Da Terra ao Céu - Capítulo 26
Suas pálpebras estavam incrivelmente pesadas. Mal tinha aberto os olhos quando notou que o movimento ao seu redor era mais lento que o normal. Na verdade, precisou de mais tempo que o necessário para averiguar onde estava e como estava devido à escuridão e ainda assim, tinha que admitir que o cenário do cômodo ao seu redor era desconhecido demais para seu gosto.
Noah negou com a cabeça e repassou a primeira lembrança que lhe veio à mente. O momento em que entrou no caminhão que Sasha preparou para ser um lugar onde pudesse hackear.
O calor do cio, que começou enquanto se preparava para o trabalho, estendeu-se mais rápido do que o esperado. Recordava que, de alguma forma, conseguiu fazer justamente o que queria com o plano de Sasha. Mesmo que suas mãos tremessem e sua mente estivesse nublada, pôde terminar com o programa deixando os olhos bem abertos. Mas, depois disso e após confirmar que o míssil estava fora de trajetória, percebeu que na verdade, a porta estava trancada. Lembrava de seus gritos por ajuda, assim como as memórias sobre olhar ao redor tentando fazer algo com a bomba, encheram sua mente lentamente. Naquele momento, pensou que ia morrer. Não sobrava muito tempo até o caminhão explodir e era difícil controlar o calor do ciclo o suficiente para manejar as coisas de forma adequada. Tudo que aconteceu depois disso estava um pouco apagado.
Mas agora, ele está vivo e bem.
Talvez foi Sasha quem o tirou daquele local porque a sensação de que alguém o segurava e corria pelo deserto como um completo louco ainda estava muito vívida em cada parte de seus braços. Sem mencionar que esse homem o conduziu o tempo todo mordendo os lábios.
Mas, bem, nesse momento sua cabeça estava tonta e confusa, era difícil saber se era um sonho ou realidade. No entanto, seu coração dizia que não era um sonho afogar-se em seus lábios ou dizer seu nome sob ele repetidas vezes. Seu corpo pesado e o formigamento da dor que sentia dentro de sua bunda demonstraram que todas as cenas desconhecidas piscando em sua mente eram verdadeiras, então…
— Ai meu Deus…!
Noah negou com a cabeça e logo suspirou. Notou que aquele não era o quarto que Sasha lhe deu quando o levou para sua casa. Ainda que Sasha não estivesse em lugar nenhum, estava claro que este era seu quarto. Estava coberto por seu cheiro!!!
—Devo estar realmente louco.
Em um instante, suas bochechas e sua testa esquentaram até o infinito. Sequer podia adivinhar quantos dias ficou agarrado à Sasha ou por quantas horas. E, claro, já que a situação foi causada pelo cio, podia-se dizer que era inevitável para ele, porém, por que Sasha fez…? No que estava pensando? Qual era sua desculpa? Por que uma pessoa que disse que não voltaria a transar com ele, o abraçou? Era só porque queria ajudá-lo? Porque Noah suplicou? Pensando bem, lembrava de ter chorado, rogando por um abraço e desejando tanto que… Preferia esquecer isso, para ser franco.
Noah esfregou as bochechas com uma mão, mas ainda assim, estava vermelho pela vergonha, não sabia como conseguiria voltar ao normal. Agora, como iria enfrentar Sasha?
Tomando uma respiração profunda e culpando a si mesmo, obrigou-se a levantar da cama para ir embora dali.
— Ah, merda…
Quando tentou se mover, a dor se estendeu por todas as células de seu corpo até que fosse impossível parar de temer. Não havia um só lugar que não doesse, pulsasse ou escorresse, era como se o tivessem espancado brutalmente. E pensar em Sasha, que agiu mais como uma maldita besta endemoniada do que como um homem decente, supôs que o estado de seu corpo era bastante… “Aceitável” para ele.
Noah se sentou e refletiu sobre os eventos dos últimos dias, um por um. Logo, sacudiu a cabeça e continuou o que estava tentando fazer. Todavia, no instante em que entrou no banheiro, tirou a roupa e a jogou no cesto, ficou novamente surpreso por todas as marcas deixadas sobre ele. Havia um montão delas! Seu corpo estava um desastre com marcas de beijo, de dentes, marcas de dedos e chupões. Como Sasha podia deixá-lo marcado a esse ponto? Noah titubeou, moveu-se e finalmente recobrou os sentidos, entrando no chuveiro. Fingiu ignorar os arranhões em seu corpo e se enxaguou com bastante água quente. Após isso, saiu, vestiu uma camiseta e uma calça (que deviam ser de Sasha) e saiu sem secar o cabelo. Era um pouco ridículo caminhar estando tão destroçado, mas não se deteve nem uma vez.
