Defina o relacionamento - Capítulo 77
No entanto, a pessoa que atacou Henry agarrou sua gola com uma das mãos e levantou o braço ameaçadoramente. Quando viu a sombra cobrindo seu rosto, ele fechou os olhos com um som um gemido em um reflexo de defesa. Contudo, o adversário não o atingiu novamente.
Parecia que ele estava segurando a raiva, porque os feromônios dele estavam agitados, refletindo a fúria que sentia. Respirando fundo, o homem soltou a gola de Henry e se levantou devagar.
Carlyle reconheceu quem ele era imediatamente. Era o mesmo marido carinhoso que havia feito chá pra ele de manhã, ele estava vestido com uma camisa azul e uma calça branca de algodão.
O homem à sua frente usava as mesmas roupas que Ash vestia pela manhã. Embora a cor estivesse escurecida pela chuva, era a roupa de Ash.
—Ash.
Carlyle o chamou, surpreso com os feromônios de Ash, que estavam afiados como espinhos. Mas ele também sabia que provavelmente seus próprios feromônios não seriam muito diferentes dos de Ash.
A razão pela qual Carlyle estava surpreso não era porque ele parecia ameaçador, mas porque era a primeira vez que via seu marido com tanta raiva. O homem gentil que sempre parecia calmo e disposto a conversar, agora estava agitado e furioso, como uma fera.
Ash, respirando pesadamente, virou a parte superior do corpo ao ouvir o chamado de Carlyle. Suas pupilas contraídas e as sobrancelhas franzidas de raiva expressavam o que ele sentia. Ele, que estava com os dentes cerrados e ofegante, ao ver Carlyle, baixou o punho e abriu a boca.
—Desculpe por te mostrar uma cena tão feia.
Ash franziu a testa, como se estivesse confuso consigo mesmo. Ainda assim, como se não conseguisse se acalmar facilmente, ele soltou mais um suspiro áspero e levantou a mão para cobrir o rosto.
— Não queria que Bonbon me visse assim… Mas, ao ouvir o que esse homem disse, perdi completamente a razão. Me desculpe. Você deve ter ficado assustado.
Parecia que ele mesmo não acreditava no que havia feito, pois seu punho tremia levemente. Ash sempre foi alguém distante da violência, então, sem dúvida, estava muito abalado.
— Está tudo bem. Se agi como um animal, é justo ser tratado como um.
Carlyle segurou lentamente o punho trêmulo de Ash, que sem resistência, permitiu o toque e seguiu Carlyle quando este o puxou para longe de Henry. Do chão, Henry abriu os olhos vagarosamente.
Carlyle olhou para ele com um olhar frio e furioso. No momento em que Henry percebeu que a situação havia se acalmado e tentou falar, mas Carlyle agiu primeiro. Ele puxou Ash para trás de si e se aproximou de Henry, que ainda estava no chão. Então, quando Henry tentou apoiar a mão no chão para se levantar, ele silenciosamente pisou em seus dedos com o salto do sapato, um estalo baixo ecoou no piso.
— Argh! Carlyle, seu desgraçado…! Solta! Me solta…!
Enquanto Henry, com os dedos sendo esmagados, tentava puxar o braço em um movimento convulsivo, Carlyle inclinou-se para frente, colocando mais peso no sapato. Ele sussurrou baixinho, olhando diretamente nos olhos de Henry, distorcidos pela dor, de forma que apenas ele pudesse ouvir:
— Pense bem, Henry. Sabe por que o conde de Inverness veio até aqui pessoalmente? Seu pai veio até aqui, curvando a cabeça, para pagar as dívidas causadas por seus negócios patéticos e fracassados. Seria uma pena se a pessoa que causou todo esse problema acabasse piorando as coisas.
Sua voz era tão seca e impassível quanto sua expressão.
— Se você quer ver o sobrenome Inverness terminar com a geração do seu pai, então continue tagarelando à vontade. Você certamente pagará o preço.
Apenas as palavras murmuradas em tom baixo carregavam uma lâmina oculta. A ameaça, proferida com calma e margem para diversas interpretações, fez Henry fechar a boca. Seus olhos, tremendo de raiva, agora também refletiam medo e incerteza.
‘É assim que tem que ser.’
Todos já sabiam que o conde de Invernes andava por aí pedindo dinheiro emprestado. Se Henry Inverness quisesse continuar vivendo como um nobre despreocupado, teria que manter a boca fechada dali em diante.
— Se eu ouvir sobre o que aconteceu hoje saindo da boca de outra pessoa, esteja pronto para as consequências.
