabalho porque não estava com disposição para trabalhar, mas não queria dizer. Afinal, Carlyle provavelmente seria o menos interessado nisso.
Quando aquele nome foi chamado, Carlyle hesitou. Parecia que ele queria dizer algo, então Ash fez contato visual e esperou. Enquanto observava Carlyle, esperando pacientemente, ele notou que algumas coisas haviam mudado.
Após uma inspeção mais atenta, notou que ele havia perdido algum peso recentemente. Seu queixo, que originalmente era mais robusto, tornou-se mais afilado e seus pulsos pareciam ter ficado um pouco mais finos do que antes. Carlyle geralmente cuidava de si mesmo, e seu médico costumava acompanhar meticulosamente cada mudança no corpo do homem. Mesmo assim, Ash se sentiu um tanto preocupado.
Quando pensou sobre isso, de repente se lembrou das costas de Carlyle, que vomitou no banheiro após fazer sexo com ele. Isso vinha acontecendo com muita frequência ultimamente. Após vê-lo reagir assim, mal conseguiu tocá-lo de novo. Seu coração afundou ao perceber que a dor que Carlyle sentia foi causada por ele. Testemunhar o homem que amava o rejeitar com todo o seu ser não era uma lembrança desagradável.
— Está faltando alguma coisa? Você pegou tudo?
Ash se virou. Ele escondeu sua expressão sombria e sorriu novamente.
— Parece que sim. Se…
Ash olhou para os lábios pálidos e finos enquanto se separavam. Ele tinha a sensação ridícula de querer beijar aqueles lábios quando eles estavam prestes a se abrir.
— Se eu deixar algo para trás, sinta-se livre jogá-lo fora.
Ash sentiu a distância entre eles quando lhe foi dito que invés de contactá-lo, deveria apenas jogar fora. Uma vez que eles preenchessem oficialmente os papéis do divórcio na próxima semana, os dois se tornariam apenas conhecidos. Eles se casaram no papel, mas a partir daí Ash não fara mais parte da vida de Carlyle.
— Como eu poderia simplesmente jogar fora as coisas do Lyle?
Não seria mais capaz de ver o lado oculto dele, que muitas vezes assumiu erroneamente que só era visível para ele. E com isso, Ash percebeu cultivar um hábito que ele precisava abandonar.
— Na verdade, é Carlyle, não Lyle. Sinto muito. Tornou-se um hábito.
Havia esquecido que o apelido bonito já não era mais uma palavra permitida para Ash.
— Eu vou tomar mais cuidado de agora em diante.
— Tudo bem.
Carlyle respondeu surpreendentemente rápido. Talvez ele não respondesse de forma áspera porque os dois ainda eram legalmente um casal.
— Você pode me chamar assim se quiser.
Foi uma sugestão amigável. Ash queria responder “sim” sem sequer pensar muito. Mas ele reprimiu sua ganância e balançou a cabeça.
— Se eu fizer disso um hábito e continuar te chamando assim na frente dos outros, a pessoa que o Carlyle encontra mais tarde não vai gostar disso.
Embora tenha dito isso a Carlyle, com uma pontinha de malícia, ele próprio acabou se sentindo ferido. Fosse Alfa ou Ômega isso não importava. Ele não suportava a ideia de alguém tocando o corpo de Carlyle. A mera suposição por si só era o suficiente para deixá-lo louco.
— Você é…
Carlyle abriu a boca, começou a falar e depois parou. Não houve mudança em sua expressão, mas seus feromônios estavam um pouco instáveis. Com o aspecto ligeiramente diferente de Carlyle, Ash prendeu a respiração.
Qualquer coisa está bem… Apenas expresse alguma coisa…
Não há problema em ficar chateado, tudo bem ficar com raiva… tudo bem se me chamar de idiota. Não faz mal me chamar de bastardo sem vergonha ou de filho da puta! Eu só queria ver outra coisa além… desse olhar. Não é que eu não goste do seu jeito inexpressivo. Apenas queria saber o que Carlyle está pensando.
— Você é sempre tão atencioso.
No entanto, a manhã tempestuosa que Ash esperava nunca apareceu. Carlyle murmurou essas palavras claramente depois desviou o olhar. Ash abriu a boca para perguntar qual era o significado oculto na frase, mas Carlyle o cortou.