Um momento atrás, seu estômago começou a rugir com muitíssima força. Pensou que era natural sentir fome, já que estava se agarrando com Sasha durante vários dias, presos em seu quarto e sem comer nada decente. Caminhou pelo corredor do segundo andar e observou ao redor do laboratório. O lugar onde passou as últimas semanas discutindo com Sasha, aprendendo sobre o programa de hack e queixando-se sem parar, agora estava completamente vazio. Enquanto observava, o momento em que esteve sentado ali amarrando o cabelo uma semana atrás, sentiu como se tivesse ocorrido há muito, muito tempo.
E obviamente, naquele momento, nunca sonhou que juntaria seu corpo com o de Sasha assim, tão casualmente.
Noah esfregou as bochechas pela segunda vez e se apressou para descer até o primeiro andar da mansão. Porém, para sua desgraça, Sasha não podia ser visto em nenhuma parte. Nem na sala de estar, no hall ou na cozinha. Pensou que encontraria Sasha se desse uma olhada por aí, mas quando não pôde encontrar sequer um fio de cabelo, estranhamente perdeu sua energia e se sentiu como se não tivesse outra opção senão se acostumar a estar sem ele por um momentinho.
Foi até a cozinha, pegou um pouco de leite e começou a beber. Estava ansioso para comer um desses “pratos estranhos” que Sasha preparava quando queria fazer algo especial para ele, mas desde que se deu conta que ele não estava na mansão, seu apetite só… Desapareceu. Foi estranho. Só bebeu leite, mas já não queria comer mais nada.
Depois de esvaziar o copo, Noah saiu de novo. Não havia nada para fazer, o que era meio deprimente. Mais ainda porque não tinha nenhum programa de hack em que pudesse passar seu tempo livre ou um livro que pudesse ler. De repente, se deu conta de que talvez já tivesse chegado o momento de deixar este lugar. Quer dizer, o trabalho estava feito e o cio terminou, então já não havia razão para ficar na mansão por mais tempo.
— Não parece ser necessário que eu fique…
Noah murmurou isso, coçou a cabeça e girou para voltar para o seu quarto no segundo andar. Mas, neste momento de repente, uma grande porta dupla chamou sua atenção: Era a pequena sala de concertos que encontrou quando chegou na mansão pela primeira vez. Dentro havia um piano de cauda Steinway e precisava admitir que esta era uma “recompensa divertida” por hackear, conquistada com cada um de seus méritos. Acabou esquecendo porque estava muito ocupado e basicamente, o tempo para tocá-lo tinha escapado.
— Foi uma perda total.
Noah grunhiu e abriu a porta.
Conteve a respiração por um momento, encarou o piano, logo se aproximou um pouco e se sentou.
Primeiro, massageou suavemente suas mãos. Quando seus dedos esquentaram um pouco, abriu o teclado e passou a ponta dos dedos por cada uma das teclas pretas e brancas. Um som claro e doce escapou, uma melodia que deslumbrava os ouvidos mesmo que não conhecesse nada sobre música. E como se estivesse possuído por isso, Noah estendeu as pontas dos dedos e começou a pressioná-las aqui e acolá, até produzir belas notas. Pressionou as teclas durante muito tempo para que coincidisse com o que queria, então moveu suas mãos suavemente à direita e deixou que a melodia lenta mas pesada, ressoasse em todo o salão. Era a canção que melhor se adaptava a este momento, quando todo o lugar estava escuro e silencioso. O primeiro movimento da sonata Moonlight de Beethoven, era uma peça com cerca de cinco minutos e por esse breve instante, todo o ambiente parecer ficar verdadeiramente coberto pela luz da lua.
Noah imaginou a luz enquanto movimentava suavemente seus dedos, como se a acariciasse. Como se naquele quarto, sem janelas ou cortinas, a lua sonolenta iluminasse cada uma das paredes e todo o piso. Finalmente, quando terminou a sonata, a de Noah mais que a de Beethoven, seus dedos também pararam de se mover.
Noah sentou-se ali por um instante para recuperar a respiração e assim, sentiu que não queria tocar outra canção ou ficar ali por mais tempo, então simplesmente baixou a tampa do teclado.
— Eu acho que é lindo.