Após finalizar o aviso, Carlyle recuou. Lançou um olhar indiferente para os dedos inchados e vermelhos de Henry e fez um leve gesto com os olhos na direção dele.
O homem, que até então jazia pateticamente jogado no chão, permaneceu em silêncio por alguns instantes antes de, hesitante, começar a se erguer. Ele recuou alguns passos, observando Ash e Carlyle alternadamente, até que, por fim, soltou um xingamento e saiu em passos rápidos em direção ao portão. Sua figura desaparecendo na chuva parecia extremamente miserável.
Com a partida do filho do Conde, que, como um convidado indesejado, causou tumulto e depois desapareceu, um silêncio pairou no ar. Carlyle virou-se lentamente e encontrou os olhos de Ash, que estava atrás dele, de guarda. O rosto do homem parecia mais pálido do que o normal por causa de seus cabelos negros molhados pela chuva.
Isso só o fazia parecer ainda mais frágil e melancólico. A ponto de partir o seu coração.
— Você deve ter ficado muito chocado, Ash. Ele sempre foi desse jeito, então não precisa levar isso muito a sério. E, considerando a situação dele, não poderá tomar nenhuma atitude contra nós. Não precisa se preocupar.
Carlyle se apressou a se aproximar, estendendo a mão para segurar o punho cerrado de Ash. Agora que via de perto, percebeu que os nós dos seus dedos estavam feridos. Um machucado comum para alguém que socou outra pessoa pela primeira vez; atingir o osso da bochecha de forma errada poderia causar esse tipo de ferimento.
Ver o ferimento avermelhado fez seu peito apertar. Se sentiu mal por Ash estar naquela situação por sua causa e culpado por Bonbon ter ouvido aquelas palavras crueis.
‘Tudo isso foi por minha inadequação…’
— Lyle não vai me dizer que acha que isso tudo aconteceu por sua causa, certo? Não pode pensar assim.
A voz de Ash cortou seus pensamentos, como se tivesse lido sua mente.
Quando Carlyle ergueu os olhos, viu Ash o observando com uma expressão dolorida. Seus olhos azuis e cinza estavam úmidos, os cantos avermelhados denunciando que, sim, ele estava chorando.
— Lyle não fez nada de errado. Fui eu quem foi ganancioso. Um homem que não é um nobre, querendo se casar com você, e por isso ouvi essas coisas…
A voz de Ash começou a falhar e se tornou rouca. Um leve soluço se misturou com sua respiração. Ele parecia genuinamente angustiado. Seus olhos, tingidos de culpa, estavam uma bagunça.
— Ash…
Carlyle rapidamente cobriu as bochechas dele com as duas mãos.
Ele não conseguia ficar parado assistindo a pessoa que sempre o consolava com tanto carinho chorar. Seu coração estava se partindo em mil pedaços. Sentiu como se o chão estivesse caindo sob seus pés. Parecia que o mundo de Carlyle estava desmoronando.
— Você sabe que isso foi culpa do Henry Invernes. Nem você, nem eu fizemos nada de errado.
Em outra situação, Ash teria dito aquelas mesmas palavras para ele. Dizer isso agora, com a própria voz, soou estranho, mas Carlyle sentiu que finalmente entendia como Ash se sentia ao tentar confortá-lo.
— Eu sei. Eu sei disso, mas…
Agora que estava no lugar de Ash, Carlyle finalmente entendeu o que precisava fazer.
— Me irrita o fato de eu ter te deixado sozinho para ouvir aquelas coisas. Me irrita porque a culpa é minha. Eu não precisava ter saído para buscar aqueles figos. Podia ter esperado. Mas eu saí, te deixei sozinho, e…
Antes que ele pudesse continuar se culpando, Carlyle o interrompeu exatamente da maneira que Ash sempre fazia.
— Você fez isso por mim.
Carlyle sussurrou calmamente. Suas palavras, suaves mas claras, fizeram Ash piscar os cílios úmidos. Ash parou por um momento, parecendo surpreso, e então olhou para ele com uma expressão perdida.
— Bonbon ama coisas doces. Se Ash não tivesse ido buscar os figos hoje, ele teria devorado tudo que tinha em casa. Eu sei que Bonbon ficou muito feliz porque o papai trouxe algo gostoso. Quer sentir também?
Ao ouvir as palavras, Ash olhou para ele com uma expressão perdida. Seus belos olhos úmidos pareciam tão frágeis que agora era Carlyle quem precisava protegê-lo. Então, de repente, viu um sorriso. As palavras estúpidas de Henry Inverness desapareceram da sua mente como fumaça, deixando apenas uma única vontade: segurar Ash em seus braços e confortá-lo.
— Vai ficar tudo bem.