— Conforme conversamos, a papelada será entregue após a festa de confraternização. Obrigado pela sua paciência.
A voz de Carlyle estava seca, como se ele estivesse falando de negócios. Lembrou de ter pensado que ele parecia uma pessoa difícil na primeira vez que o encontrou, mas vê-lo novamente assim um ano depois o fez se sentir estranho.
— … Não. Você não pode arruinar uma ocasião agendada a tanto tempo por minha causa. Sinto muito.
A celebração a que Carlyle se referiu era para seu irmão, Kyle Frost, e seu cônjuge, Nicholas White. A festa foi organizada pelo avô de Carlyle, Arthur Frost, para parabenizar o parceiro de Kyle, que acabara de dar à luz a gêmeos. Sendo um dos gêmeos um Alfa dominante, o Marquês Frost estava de bom humor ultimamente.
Ash não queria arruinar as coisas para Carlyle, que havia seguido as ordens de seu avô e casado com um Alfa. Ele estava certo de que o homem responsabilizaria Carlyle por isso também, pois ele costumava julgar as atitudes de Carlyle, que era perfeito em todos os sentidos.
— Eu estraguei tudo.
Ash culpou a si mesmo. O Marquês Frost repreenderia Carlyle pelo divórcio de qualquer maneira. Na medida do possível, ele tinha conseguido evitar que os dois se encontrassem após o casamento, mas a partir de agora seria incapaz de fazê-lo.
— Não, está tudo bem.
Carlyle balançou a cabeça. Então ele se virou.
— Então eu entro em contato com você através da secretária. Até.
Após terminar a conversa, Carlyle passou por Ash sem nenhum sinal de arrependimento. Não houve nenhum abraço ou beijo, como Ash havia solicitado quando se conheceram. O som dos sapatos ecoou no ar e depois cessou, sendo seguido pelo som de uma porta se fechando.
A alegria de poder vê-lo novamente e a tristeza de ter que o contactar apenas através da secretaria atingiram Ash simultaneamente. Tardiamente, seus dedos se contraíram. Ele seguiu Carlyle, que ainda não havia ido longe, e mal resistiu ao impulso de abraçá-lo.
Durante o ano passado, ele se acostumou a ser paciente. Ash Jones era um homem que sabia se expressar, mas viver com Carlyle lhe ensinou a fazer concessões: não insistindo que Carlyle o retornasse uma resposta quando ele dizia gostar do homem, resistindo ao impulso de abraçá-lo sem sequer tentar, fazer amor apenas durante o cio mesmo querendo tocá-lo a todo tempo sem se importar com os olhares das outras pessoas.
Carlyle havia passado um ano deixando sua marca em Ash desta maneira, mas ele sentia que não havia deixado nenhuma marca no homem que o deixava para trás.
Ash examinou lentamente o interior da sala depois que Carlyle saiu. Embora pudesse facilmente comprar uma mansão deslumbrante, Carlyle viveu ali atendendo um pedido de Ash. A modesta mansão na periferia de Notting Hill era onde sua mãe havia morado com seu pai, e mais tarde onde ela havia criado Ash e Natalie.
Estava entre os bens que seu pai havia prometido como garantia em troca do casamento arranjado, e Carlyle havia lhe ajudado a recuperá-la após ouvir falar sobre após o casamento. Era um lugar tão precioso e cheio de lembranças para ele, mas, no entanto, estranhamente não sentia nada disso agora.
É estranho. Lyle é uma pessoa tranquila, mas tinha a ilusão de que o lugar estava preenchido enquanto ele estava aqui.
Ash se moveu lentamente. Ele queria saber se Carlyle havia deixado alguma coisa para trás. Era ridículo tê-lo deixado e logo depois ir procurar rastros dele, mas foi irresistível. Ash Jones tinha decidido divorciar-se de Carlyle porque ele o amava demais, não porque não gostava mais do homem.