Um som grave veio detrás dele, soando como a lânguida melodia de “Moonlight”. Seus ombros enrijeceram, virou-se e observou Sasha aproximando-se em direção a ele com passadas extremamente lentas. Estava vestido comodamente, com uma calça de algodão e camisa branca. Não parecia alguém que estava fora por trabalho, levando-o a se perguntar onde ele estava metido para ter um aspecto tão bom… Tão bonito. Porém, o que desejava dizer não saiu tão facilmente, porque seus lábios pareciam estar colocados com saliva.
— Você deveria ser um pianista. Imagino as pessoas do mundo todo se reunindo para escutar sua música e… Você não se arrepende de não ter lutado por isso mais um pouco?
Sasha fez uma pergunta a Noah que, sem perceber, estava com as costas tensas outra vez. Era como se nada tivesse acontecido entre eles nos últimos dias e de alguma forma, fez parecer como se tivessem regressado ao momento antes de partirem para o Novo México para o teste de mísseis.
— O que eu faria com o arrependimento?
Noah também perguntou. Então, lentamente, desviou o olhar e observou o piano como se desejasse ver o próprio reflexo na superfície lisa e negra. Os Ômegas e os Alfas sempre foram proeminentes no campo das artes. Especialmente os Ômegas. Seu sentido inato era particularmente delicado e bonito. Preciso, em partes. Se não tivesse parado de tocar piano, como disse Sasha, agora poderia estar em um cenário nacional ou até mesmo mundial. Quando era jovem, estava seguro de que seria assim. Acreditava firmemente em seu talento e sonhava em atuar frente a muitas pessoas. O foco de atenção no palco e os aplausos do público às vezes apareciam em seus sonhos, porém, não era divertido lembrar e se arrepender de tudo o que havia deixado para trás.
— Nada muda se você se arrepender. E eu realmente não gosto de pessoas. Provavelmente nem consiguiria subir no palco para me apresentar.
A ponta de sua língua estava seca, ainda que falasse como se não se importasse em absoluto. Sasha se aproximou:
— Há alguma razão pela qual você parou de tocar piano?
Essa voz perfurou a esquina mais baixa de seu peito. Noah não encarou Sasha de jeito nenhum, ao invés disso, observou seu próprio reflexo no piano.
— Eu…
Era algo que ninguém sabia, com exceção da sua família. Não falar sobre isso, mas agora o interior de seu coração estava um pouco cambaleante e decidido. Semelhante ao um sentimento estranho que lhe dizia que podia contar tudo à Sasha.
Pela primeira vez, desejava ser honesto e consolado por alguém.
— Não é uma história divertida.
— Não me importa.
Sasha insistiu, estendendo a mão e acariciando suavemente o cabelo de Noah. Era uma mão infinitamente amável, então não foi estranho deixar que um pequeno suspiro escapasse. Como era possível que a temperatura de seu corpo fosse tão perfeita e reconfortante ao mesmo tempo?
— Você deve saber que eu me especializei em música, certo?
— Sei que você estudou em uma universidade famosa na Itália.
Claro que não tinha como alguém que possuía as habilidades de romper qualquer método de segurança e se quisesse, hackeá-lo, não filtrar informações sobre ele em menos de um minuto. Assim como havia encontrado tudo sobre Sasha, ele também deveria tê-lo feito em um momento em que estivesse entediado. Noah riu e encolheu os ombros.
— Houve um tempo em que sonhava em ser músico profissional. Então, escolhi o piano como minha especialidade. Quando estava na universidade, meus pais me presentearam com um piano Steinway e… No entanto, ser um ômega foi um obstáculo em toda parte.
Quanto mais pensava sobre isso, mais triste ficava. Em qualquer momento, em qualquer lugar, até uma pessoa normal podia se tornar um cão raivoso quando inspirava seu feromônio. E obviamente, na universidade, os Alfas eram uma porcentagem muito mais alta comparada aos Ômegas ou aos Betas. Então, quando os alfas descobriam que havia um ômega dominante na instituição, atacavam os ômegas frequentemente, mesmo que estes tentassem se esconder.
Isso aconteceu quando Noah estava em seu segundo ano na universidade: Seu professor principal era um famoso pianista. Maldição! Ele era o melhor pianista do mundo todo! Noah estava maravilhado por sua presença e sua maneira tão particular de tocar piano, por isso quando viu que ele era um docente, imediatamente solicitou estudar com ele.