Carlyle segurou firmemente o dorso de sua mão que tremia levemente e, com um sorriso suave, colocou a mão de Ash sobre a barriga. Os dedos, que estavam cercados com força, hesitaram antes de relaxar completamente contra o tecido da camisa dele.
A palma de Ash estava quente.
O calor atravessou o tecido, aquecendo todo o seu corpo, afastando qualquer resquício da umidade fria da chuva. Não era só uma sensação – Carlyle realmente sentiu seu corpo ficar mais quente. Nem passou por sua cabeça a possibilidade de ficar resfriado.
Pela primeira vez em muito tempo, teve certeza.
Bonbon estava seguro.
A tensão que havia se enraizado no peito de Carlyle foi se desfazendo aos poucos, dissolvendo-se como neve ao sol. O calor da mão de Ash sobre sua barriga era reconfortante, quase como uma certeza silenciosa.
Ele entendia agora.
Sim, sempre existiria a possibilidade de que algo perigoso acontecesse. Não havia como negar essa realidade, assim como Archibald havia dito. Era um fato inegável. Seu corpo não era naturalmente feito para gerar uma criança, então os riscos sempre seriam um pouco maiores do que para os outros. Essa era a verdade.
Mas Bonbon ficaria bem.
Não era uma crença ingênua ou um otimismo sem fundamento. Ele sabia disso porque tanto ele quanto Ash estavam dispostos a proteger Bonbon com todas as forças.
Não importava o que acontecesse, eles estariam lá. Sempre.
Carlyle ainda seria cauteloso, claro. Ainda tomaria todos os cuidados possíveis. Mas algo dentro dele havia mudado – ele não precisava mais viver preso ao medo, carregando pequenas inseguranças como se fossem correntes invisíveis.
Eles estavam fazendo o melhor que podiam.
Ele e Ash.
— …Posso tocar? — A voz de Ash soou hesitante. — E se Bonbon estiver assustado por causa do que aconteceu mais cedo?
Carlyle balançou a cabeça suavemente.
— Bonbon sabe que papai quis protegê-lo. Eu senti isso, então tenho certeza de que ele também sentiu.
Ash mordeu o lábio. Seu olhar tremulava, cheio de uma hesitação dolorosa.
— …Lyle, você não está com medo de mim? Não começou a me odiar depois disso?
‘Ah… então era isso que ele temia.’
Carlyle percebeu naquele instante.
Assim como ele queria ser visto com bons olhos por Ash, Ash também era humano – e, como qualquer ser humano, também tinha medos, também se preocupava com o que Carlyle pensava dele.
Era algo tão óbvio que ele se culpou por não ter percebido antes.
Por um longo tempo, Ash lhe pareceu uma presença perfeita, inabalável. Mas agora, ao encontrar esse traço tão humano nele, sentiu como se tivesse encontrado um novo ponto em comum entre os dois.
E, ao invés de tristeza, tudo o que sentiu foi felicidade.
Ele sorriu.
— De jeito nenhum.
Como poderia sentir medo ou rejeição diante de alguém que, com cada gesto e cada palavra, mostrava o quanto o amava?
— Como eu poderia temer alguém que me ama tanto a ponto de me proteger assim? Não o que você faça, Ash. Aos meus olhos, você sempre será adorável.
Era algo que Ash costumava dizer a ele. Mas agora, Carlyle retribuía essas palavras com todo o seu coração.
Ash estremeceu levemente e, sem dizer nada, começou a acariciar sua barriga com um toque hesitante, quase reverente. A emoção em seu rosto era nítida, tão forte que ele mordeu o lábio para segurar as palavras que pareciam querer transbordar.
Carlyle sentiu o calor da palma dele se espalhar por sua pele e, sem perceber, um sorriso suave surgiu em seus lábios.
— Talvez seja só impressão minha… — Ash murmurou, quase sem fôlego — mas acho que Bonbon se mexeu.
— Não é impressão. Sempre que você está por perto, ele reage.
Os olhos de Ash se arregalaram um pouco.
— Sério?
— Sim. Acho que ele percebe o quanto eu fico feliz quando olho para você.
Ash, que até então estava inclinado para observar a barriga de Carlyle, ergueu o rosto, surpreso. Uma gota de chuva deslizou por seu queixo e escorreu até o pescoço, dando-lhe uma aparência frágil, quase melancólica.
Carlyle sentiu algo se apertar dentro dele ao ver seu amado assim. Sem pensar duas vezes, segurou a mão de Ash, que ainda estava sobre sua barriga, e apertou com firmeza. Então, puxou-a levemente, trazendo-o para mais perto.
— Há algo que eu quero te dizer… Posso?