Ele olhou ao redor da casa, mas Carlyle, com sua natureza minuciosa não tinha deixado nada para trás. Não, ele deixou uma coisa. Os traços de Carlyle permearam toda a casa, cobrindo todos os anos que Ash passou aqui: os pratos que eles compartilharam, a cozinha onde ele estava, a porta por onde ele tinha entrado com seu casaco pendurado sobre seu braço, e o quarto onde seus feromônios permaneciam…
Entrou no quarto que eles compartilhavam e olhou pela janela. Lembrou que eles haviam falado sobre plantar flores juntos quando chegasse a primavera deste ano. Carlyle havia passado a última semana plantando videiras de rosas por todo o jardim para Ash. Enquanto olhava para as videiras com seus botões vermelhos se preparando para florescer, Ash cobriu o rosto com as mãos.
A ideia de ter que esquecer Carlyle o atormentava a ponto de deixá-lo louco.
***
O ser humano é, talvez, o animal mais estúpido de todos. Enquanto os animais se lembram do que não devem esquecer para sobreviver, os humanos podem repetir os mesmos erros uma e outra vez – até mesmo os mais fatais.
Como diabos eu pensava que minha vida daria certo?
Carlyle se repreendeu por sua estupidez enquanto examinava os pertences guardados no depósito da mansão. Ele parecia ter esquecido as lições que havia aprendido em sua infância durante o ano passado. O casamento tinha sido incomum e cheio de atritos desde o início, mas quanto mais convivia com o homem, mais ele percebia que Ash era perfeito para ele. Seu avô tinha razão.
A vida conjugal estava indo melhor do que o esperado e Carlyle muitas vezes pensava que seu casamento iria vingar. Tudo o que tinha imaginado quando conheceu a família de Ash se tornou real. Carlyle estava intoxicado com a alegria de ter algo que nunca sonhou que teria.
Isso o pegou desprevenido. Acreditando erroneamente que o casamento continuaria sem sobressaltos, Carlyle não se preparou adequadamente para aquilo. Ele deveria ter se preparado para um possível divórcio, embora estivesse cético sobre que tipo de precaução poderia ter tomado.
Carlyle refletiu sobre o que poderia ter feito. Para ser honesto, não havia nada. Ash sempre fazia o que queria: tinha a capacidade de fazê-lo. Ele se certificou de que nunca houvesse escassez de bens materiais. O mesmo se aplicava ao seu estilo de vida. Em primeiro lugar, Ash era uma pessoa muito atenciosa, portanto nunca impôs nada a Carlyle e, por causa disso, não tinham dificuldades de conciliar suas diferenças entre si. O fato da palavra divórcio ter saído da boca de uma pessoa assim é…
Carlyle parou de pensar, ao sentir o fôlego preso em sua garganta. Ele havia passado os últimos dois dias remoendo seus defeitos e isso foi o suficiente para lembrá-lo das coisas que ele havia esquecido por um tempo. Nada iria mudar, então ele poderia muito bem fazer o que tinha que fazer.
Há sempre muito a fazer, por isso o tempo vai passar rápido.
Pensando nisso, uma onda de cansaço se abateu sobre ele. Afinal, ele perdeu rapidamente o futuro que tinha pela frente. Carlyle iria continuar trabalhando, isso era garantido. Mas, como não iria assumir o nome da família, seria responsável apenas por uma pequena parte do negócio. Era uma tradição de gerações que o Alfa dominante assumiria o negócio da família. Logo, era natural que Kyle fosse o único responsável.
E depois…….
Vou me casar com um ômega? Ash estava certo. Seu avô muito provavelmente veria isso como uma boa oportunidade. As repreensões viriam, mas ele não ficaria chateado quando percebesse que estava matando dois coelhos com uma cajadada só.
No início detestei a ideia de ter que me casar com Ash. Achei extremamente incômodo ter que me casar com um Alfa, mas detestava ainda mais o fato de ter que passar pelo processo de conhecer um ômega e me casar novamente… odiava covardemente estar sob a pressão de ter um filho Alfa dominante.
Mas agora eu tenho que me preparar para isso. Só consegui evitar o inevitável até agora graças a generosidade de Ash.
Assim, Carlyle decidiu aceitar a situação difícil.
O problema é que, para fazer isso, vou ter que me livrar dos vestígios de Ash na minha barriga.
Ao mesmo tempo em que pensava isso, Carlyle ergueu a mão e levou até a barriga. Deslizou seus dedos e pressionou firmemente contra seu estômago firme, mas não sentiu nada.
°
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Continua…
Tradução: Rize
Revisão: MiMi
mariana
se existe alguém mais triste que eu essa pessoa n existe