Cada vez que o via, seu coração batia com força e quando assistia as aulas na mesma classe, ficava incrivelmente nervoso e preocupado em agradá-lo. Inclusive, podia dizer honestamente que ele foi seu primeiro amor. Noah, quem nunca gostou de pessoas, estava apaixonado. Loucamente apaixonado. De fato, não estava interessado em confessar seus sentimentos imediatamente, porque, antes de tudo, estava feliz só por ter aulas ministradas por ele. Um pianista que respeitava e admirava. Era um Alfa, mas sempre foi conhecido por tratar os estudantes com muito respeito. Ademais, era uma pessoa que desfrutava de uma popularidade considerável porque possuía uma aparência atrativa (como todo alfa dominante), era solteiro e um músico e professor exitoso. Haviam inumeráveis pessoas que o desejavam. Despejavam interesse apaixonado sem distinção entre betas e ômegas e de vez em quando, alguns deles o estimulavam usando feromônios. Porém, o professor não aceitava ninguém. Sua popularidade disparou devido a sua atitude de não tocar os Ômegas e apesar de ele ser um Alfa dominante, Noah sempre se sentiu aliviado com ele. Como se estivesse a salvo.
Ou, pelo menos, isso pensou.
Quando estava a ponto de passar para seu terceiro ano, seu avô, Vincenzo, convidou o professor para sua casa no intuito de que fosse o professor privado de Noah. Na verdade, podia-se dizer que fez isso sob a pressão de seu neto. Estava encantado com a ideia de receber orientação pessoal da parte dele e sempre esperava pelo tempo que teriam juntos. E se ele tivesse pedido cortesmente para ter um encontro com Noah? Mesmo após o tempo passar, às vezes pensava em coisas assim. Estava muito apaixonado e sequer ele, que odiava os Alfas, rechaçaria estar ao seu lado e formalizar uma possível relação. Responderia que sim todas as vezes do mundo! Sua família iria objetar pela diferença de idade, mas o apoiariam no final.
Claro, não tinha certeza porque na realidade, nunca fez essa pergunta. Em seu lugar, ele lhe entregou um café com pílulas que comprou pela internet.
Era uma droga que provocava uma reação similar ao ciclo de cio.
Então, abraçou Noah, que caiu devido à febre durante a aula, e o fez chocar-se contra as teclas do piano.
Crack!
O teclado fez um ruído forte por sua causa.
Seus olhos estavam nublados.
Antes que pudesse descobrir o que estava acontecendo, ele derramou seus feromônios alfa e provocou que sua temperatura subisse para a cabeça. Quando finalmente ficou coberto pelo seu aroma, ele o virou e abaixou sua roupa bruscamente.
— O aroma dos seus feromônios é delicioso. Noah, quem você pensa que é para soltar isso tão descaradamente?
O professor o repreendeu como se fosse culpa de Noah. Logo, aproximou o nariz de sua nuca e começou a fazer um ruído que parecia ser de puro prazer.
Queria se afastar dele, mas quando Noah se retorceu de novo, o professor afastou sua mão, arrancou sua cueca e abriu suas pernas.
— Não quero…
— Claro que quer, você sempre me desejou. Na verdade, o que eu estava buscando desde o princípio era um Ômega dominante como você porque pode dar a luz ao meu sucessor. Um alfa. Certamente, você é o único capaz de produzir as características de um alfa e fazer com que ele seja dominante também.
Colocou os lábios em sua nuca e sorriu suavemente. Foi quando ele se deu conta do que estava a ponto de acontecer. Queria estuprá-lo em sua própria casa, em seu próprio piano. Desde o princípio aceitou as aulas particulares com essa intenção e sequer estava se esforçando para ser amável. O processo de construir uma relação mediante o intercâmbio de sentimentos era um incômodo porque ele não queria ser namorado ou seu marido. Seria o bastante estuprá-lo e marcá-lo à força. Uma vez que o marcasse, inevitavelmente Noah iria pertencer a ele.
Era o que destino, dizia. Para ele, um dominante, um Ômega era só um útero.
Noah cerrou os dentes e tentou afastá-lo, mas suas extremidades tremiam e não podia se mover com facilidade. Havia uma grande diferença de poder com os Alfas dominantes. O professor o colocou sobre o piano, colocou o pau para fora e o esfregou na parte interna da coxa de Noah. A sensação de tocar sua pele era aterrorizante e se sentiu pior porque amava ele. O amava e o seguiu por muito tempo. Foi trágico vê-lo fazer isso quando confiou totalmente nele. Estava indefeso, desiludido e se sentia um completo estúpido.
Foi sua culpa. Foi o resultado de confiar nas pessoas e dizer a todos que era um Ômega.