Não parecia o momento ideal para isso, não depois de tudo o que havia acontecido. Mas Carlyle não queria esperar mais. Queria dizer a Ash agora.
Ash piscou e, depois de um instante, assentiu.
— …Sim, eu quero ouvir
Seus olhos estavam cheios de ternura, e Carlyle retribuiu seu olhar com a mesma intensidade. Dessa vez, não havia mais hesitação. Ele disse o que precisava dizer com toda a convicção que carregava no coração.
— Eu te amo.
Mesmo depois de terem confirmado os sentimentos um pelo outro, Carlyle nunca foi tão expressivo quanto Ash ao demonstrar afeto. Sempre que o desejo de dizer algo doce surgia, ele acabava se sentindo envergonhado demais para colocar em palavras. Talvez, no fundo, tenha achado que expressões tão diretas de amor não combinavam com ele.
Mas isso não importava mais.
Porque ele sabia, sem sombra de dúvida, que Ash sentia o mesmo.
Assim como seu amor por Ash não mudaria, independentemente do que ele fizesse, Ash também o olhava com o mesmo sentimento imutável.
Carlyle, que normalmente desviaria o olhar em um momento como esse, agora sustentava o contato visual sem hesitação. Ele pronunciou aquelas palavras com firmeza, sem um traço de insegurança.
Ash apertou os lábios, seu olhar tremia de emoção. Ele fechou os olhos por um instante, como se tentasse conter os sentimentos que ameaçavam transbordar. Quando voltou a abri-los, sua voz veio baixa, quase um sussurro.
— Lyle sabe exatamente como me confortar.
— Acho que aprendi com um excelente professor.
Ash soltou uma risada entrecortada por uma leve rouquidão, como se ainda estivesse segurando as lágrimas. Então, respirou fundo e olhou para Carlyle com uma intensidade esmagadora.
— Eu te amo, Lyle. Te amo tanto que poderia fazer qualquer loucura por você.
Os olhos de Ash queimavam de paixão, cheios de um desejo quase avassalador. A mera visão daquele olhar fez Carlyle sentir um calor conhecido renascer dentro de si, crescendo como uma chama.
Ele queria sentir Ash. Queria ter certeza de que Ash era seu, de todas as formas possíveis.
— Então… posso te beijar?
Dessa vez, ele não ignorou o desejo que se agitava dentro dele. Não o reprimiu nem tentou se convencer a esperar. Apenas olhou nos olhos de Ash e perguntou.
Ash, com os cílios escuros molhados pela chuva, piscou rapidamente e, antes que Carlyle terminasse de falar, agarrou suas bochechas com as mãos. Segurando as bochechas do outro com ambas as mãos, ele inclinou a cabeça. Seus narizes se tocaram e em seguida, seus lábios quentes e ardentes se encontraram.
A boca de Ash estava quente, queimando em contraste com a chuva fria que ainda caía sobre eles. Carlyle separou os lábios instintivamente, puxando-o mais para perto, e sentiu os dedos do homem apertarem seu rosto com mais força. Suas mãos deslizaram para a cintura de Ash, agarrando o tecido encharcado de sua camisa. E então, sem aviso, a língua de Ash se infiltrou entre seus lábios.
Um suspiro entrecortado escapou dos lábios dos dois, perdido entre os beijos quentes. O ar entre eles estava carregado, denso, e o som abafado da chuva se misturava ao barulho das gotas escorrendo por suas peles.
Era viciante.
Era como se eles estivessem esperando por isso há tempo demais.
Eles engoliram a respiração um do outro, sem se importar com o estado deplorável de suas roupas encharcadas, como se se perguntassem por que haviam resistido a um ato tão sublime por tanto tempo.
***
O beijo se prolongou.
Até que a camisa, que antes só estava molhada nos ombros, ficou encharcada a ponto de revelar a pele.
Foi Ash quem finalmente recuou, interrompendo o contato. Quando as gotas de chuva, que começaram a cair mais intensamente, molharam o cabelo de Carlyle, Ash o envolveu completamente em seus braços e sussurrou:
— Precisamos entrar. Você não pode ficar resfriado.
Se era Ash quem estava dizendo isso, então era a verdade absoluta.
Carlyle apenas assentiu em silêncio. Os dedos de Ash deslizaram até os seus, entrelaçando-os com firmeza. O calor de suas mãos unidas espantou qualquer traço de frio.
Quando finalmente entraram na mansão, encharcados da cabeça aos pés, o chão de mármore ficou marcado com pegadas molhadas. O som das gotas de água caindo, “ploft, ploft”, ecoou suavemente pelo corredor vazio.
°
°
Continua…