— Eu… Definitivamente te matarei! Cortarei o seu pau e jogarei para os cães!
Noah chorou e gritou, com os olhos bem abertos. Suas bochechas ardiam pelo calor, mas o professor apenas desabotoou a camisa tranquilamente e voltou a abrir a boca:
— Vai ser diferente a partir do momento que estiver atado a mim. Um Ômega é assim, não importa se é dominante. Você não tem escolha a não ser destruído por meus feromônios e se sobrar diante do meu poder. Além do mais, se lembra, você me ama. Deveria se sentir no céu.
Ele deu uns tapinhas na bochecha de Noah, e logo sorriu maliciosamente, agarrou sua coxa e a separou uma vez mais. O ar atingiu o interior de sua virilha e lhe deu arrepios, então ele gritou:
— Mexa-se! Realmente vou te matar! Eu realmente vou… Ah!
Noah lutou, gritando o mais alto que podia. Mas ele cobriu sua boca com a palma da mão e franziu a testa.
— Mesmo que o isolamento acústico seja bom, será irritante se continuar gritando assim.
A mão, que antes havia pensado ser longa e elegante, pressionou com força contra sua boca até deixá-lo sem respirar.
Lágrimas caíram até sufocá-lo.
Estava tremendo, destruído e humilhado como nunca jamais pensou que estaria.
E nesse momento.
— O que você está fazendo…?
De repente, uma voz lenta e aguda ressoou de longe. Foi uma única frase, com grande poder e aterrorizante o suficiente para deter o professor que estava tentando estuprá-lo. Noah voltou os olhos cheios de lágrimas e notou que diante da porta entreaberta, seu primo Félix, com quem sempre estava brigando, estava parado com os punhos cerrados e trêmulos.
Não gostava que Félix chegasse repentinamente, mas neste momento, parecia mais feliz do que ninguém ao vê-lo ali. Se pudesse, desejaria correr e abraçá-lo com força, mas o professor endireitou os ombros, perplexo com a aparição inesperada de Félix e o puxou com ele.
— O que importa a você?
O professor gritou, mas na verdade ele estava gaguejando. Ele deve ter ficado aliviado porque ninguém os estava incomodando, mas, do nada, Felix chegou. E, além disso, seu feromônio já estava se espalhando por todas as direções até que o atingiu no nariz. E não havia forma de que não soubesse que era um Dominante!
— Noah, você também acha que é algo que não me importa?
Félix, que olhava em silêncio para o professor, perguntou, agora olhando para o menino que estava semi nu contra o piano. Ele balançou a cabeça vigorosamente, com as mãos do homem pressionadas contra sua boca e suas pupilas pareciam estar dizendo: “Se você for embora, eu vou te matar também.” Então, Félix interrompeu com um sorriso no rosto:
— Que tipo de bastardo estúpido se atreve a vir e perturbar minha família?
O feromônio cheio de furia de Félix derramou sobre o professor em um instante. Afinal, o homem era mais forte do que um alfa dominante comum e fez o professor tremer e cambalear devido ao seu feromônio. Tinha os olhos bem abertos e trêmulos, e então, quando ele se moveu um pouco para a direita e baixou a mão, Noah se soltou e deixou cair a pesada tampa do piano contra seus dedos. Bang!
Os gritos ásperos do professor encheram a sala, e ainda assim Noah não parou imediatamente, em vez disso, levantou e baixou a tampa em sucessão. Uma e outra vez, uma e outra vez, mais e mais. E toda vez que ele a deixava cair, enquanto o segurava para que não fugisse, ouvia o som de ossos quebrando como nozes. Como pianista, sabia muito bem que suas mãos eram sua vida, então ele cerrou os dentes quando viu como o professor revirou os olhos e parecia prestes a desmaiar. No entanto, Noah, cujos olhos estavam cheios de raiva, não se deu conta que ele não estava mais consciente. Gritava como um louco e continuou destruindo suas mãos com todas as suas forças. No final, foi esmagado de tal ponto que nem sua forma nem o início de um toco puderam ser reconhecidos.
Mas ainda assim, a raiva não diminuiu. Estava ressentido e destroçado e queria se vingar dele por brincar com o que ele sentia.
Noah, que se sentou no chão, como se também estivesse desmaiando, gemeu e deixou o feromônio do professor e o feromônio de Félix se misturar e sufocá-lo porque, por um segundo, ele sentiu que não havia sentido em continuar.
— Ei…
Félix, que havia estado observando em silêncio Noah esmagar completamente a mão do professor, caminhou até a mancha de sangue que crescia no chão. Foi uma cena um tanto nojenta de se ver.
— Vem aqui, você pode se levantar?
— Obrigado por vir.
Pela primeira vez na vida, ele agradeceu ao seu primo do fundo do coração. Félix deu de ombros.
— Nada de obrigado. Você terá que pagar juros mais tarde.
Por alguma razão, seu coração inchou com essa palavra.
— Idiota… Você é um idiota.
— Vem aqui. Vem, peguei você.
Noah vomitou e logo começou a chorar enquanto limpava os cantos da boca com as costas da mão. Ao sentar-se contra ele, chorou e chorou pela primeira vez nos braços de seu primo. Era a primeira vez que lhe acontecia algo tão horrível, e estava honestamente irritado e assustado!
Enquanto fazia isso, prometeu a si mesmo que nunca mais seria tratado assim por ninguém. Além disso, prometeu nunca mais entregar seu coração a nenhum Alfa e nunca se deixar influenciar por ele.
Depois de chorar por muito tempo e quando finalmente conseguiu se sentir melhor, descobriu que Félix havia arrastado o professor pela casa até que restassem apenas as longas manchas de seu sangue e o vômito que ele cuspiu.
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— Depois disso, não pude tocar piano outra vez. Quando vejo um, penso naquela época e… sinto que posso ouvir as teclas sendo esmagadas sob meu corpo. Não posso tocar. Deveria… chamar isso de trauma?
Noah olhou para o piano, ainda com a tampa abaixada, e murmurou tudo isso.
— Quero dizer, aconteceu no meu piano favorito, com meu professor favorito. Eu o amava e… Ah, o sentimento de traição é indescritível. Acho que odeio os Alfas muito mais desde então, e sinto como se meu coração e estômago se remexerem só de olhar para as teclas. Nem sequer posso me aproximar.
— Ah…
Noah piscou ao ouvir a voz de Sasha:
— Por isso que você entrou em pânico quando eu te perguntei pela primeira vez.
Noah finalmente se lembrou do incidente. Talvez porque estava sentado em frente ao piano naquela vez, o rosto distorcido do professor, há muito tempo esquecido, de repente veio à mente. Ele teve um breve momento de pânico e suas pernas vacilaram e tremeram como se fosse cair. Foi um momento em que ele não teve escolha a não ser se apoiar nas costas de Sasha para poder respirar. Claro, culpou a anemia e achou que Sasha havia acreditado. Mas ele já sabia tudo sobre a sua condição desde aquela época? Sabia que estava mentindo?
— Então, o que aconteceu com ele?
Sasha perguntou isso em voz baixa e Noah finalmente recuperou os sentidos e engoliu um pouco da saliva que havia acumulado.
— Não sei.
Ele não havia escutado nada sobre o professor desde aquele dia. E a verdade era que não se importava muito com o que acontecesse com ele.
— Provavelmente está morto. Ouvi dizer que o levaram ao hospital, mas meu avô descobriu depois, então… Você sabe, ele cuidou disso.
— Entendo.
— Como ninguém viu o professor desde então, deve ter matado e enterrado ele em um lugar remoto.
Noah disse isso com um rosto indiferente.
— Me alegra muito. Espero que tenha demorado a morrer.
Sasha também deu de ombros, então Noah olhou para ele e balançou a cabeça. Uma pessoa normal ficaria assustada com isso, mas Sasha aceitou com indiferença, como uma criatura estranha.
— Sempre fico surpreso quando você reage assim.
— Sou uma caixa de surpresas. — Sasha apenas respondeu com indiferença às palavras que lhe foram jogadas. Foi quase como uma brincadeira. — Então é por isso que você parou de tocar piano e começou a trabalhar com computadores.
Noah assentiu.
— Queria me livrar de tudo isso, fugir e me esconder. Então os computadores apareceram na minha frente e me salvaram. Acho que foram meu segundo amor.
Noah disse isso levemente, como uma piada. Mas Sasha olhou para Noah com uma expressão firme no rosto, sem sorrir e sem dizer nada. Envergonhado por sua reação, Noah deu de ombros.
— É uma forma de se comunicar.
— Bom, mas mesmo com tudo isso, é incrível que você possa realizar um recital em nível profissional.
— Haha, é que depois de um tempo desde que deixei o piano, pratiquei com um piano elétrico. É algo que ninguém sabe.
— Porque não?
Quando perguntado do por que não contou a sua família, Noah pensou por um momento como era complicado. Embora o avô, seus pais e Félix certamente ficariam felizes em ver que ele podia voltar a tocar piano.
— Todos pensam que sou magnífico, mas estou um pouco envergonhado. Faz muito tempo desde que toquei um Steinway, mas… eu o quebrei em pedaços, mesmo que meus pais tenham me dado como presente de entrada na faculdade.
Era aterrorizante estar junto a ele, e toda vez que o olhava, estremecia com a imagem de estar indefeso em cima das teclas. Chorava como um louco, então ele acabou fazendo a coisa mais sensata. Desde então, ninguém, nenhuma pessoa, mencionou a palavra “piano” na frente de Noah. E mesmo que ele estivesse confinado em casa como um eremita, ninguém realmente o julgava por passar o dia todo na frente do computador. É claro que, às vezes, ele pensava em como teria sido se tivesse tomado uma decisão mais corajosa e realizado seu sonho.
Se fosse uma pessoa forte, ele poderia ter triunfado. Mas não fez isso. Não pode. Poderia ser porque estava com o coração partido, ou poderia ser porque era mais fraco do que pensava ser.
— No entanto… eu ainda toco minhas mãos por hábito. Eu não gosto de me machucar. Eu nem sou mais um pianista, então é ridículo!
— Não é nada ridículo.
Noah olhou fixamente para Sasha enquanto ele dava uma resposta contundente. Ele não riu nem o olhou com pena. O observou como sempre.
— Foi graças a você que eu toquei um piano de verdade. Como te disse, costumo tocar um elétrico no meu tempo livre, com meus fones postos… Mas na verdade, nunca havia estado próximo de um piano de cauda. Passou muito tempo desde que vi um desses, assim que acho que foi incrivelmente agradável.
Se não tivesse encontrado um Steinway aqui, poderia ter vivido toda a sua vida sem tocá-lo novamente. Haveria estado assim, sem sequer sonhar em voltar a sentar-se frente às teclas.
— Você pode fazer o que quiser. Seja tocar um piano elétrico, um piano de verdade ou um piano em um jogo de celular. Você pode fazer o que quiser porque você é a pessoa mais habilidosa do planeta inteiro. Não acho que seja fraco. Você não está quebrado, e está sempre fazendo isso da melhor maneira que possível. Nisto e naquilo, já sabe. Você é o melhor hacker e se quiser, pode ser o melhor padeiro ou o melhor escritor ou o melhor chef do mundo.
Noah, sem saber, arregalou os olhos e olhou para ele.
— E não há necessidade de se culpar por ser um Ômega. Claro que não foi sua culpa. É só que o professor que você conheceu era um completo idiota. Você não teve sorte. Se esse bastardo ainda estivesse vivo, eu o teria encontrado e teria matado ele por você.
A voz calma de Sasha, que o olhava em silêncio, parecia particularmente doce. Noah sentiu que estava prestes a acariciar sua bochecha, então desviou o olhar o mais rápido que pôde. Por alguma razão, era difícil enfrentá-lo diretamente.
— Noah, não há outra pessoa que seja um Omega dominante tão bom quanto você. Você é perfeito, então faça o que quiser fazer e seja tão arrogante como sempre. Foda-se esse cara!
— Haha, eu não quero que ser arrogante seja a minha virtude.
Noah riu tristemente. O conforto que Sasha estava lhe dando fez cócegas no interior de seu peito, mas, como esperado, mesmo assim o riso não durou muito. Foi porque Sasha se inclinou e baixou a cabeça perto do rosto de Noah. E quando a distância entre os dois diminuiu, pararam de respirar sem se darem conta:
— E já que pode fazer o que quiser, se não gostar, me rejeite agora.
— O que…?
Antes que pudesse perguntar, os lábios de Sasha se sobrepuseram aos lábios entreabertos de Noah. O calor abrasador acariciou sua boca e nem sequer pareceu poder piscar ou falar para lhe dar uma chance de se acostumar com a ideia. Foi apenas um minuto ou muito menos que isso, mas as respirações de cada um se entrelaçaram e fizeram uma bagunça.
— Caso contrário, sentirei que você também me quer e vou continuar…
Seu coração disparou ao som da voz sussurrante de Sasha. Noah não pronunciou nem uma resposta porque estava olhando fixamente o rosto do homem que se aproximava dele novamente.
— Me responda.
Sasha sussurrou isso suavemente, segurando o cabelo de Noah em suas mãos.
— Por que…?
Noah perguntou isso como se estivesse muito confuso.
— Por que?
— Dissesse que odiava um homem tão fácil quanto eu, também disse que não era gay, você disse que nunca mais me tomaria e que eu era irritante.
Durante o ciclo do calor, ele pensou que quase o havia forçado a segurá-lo porque se agarrou a ele por culpa de desejo inútil. Mas, agora que todo o calor se havia ido e ele estava bem, Sasha o beijou sem hesitar e disse que o queria. Não conseguia entender o que estava acontecendo desta vez.
— …É injusto trazer uma história de três anos atrás para usar contra mim. Não use algo de semanas atrás também. Acredito que as pessoas podem mudar.
— Sério?
— Bem, eu realmente não gosto de homens, mas é você. E porque é você, quero te tocar e te abraçar o tempo todo. É porque é você que quero estar contigo e que desejo… Ser uma pessoa melhor para você.
Sem piscar, voltou a baixar a cabeça até um ponto em que a distância se reduzia o suficiente para que suas respirações se misturassem. Confuso, Noah instintivamente tentou jogar a cabeça para trás, mas as grandes mãos de Sasha seguraram suas costas e o mantiveram imóvel.
— Está tentando fugir porque você não gosta de mim? Não…sente nada por mim?
— …
— Responda-me e eu vou.
Sasha olhou diretamente a Noah, com os olhos um pouco escuros de tanto desejo. Parecia ser arrastado por esse olhar profundo, então, sem tirar a mão que ainda segurava sua nuca, o olhou se aproximando e o escutou pedir para responder se não gostava do que estavam fazendo. Noah engoliu mais uma vez e respondeu:
— Eu gosto…
Em vez de ficar chateado, ele estava ansioso para morder os lábios que estavam tão perto dos seus.
A boca de Sasha se ergueu em um belo arco, o escutou suspirar e, no momento seguinte, o homem lambeu seus lábios tão lentamente quanto a primeira vez. Meu Deus, foi um beijo incrivelmente doce. Um beijo que delineou seus lábios como se os saboreasse e que fez suas mãos ficarem sem forças. Escutou um som úmido, respirações quentes se misturando entre suas línguas apertadas e fazendo com que Sasha saboreasse sua boca o mais lentamente possível. Estava sem fôlego, trêmulo e definitivamente sem a menor lembrança de ter tido um beijo assim com alguém.
Toda vez que a língua de Sasha, que enchia sua boca, passava por seus dentes e o céu da boca, ele se esquecia de que precisava respirar pelo nariz e colocar força nas pernas. Desmoronou quando a língua dele envolveu-se ao redor da sua e então ele até se permitiu agarrar a camisa branca de Sasha em suas mãos para não cair.
— Que cara tão gostosa…
Sasha lambeu os lábios úmidos de Noah, logo moveu a boca por sua bochecha, queixo e pescoço, e por fim, terminou por beijá-lo em todas as direções. E ao contrário de suas palavras sensuais, a verdade era que se tratava de um movimento infinitamente suave e lento. Mas bem, era como sua maneira educada de pedir permissão para ir ainda mais longe.
Ele levantou a camisa folgada que ela estava vestindo e gentilmente acariciou seu corpo com a palma da mão. Ele tocou cada canto e fenda, como se quisesse gravá-lo com a ponta de seus dedos, e esfregou seus mamilos uma e outra vez para tentar estimulá-los. suas mãos brincaram com seu mamilo durante muito tempo, tocou suas costelas uma a uma, descendo pelo seu lado, acariciou sua barriga lisa e passando um pouco pela forma muito pequena de seu umbigo. Noah deixou escapar um longo e lânguido suspiro…
— Sasha…
— Noah, me escute, eu vou fazer amor com você aqui mesmo.
Sasha, que estava acariciando o corpo de Noah, de repente agarrou sua camisa para que pudesse tirá-la.
— Aqui…?
Noah estava sem fôlego, mas olhou para cima como se não pudesse acreditar. Só estavam eles dois e um piano de cauda Steinway. Não tinha ideia de como eles iriam fazer isso.
— Exato.
Então ele agarrou a camisa de Noah mais uma vez e lambeu sua nuca até que ele se encolheu no lugar.
— Mas, isso… Só tem um piano aqui… Ah!
— De agora em diante, toda vez que você olhar para o piano, você pode pensar em mim ao invés daquele maldito bastardo. Será apenas eu, em cima e dizendo o quanto eu te amo.
A voz de Sasha, falando como se estivesse com raiva, era uma chama ardente de baixa temperatura.
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Continua…
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Tradução: Sasori
Revisão: Rize
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Continua…
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Tradução: Haru
Revisão: Rize